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terça-feira, 16 de julho de 2013

Je me souviens ou as impressões de uma brasileira sobre Montreal, QC, Canadá


Christina Negro Silva

Tomo emprestado - Je me souviens – traduzindo : Eu me lembro, verso ícone dos québécois de um conhecido poeta da mesma origem , como título desta crônica para homenagear este incrível e imenso país, o Canadá. Eu também me lembro, assim no tempo presente mesmo...porque na minha memória as impressões ficarão sempre ali, remanescendo emoções, cheiros, sabores, imagens fixas na retina das recordações.
 Tiramos ( o marido e eu ) 15 dias de férias para visitar o filho, morador há um ano e dois meses em Montreal. O leitor já deve ter tido algum ente querido distante e pode imaginar nossa expectativa e estado de espírito ansioso para chegar a hora de rever nosso filho. Para nós, o passeio tinha conotação secundária, já que o primeiro objetivo era matar a nossa saudade. Logo, não tínhamos aquele frisson característico dos turistas, talvez, por isso, sinto-me à vontade para relatar aqui tudo o que vi, senti, apreciei nesses dias. Vou dividir este texto, então,  em sensações para organizar meu pensamento ao escrever sobre essa viagem.
A  primeira impressão : VISÃO: Montreal é uma cidade grande – 3 milhões de habitantes, mas nem parece ter tudo isso, haja vista a tranquilidade em metrôs, ônibus, trânsito. Gente nas ruas ( claro, mãe, é verão ! – diria meu filho ), tudo junto, mas não misturado...explico-me – há muitas tribos, se assim posso chamar os grupos diferentes que vi – gente com piercings, tatuagens, cabelos multicores, engravatados, bem vestidas em trajes de festa, etnias diversas em duplas, em turmas, separados e juntos. Também vi muita gente bonita e simpática de lá mesmo ou imigrantes de muitos países, cidadãos canadenses. Vi ruas limpas, flores enfeitando as árvores, os postes, as casas. Prédios imensos só na área central da cidade, as demais construções obedecem a um padrão – blocos de 4 andares, quadrados, com escadas de acesso à porta principal. Tudo igual se não fossem os telhados, pintados em cores berrantes e os detalhes nas bay-windows e portas. Este padrão torna a cidade aconchegante e harmoniosa. Também seguem em simetria os vários parques espalhados pela cidade, grandes gramados , árvores gigantescas, lagos ( que no inverno viram pistas para patinação no gelo ), flores coloridas, muitas variedades, um agrado aos olhos. A estrada margeando o rio Saint Laurent também é outro presente para as cansadas vistas da autoestrada – casinhas lindas, pintadas com cores extravagantes – azul marinho com janelas brancas , laranja com detalhes em marrom, cinza com vermelho e outras combinações agradáveis, assim também na zona rural, os celeiros e seus telhados recortados geometricamente, os cilos imensos em formato de ogiva ou outra comparação menos catastrófica. É certo que no verão, tudo fica mais brilhante e vivaz, por isso, muito bom guardar essas imagens assim tão nítidas. Para tudo, pausa para uma foto , na ânsia de perpetuar em imagens o que me suscitaria sentir as mesmas emoções ao revê-las.
Segunda sensação – TATO. O abraço de meu filho, suas esquisitices em tirar os “cravos” de meu rosto, a grama macia dos parques, uma sensação de seda gelada, refrigério para o calor de 30  graus ! Água potável e de graça para todos os sedentos – em casa, nos parques, nos restaurantes, assim deveria ser em todos os lugares do mundo ( lembro-me de meus 10 anos, morando em Tambaú, um pequeno município do estado de São Paulo, quando disseram que a água, um dia, seria cobrada ! Eu me perguntei – como assim ? como será cobrar por água? Uma dádiva da natureza não pode ter dono ! – santa ingenuidade...hoje quanta água já paguei...). Água pura, saudável, fria, quente, chuva de verão, gostosa de tomar ( mesmo à noite, em Quebec, a caminho do B & B). Toque de apertos de mão – firmes, interpretando-os : sinceros.
