Vestidinho que minha mãe costurou para mim na sua máquina Singer (tem quase sessenta anos!) |
Ivana Maria França de Negri
Depois de mais de uma década,
reencontrei a velha máquina de costura Singer da minha mãe.
Ficou esquecida no quartinho do
quintal em meio a caixas com jogos de xícaras, aparelhos de jantar, copos,
prataria e papeis, muitos papeis.
A correia gasta de tanto rodar. E o móvel,
serviu nesse tempo todo para morada de ávidos cupins.
Abri curiosamente cada uma das
gavetas. Elas ainda guardavam velhos botões, linhas empoeiradas, retalhos descorados e alfinetes enferrujados.
Os vorazes cupins destruíram toda a
parte de madeira. Mas em minhas nítidas lembranças, a vejo ainda possante, o móvel lustroso, e posso até ouvir o som do vai e vem do pedal
que minha mãe dominava com destreza.
Eu, menina, ficava frustrada porque
não conseguia fazer o pedal funcionar. Era preciso força e prática. E as
perninhas não alcançavam o pedal. Então, agachada, o fazia funcionar com as mãos. Então ficava
muito feliz!
Quantos vestidinhos de festa foram
confeccionados nessa máquina. Meus e de minhas irmãs. Batinhas brancas de bordado
inglês e muitas sinhaninhas. As alças de
fitas de cetim. Passanamarias na roda da saia, e passafitas nos acabamentos, onde
mãos experientes passavam as fitas com o auxílio de um grampo de cabelo, e
resultavam em lindos vestidos para ocasiões especiais. Depois de prontos, eram
engomados levemente com Goma Pox para ficarem armados. As mangas bufantes,
difíceis de passar a ferro, eram afofadas com as mãos e as golas eram
carinhosamente ajeitadas.
Eu ainda tenho guardado um vestidinho
da minha infância feito por minha mãe. As rendas são de crochê, elaboradas com
capricho pela minha avó.
Por curiosidade, pesquisei na
internet sobre a evolução das máquinas de costura. Foi Isaac Singer que obteve
a patente do primeiro modelo em 1851. E ele teve a certeza de que criara um
produto que iria revolucionar o milenar processo de armar e unir os pedaços de
tecido.
A máquina de costura passou a ser um
importante objeto nos lares brasileiros, tornando-se um item indispensável nas
listas de presentes de casamento. Além de fazer reparos domésticos e
economizar, as mulheres também costuravam para fora, e ajudavam a contribuir
com a renda da família. Muitas viraram
modistas famosas e muito requisitadas para vestidos de noivas e debutantes. O
velho Isaac Singer há muito se foi, mas sua invenção continua evoluindo e sendo
sucesso. As atuais são digitais e fazem de tudo: bordam, fazem zigue-zague e
overloque.
E eu, quando ganhei a minha nos anos
setenta, confeccionei muitos vestidinhos para minha filha. O tecido era cortado
no molde, e a máquina já funcionava com
motor.
Meu Deus, por que o tempo passa tão
depressa? Eu era menina, e minha mãe costurava para mim, depois minha filha era
a menina, e era eu quem costurava. E me lembro que cantava a valsinha do
Toquinho para ela dormir : “menininha, não cresça mais não, fique pequenininha
na minha canção”... Mas ela não me obedeceu e cresceu. E agora tem suas próprias
menininhas, minhas amadas netas.
É a roda da Vida que não para de girar.
E as netinhas vão crescendo também porque a roda é eterna e não pode parar.
E as avós costureiras e bordadeiras,
vão partindo para costurar em outras dimensões suas colchas de retalhos, entrelaçando
tantas vidas...