Maria Madalena
Tricanico de Carvalho
A música era
animada e muito antiga. Todos cantavam ou tentavam cantar acompanhando os músicos
ou a capela mesmo.
Sentei ao seu
lado e ela me olhou sorrindo. Eu também sorri. Ela olhava para mim e para o
anel fantasia, mas nada discreto, em seu dedo como se quisesse que eu notasse
logo, imediatamente,
- Que anel charmoso! Bonito né!
- Ganhei do meu
namorado! Quer conhecer ele? É aquele ali!
Olho para o
rapaz que ela me mostra e vejo que é um
dos cuidadores ainda bem jovem em relação a divina plateia de idosos.
- Sabe, quando
eu era moça gostava muito de namorar. Namorava moço bonito e bem apanhado!
Apanhado! Que eu saiba não tem arvore de namorado para
que se possa apanhá-los!
- Não boba!
Apanhado é bem apessoado!
- Ótimo!
Entendi, agora é mauricinho! Então você
era chegada num namoro quente, cheio de abraços e beijos.
- Não! Vou
explicar como era o namoro no meu tempo
de moça: íamos no jardim do centro e os homens davam a volta pelo lado de fora
e nos mulheres pelo lado de dentro e trocávamos olhares. Quase sempre eram
assim. Teve colegas minhas, que namoravam rapazes e as vezes eles nem sabiam.
Ah! Entendi
quando ela me mostrou seu namorado que tinha lhe dado o anel. Isto era mesmo
“em algum lugar do passado”.
-Quando você
permitia que o rapaz se aproximasse para
conversar o namoro ficava sério e era para casar, por isso tenha que pensar bem
para não ficar falada.
- Então você
teve vários namorados de olho no olho e nada mais? E sobre casamento? Com quem
você casou?
- Não quero
falar sobre isso. Meu namorado é ciumento.
A música alegre
envolvia todo o salão e os cuidadores iam preparando os idosos para voltarem
para seus aposentos e depois iriam almoçar.
-Está bem! Não
vamos falar do passado. Você gosta de morar aqui no Lar junto com os idosos?
-Gosto! Gosto
muito! É muito alegre e divertido! Posso rezar, se eu quiser, cantar, passear só um pouco com ajuda do meu
namorado....
Enquanto eu
prestava atenção nesta velhinha simpática e de bem com vida ia observando os acolhidos saindo do
salão de acordo com suas possibilidades: com suas próprias pernas, apoiados por cuidadoras, em cadeiras de rodas...Minha amiga ficava
ali tranquila sentada em sua cadeira e
para surpresa minha o cuidador, seu namorado, chegou e com todo o respeito
perguntou:
- Quer ir
agora? Ajudou-a a se levantar, deu o braço e ela com dificuldade foi andando
amparada pelo braço forte e jovem do seu namorado secreto e me olhando
atrevidamente “vou com meu namorado e você?”, como se eu fosse uma de suas companheiras da
comunidade.