Terceira sensação – PALADAR – Não há uma comida típica canadense, há sim uma variedade imensa de outras culturas gastronômicas à escolha do freguês: da Grécia, da Itália, da Tailândia, da Índia, da  China ( em profusão – muitos chineses e outros asiáticos já são cidadãos canadenses ),de Portugal, até do Brasil ...aff ( como diria minha filha ) tanta comida assim daria para alimentar o mundo todo ! desde que paguem por isso, por que não ? pois é, os pratos típicos são  caros, como nos grandes centros do Brasil, mesmo assim os restaurantes estão sempre lotados, e haja local para comer ! Montreal tem muitos restaurantes e a “ Tim Horton’s” – uma franquia de fast-food  que domina este segmento, lanches baratos e os doces –em sua maioria douhghnut ( uma espécie de massa de farinha de trigo, recheada com cremes e uma espécie de geléia de frutas locais- as berries – frutinhas sem graça ao nosso paladar, bem delicadas e bonitas ). Vinhos bons, embora os estrangeiros façam mais sucesso ali. As pizzas são de massa grossa e há aquelas  baratas que são apenas massa e molho de tomate( sem queijo, sem nada - ugh !), claro que se pode acrescentar o recheio, mas eu vi um rapaz comendo um pedaço assim mesmo. Ah, que maldade, estava me esquecendo de mencionar a famosa POUTINE – um petisco ou às vezes, uma guarnição de lanches. Talvez, ela seja o prato típico daquela região do Canadá: batatas fritas e quadradinhos de queijo  tipo frescal, cobertos com um molho especial, parecido com o barbecue. Ao receber o calor do molho, o queijo fica puxa-puxa, mas a batata frita perde sua crocância.  Gostoso e enjoativo. Outra iguaria  típica são as carnes defumadas – de boi, porco, ovelha, peru, frango e até de peixe. Um item de degustação importante para o turista. Bom, forte, cultural ( já que a defumação é conservante alimentar em países castigados por invernos rigorosos ). Café é um susto para os brasileiros – copos grandes de chafé são consumidos pelas pessoas, em toda hora e lugar e até para acompanhar as refeições e lanches.  Para tomar um cafezinho parecido com o nosso, melhor pedir um espresso alleong ( para nós, um expresso longo ). Nos supermercados, há muitos pós de café de regiões produtoras do mundo afora – África, Colômbia, Equador, República Dominicana... do Brasil ? Só em lojas de produtos importados e custam “os olhos da cara” – nunca mais vou reclamar do preço de nosso café quando comprá-lo aqui em nossos supermercados, eu juro ! Para mim, boa gourmant ( e gourmet também ) que sou, a comida é pouco temperada, tanto de sal, açúcar, pimenta ou outros temperos conhecidos por nós – alho, cebola, orégano...Meu filho, que já está adaptado, estranhou eu ter reclamado da falta de alguns deles. Talvez, se ficasse mais tempo, também me acostumaria...Há muita variedade de frutas, legumes e verduras frescas. Carnes, peixes, frutos do mar, leites com tantas derivações que a gente até se perde para escolher – 3%, 2 %,  1 % de gordura, desnatado, semi e tantos etecéteras. País desenvolvido e industrializado é isso – muitas escolhas para o tudo igual.
Quarta sensação – AUDIÇÃO – Os québécois são francófonos e fazem questão de o ser. Também falam  inglês como segunda língua, mas adoram e têm orgulho em falar francês. Nas sinalizações de rua e nas liquidações das lojas – o idioma é o francês. O atendimento aos turistas pode ser bilíngue, mas não se iluda, o inglês é uma segunda opção. É bonito ouvir o povo nas ruas, som harmonioso aos ouvidos latinos, da mesma raiz. No estado do Quebec, há uma resistência à hegemonia britânica – na cultura que relembra sempre a França - na arquitetura, na língua, nos boullevares  charmosos, na religião. Parecem dizer para os demais estados do Canadá – Somos católicos e  falamos francês ! quer queiram ou não, nem ligamos. Uma advertência a quem pretende obter cidadania canadense e morar neste estado – aprenda francês ! Se não, não vai conseguir arrumar emprego facilmente, porém  há sites que ensinam o estrangeiro a falar o idioma de graça, mas é bom pensar em frequentar um curso regular para aprender também a escrever ( os melhores empregos são reservados a quem domina as duas habilidades – falar e escrever bem o francês ). Além do idioma dominante, há muitos sotaques dos estrangeiros que vêm em busca de melhor qualidade de vida – uma orquestra , uma sonoridade fabulosa !
