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sexta-feira, 10 de junho de 2011
DIA DOS NAMORADOS
Henrique Borlina de Oliveira
É noite do dia dos namorados. Noite fria. A moça borrifa o perfume na roupa. Batom suave nos lábios. Sobre a cama o pacote dourado com o relógio de aço que ele tanto queria. Para coleção. Ansiosa, confere a hora no relógio sobre a penteadeira. O moço buzina na porta. Carro preto lavado naquela tarde, cheirando a lavanda. No banco de couro um buquê de rosas vermelhas. E no porta-luvas, segredo, aquele último perfume lançado em Nova Iorque.
Ali perto o moço empurra a cadeira de rodas da namorada pela cidade à procura de um banheiro público. Traz no bolso um sabonete usado e seco. Presente dos membros de uma igrejinha. Com cuidado conduz a cadeira para que não tombe na guia da calçada. Não fique presa a roda no buraco da calçada.
O moço buzina novamente e começa a mexer no rádio. Muda de uma estação a outra como assistisse a corridas de cachorros. Enfia para dentro do aparelho um CD. Retira o celular do bolso. Titubeante os dedos deslizam sobre as teclas. Jogar ou ligar para ela? Buzina longamente antes de apertar a tecla ligar.
No banheiro o moço deixa a cadeira próxima a pia. Com jeito, ajuda a moça a retirar a blusa. Lava uma lata de refrigerante vazia encontrada na rua. Ajuda a banhar a moça que se ensaboa com o resto de sabonete. Ao mesmo tempo em que a enxágua, com toalhas de papel encontradas no local, segue enxugando-a. Não dá para molhar muito.
A moça chega ao carro reclamando a pressa do namorado. Precisava ligar? Ainda irritado o moço retira o buquê do banco para que a menina se sente, colocando-o sobre seu colo. Feliz dia dos namorados. A menina retribui com um beijo, agradecida, meio sem graça. Só? E entrega o pacote dourado ao namorado. Espero que goste. O rapaz guarda o pacote no bolso do paletó. Vou abri-lo no restaurante. E imprime velocidade ao carro.
Encosta a cadeira de modo que a moça fique de costas para pia. Com auxílio da lata molha a cabeleira desgraçada, com cuidado para não escorrer no rosto. Ensaboa todo o cabelo com o toco do sabonete que sobrou. Com a ponta dos dedos massageia o couro cabeludo. Enquanto enxágua olha vidrado os olhos da moça. Beija-a na testa.
A moça lê o cardápio enquanto o rapaz tenta descobrir, sem abrir, do que se trata, A moça quer carne branca. O rapaz pretendia vermelha. Abre logo este pacote! E como a noite era especial, a moça escolheu.
Na praça um homem fecha o carrinho de cachorro quente. O senhor não faz mais um cachorro, não? E justifica. Atrasara com o banho. Não tem mais salsicha! Só pão e molho.
Antes que chegassem os pratos o moço abre o pacote dourado. Agradece pelo relógio. Queria tanto! Aperta a mão da namorada e levanta-se para beijá-la. Cuidado para não se queimar nas velas. Chegam os pratos. Brindam a noite. Sorriam e jantam. Conversam um pouco. De boca cheia, não pode. O rapaz come tudo e arremata o resto de vinho da taça. A moça mal mexe no prato. Seria vergonha? O garçom chega para limpar a mesa. Ainda tem sobremesa e café.
O moço pede seja sem salsicha. Dois? Não. Um só! Não temos tanto dinheiro.
Fartos, o rapaz paga a conta. A moça quase nem tocou a sobremesa. Papaia com cassis. Os cafés esfriam na mesa. Quase meia-noite – observa o rapaz esnobando o relógio novo. No carro o rapaz encena. Pergunta se a moça gostara do presente. Claro que sim. Diz sem muita convicção. E abrindo o porta-luvas do carro, como que acidental, o pacote salta no colo da moça. O perfume.
Com o cachorro quente na mão, o moço arrasta a cadeira até o canteiro do jardim onde a vista da lua é mais bonita. Divide o pão ao meio. Entrega metade à moça. Apanha uma margarida do canteiro e entrega à amada. Feliz dia dos namorados! Diz. E ganha um beijo nos lábios. Comem o cachorro-quente. E passam a noite ali, conversando. Vez e outra um carinho. A lua cheia emoldura. A cadeira e o moço sentado ao lado no centro da lua.
O moço beija a namorada nos lábios. É tarde. Moça de família tem que chegar cedo em casa. Feliz dia dos namorados! Dizem. Beijam-se. Espero tenha gostado da surpresa. Amei! Abre a porta do veículo e desce. Acena com a arrancada. A moça deixa no criado-mudo o perfume. O moço agora abraça duas desconhecidas. O som alto faz vibrar o prédio. Na mão um como de vodka.
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