As reuniões do Grupo Oficina Literária de Piracicaba são realizadas sempre na primeira quarta-feira do mês, na Biblioteca Municipal das 19h30 às 21h30

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Com o escritor Ignacio Loyola Brandão

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Reunião na Biblioteca

quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Qual o seu nome?


                                                              Ignácio de Loyola Brandão

Chego em Piracicaba com medo.  Estarei frente a frente, ou de lado, ou seja lá como for, inquieto com uma pergunta fatal: você se lembra de mim? 

Natural, todos queremos ser reconhecidos por quem amamos, a quem admiramos. Porém, o tempo é implacável, corrói  olhos e memória.

Quase três décadas se passaram desde a última vez que aqui estive fazendo uma das mais prazerosas oficinas que já fiz.  Um grupo mais coeso, interessado, trabalhador, criativo. Nestes 40 anos mudei cinco vezes o grau dos meus óculos. Difícil, tenho um para perto, um para o computador, um para longe.  Só não consegui um que me identifique rápido uma pessoa. Já estou providenciado um que identifique  prontamente meus parentes, pessoas próximas, queridas, alguma ex distante, porque aqui a coisa  complica. 

Sei da dificuldade em me reconhecer. Perdi cabelos, eles eram negros e cacheados, hoje são brancos e ralos. Entre a última vez que aqui estive a memória  foi perdendo o brilho sutilmente.  E a audição? Exagero, fiquem calmos, não me  deteriorei. Meu Deus, mais de 30 anos se passaram e vou reconhecer todos? O rosto pode ser que sim.

Mas, o nome? O nome é uma armadilha. Nem imaginam o tanto de nomes que tive pela frente nestas  três décadas. Olho o rosto, sei que conheço, mas o nome flutua, evapora. Sei que a pessoa fica decepcionada.  Cada um de nós se imagina inesquecível. Há pouco, em Araraquara, onde nasci e cresci. uma jovem se aproximou, sorriu, me entregou o livro.

- E seu nome, por favor?

- Sou Olga Cecilia.

- Bonito nome...

- É ? Sou filha da Quita.

- Quita?

- Era o apelido dela. Irmã da Maria do Rosário.

- Veja só, minha mãe também se chamava Maria do Rosario.

- Sua mãe e a minha eram irmãs, filhas do Vital Gonçalves Lopes, seu avô e também meu.

- Olha! Teu pai era o Benedito Vacari que tinha maquina beneficiar arroz em Simonsen?

-Sim, sou sua prima irmã.

Lançamentos de livros são alegria, e ansiedade. Chego com um medo. Não reconhecer os que se recusam a preencher a ficha com o nome, alegando: ele me conhece. Meses atrás, na Feira de Livros de Ribeirão Preto ganhei a glória de ter memória “infalível”. Uma senhora de 80  anos, aproximou-se da mesa, olhei e disse: “Margarida Troncon”. Ela confirmou, recebi aplausos .  Como esquecer a mulher que lá atrás, quando tínhamos oito anos, em Araraquara, aceitou namorar comigo? Durou semanas, como era costume, peguei na mão dela. Ao longo da vida, casada,  hoje viúva, passados 80 anos, com filhos, ela nunca deixou de comparecer a lançamento meu.

Aprendi com Juscelino Kubitscheck, o presidente. Ele entrava, abraçava  todos, dizendo, querido fulano de tal! Sorriam ambos. Numa entrevista em 1957 eu tinha 21 anos, indaguei  eficiência da memória, ele riu e disse:   “Não conte e ninguém. Ao abraçar alguém, digo, ao ouvido da pessoa: diga logo seu nome que será bom para os dois.”

Funcionava. Assim, amados amigos que promovem esta festa pelo livro.

Quando chegarem, digam: Sou tal. Eu estarei com uma cartela com meu nome.  Num momento como este de pura emoção nem imaginam  a alegria e o sufoco.

*Crônica escrita e enviada a mim, Ivana,  especialmente para o pessoal do GOLP (Grupo Oficina Literária de Piracicaba)


Fotos por Will Bardine, Ivana Negri e outros