Quinta sensação – OLFATO – Cheiros de todos os tipos, identificando os espaços – de restaurantes , boulangeries ( padarias  sofisticadas com variedades de pães, bolos, brioches, tortas...), de vinhos frutados, de flores – ah, que perfume suave têm as flores do carvalho canadense ! delicadas e fugazes – florescem e em apenas dois ou três dias já perdem seus cachinhos  cor de baunilha. Perfumes finos ( franceses, claro ! ) ou os globalmente conhecidos – Polo, Ralph Lauren, Carolina Herrera, dentre todas as outras marcas. Cheiros acres, doces, fortes, suaves, inebriantes... haja narizes !
Pois então, tentei resumir ou descrever minhas impressões sobre  Montreal e as regiões do Quebec que visitei. Região turística, arrumada para os visitantes, muito limpa, organizada, atraente. A cidade de Quebec é uma lindeza, conquista pela organização e por sua História, um símbolo da resistência francesa ao poderio anglicano. As construções do período de dominação francesa são bem conservadas e focos do turismo local. Os eventos de verão acontecem em áreas abertas, convite ao público, gratuitos. Os restaurantes expandem seus espaços pelas calçadas, enfeitadas todas com vasos de flores, os quais são cuidados pela prefeitura ( os carros passam molhando as flores, quando não chove e faz calor insuportável ) – as ruas são cartões postais ! Conheci a cidade subterrânea  em Montreal, que abriga a população durante o inverno. Dizem seus habitantes que há duas estações do ano ali – o inverno e Julho, quando o verão ocorre em todo o seu apogeu – sol das 5 a.m. às 9 p.m. – calor, tempo para encontros, concertos, passeios, piqueniques nos parques, longas caminhadas por toda a cidade, hora de pedalar as bicicletas que  ficaram descansando no longo inverno, rever amigos, beber cerveja nas muitas cervejarias artesanais espalhadas pela cidade, enfim, viver o verão.
Entrei no país com o propósito único de rever e abraçar meu filho, ver onde mora e como está no seu estudo e trabalho, de lá, porém,  saí gratificada com dois presentes – a convivência familiar e o turismo que veio anexo ao meu intento. Gostei muito dos dois, voltei renovada, feliz, agradecida a Deus por ter tido essa oportunidade de 2 em 1. Não posso deixar de registrar que fomos os primeiros brasileiros a chegar no B & B do “Gile” em Rivière do Loup. Estávamos off road da rota normal para os turistas de nosso país, por isso, colocamos o  primeiro alfinete sobre o mapa do Brasil. Do leste dos EUA, o mapa múndi estava cheio de alfinetes, muitos na Europa e alguns na América Central. O hospedeiro, pai do proprietário, um senhor muito simpático, ficou feliz em ter hóspedes brasileiros ali. No café-da-manhã fomos muito bem servidos com crepes preparados na hora pelas netas gêmeas – recheados com creme patissieur, frutas da época e top de chantilly. Tudo artesanal e chic, muito chic !  

Um dia, daqui a alguns anos, pretendo voltar, tenho mais a conhecer e a viver no Canadá – quero estudar sua história, aprender francês, passear por outras cidades ícones desse imenso país. Je me souviens.

Um comentário:

Cida Carvalho disse...

Chris, viajei na sua narrativa! Vi, ouvi, senti na pele, aspirei os aromas, degustei os pratos e em especial os vinhos! Que crônica linda e leve! É assim que está sua alma. Linda, leve e cheia de VIDA!Conheço você, mas confesso, fiquei como menina, amiguinha de colégio mesmo, encantada com o seu projeto de estudar a história canadense e o francês! Que lindo, menina-moça Christina! O que mais eu registro aqui? Ah, mais nada. Quero somente continuar sentindo as boas sensações que este texto provocou em mim!