Hoje, 19 de janeiro de 2017, faz 35 anos que Elis Regina Carvalho Costa deixou o chão pelas estrelas. Aliás, estrela que era, foi como voltar à casa que, por direito, era dela. Dela, que, com sua vida de estrela incensada, tem inundado palcos de teatro e telas de cinema ultimamente. Ela, Elis, ainda canta em muitos toca-discos de vinil, tocadores de CD e players do YouTube, deixando a impressão de que ainda não há cantor que a iguale em técnica e em emoção em todo o Brasil. Surgiu Maria, a Rita, com seus trejeitos naturalmente hereditários que lembram muito os de sua mãe, mas não os superam. Acho que não é sequer a intenção de Maria. Elis é única.
A primeira canção que aprendi a cantar foi Romaria, obra de Renato Teixeira devidamente imortalizada pelo canto de Elis. A saga de um romeiro ganhou vida e mais calor com a voz da Pimentinha em cada acorde, cada nota de quem ruma em busca da Mãe, à caça de bênção e, mais que tudo, amor. Tinha eu um ano e pouco quando aprendi Romaria. Uma empregada de minha mãe que me ensinou. Hoje, de posse de um violão que mal e mal me acompanha o canto, canto e, quase sempre me emociono. Sim, sou caipira Pirapora Nossa Senhora de Aparecida! Faz tempo, e eu ainda só quero mostrar meu olhar, meu olhar, meu olhar... Olha, Elis, olha!
Adulto, fiz aulas de canto e, quando houve oportunidade, numa apresentação na Faculdade Municipal Professor Franco Montoro, em Mogi Guaçu, São Paulo, cantei à capela a bela "O bêbado e a equilibrista", um achado de João Bosco e Aldir Blanc, o "Hino da Anistia", do início da abertura política ao fim da década de 1970, do País. Posso cantar mil vezes essa música, que não me canso. E, para ajudar, quando a apresentei para os alunos do curso de Psicologia daquela faculdade, a música fez tanto sucesso que, para sempre, enquanto eu viver, quando cantar seus versos, mais amor por ela ainda terei. "Caía a tarde feito um viaduto"... E Elis estava comigo.
Este é o primeiro texto que lhe mando este ano. Não tenho tido um período tão fértil. Tenho estado triste e um tanto quanto sem ânimo. "Tal como um velho arvoredo / Que o vento não derrubou / Tronco mudado em rochedo / Pedra transformada em flor”, sigo e floresço. A vida é um silêncio que eu canto, para ver se o seduzo e o transformo em som. Somos, a música e eu, um só ente. Mas o silêncio é forte. Quando chega, embota, e o embate é grande. Grande como foi e é a nossa Elis. Soluço encravado, cravo e rosa do povo, da plebe, que, rude, ruge e roça a língua dos lusos. Uso de Elis para falar de mim. Mimo seu canto pra cantar pra mim. Minto. Pra cantar pra nós. Nossa Senhora de Aparecida, proteja nós todos! O sonho é grande. Madalena sabe. As águas de março, fechando o verão, talvez ajudem na eterna travessia. Obrigado, Elis, pela lágrima deixada em mim. Ela também me inunda a escrita. Que silêncio!
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