Professora, escritora e poetisa Clarice Villac |
O Saci-Pererê –
Resultado de um Inquérito – Monteiro Lobato
Editora
Globo, SP, 2008, 384 pp.
Estou
lendo um delicioso livro de Monteiro Lobato, “O Saci-Pererê – Resultado de um
Inquérito”.
Publicado
em 1918, na verdade Lobato é seu organizador, participa com prefácio,
introdução, comentários, conclusão, epílogo.
Trata-se
do primeiro livro publicado por ele, antecedendo Urupês.
Intrigado
ao passar pelo Jardim da Luz, em São Paulo, e ver somente gnomos europeus,
passa a sentir falta de ipês, quaresmeiras, música brasileira tocando no
coreto, estátuas de escritores brasileiros, referências genuinamente nacionais...
Assim,
inicia a empreitada de valorizar nossos mitos, e principalmente o Saci, até
então não considerado seriamente por nossos ‘ilustres’ e ‘elegantes’
‘intelectuais’...
Foi
então que Lobato lançou um convite aos leitores do jornal Estadinho, edição
vespertina do jornal O Estado de S. Paulo, para que escrevessem relatando suas
histórias sobre o Saci-Pererê, o que tinham ouvido contar sobre ele, como o
conheciam desde crianças...
O
resultado foi tão positivo, que ele reuniu todos os depoimentos nesse livro,
que tem também desenhos de sua autoria, de Voltolino, Norfini e outros artistas,
assim como fotos de esculturas ‘sacizísticas’.
São
relatos vindos de variadas regiões brasileiras, alguns escritos no linguajar
próprio dos caipiras, habitantes das áreas rurais, e por isso tão saborosos.
Ao
ler as histórias, somos remetidos a um universo em que a escuridão da noite era
imensa, os matos cheios de ruídos e vozes dos pássaros, e demais animais
notívagos...
Lobato
apresenta cada relato com sua verve especial, inventiva, perspicaz e cômica,
quase sempre ironizando os ‘ilustres eruditos’ que desvalorizavam a rica
cultura genuinamente colorida e criativa de nossa gente simples.
Por
exemplo, abro ao acaso uma página, e lá está o “Depoimento do senhor Belmiro
Aranha – Vem de Pitangueiras. Não está averiguado que lá haja pitangas, mas há
sacis, o que é uma compensação.”.
Há
depoimentos em versos, muitos contam os causos que ouviram de antigas amas e
caboclos, outros narram seus próprios encontros com os sacis.
Variam
as formas físicas e de caráter do saci, alguns garantem que ele é um moleque
brincalhão que não faz o mal de verdade, outros o descrevem como capaz de
provocar confusão, outros ainda asseguram que ele até ajuda as pessoas nos
passos importantes de suas vidas, ainda que seja de modo um tanto inusitado.
Tem
até o relato sobre um poeta que encontrava inspiração numa cabecinha de saci
risonho e de gorrinho, esculpida num tampo de tinteiro que conservava em sua
escrivaninha, e sempre lhe acudia com belos versos...
Ainda
não acabei de ler este livro, e não tenho pressa, tem sido muito bom conviver
com ele... Sentir a vida como antigamente, sem o ritmo insano das grandes
cidades barulhentas e apressadas...
Perceber os mistérios do desconhecido, conhecer o imaginário de nossos
antepassados...
Este
livro é um grande panorama, multifacetado e ágil de nossas raízes mitológicas,
orquestrado pelo espírito vivo, intensamente matizado e expressivo de Monteiro
Lobato.
Um comentário:
Ivana, Amigos do GOLP, é uma grande alegria participar destas 'páginas' !
Agradeço a oportunidade !
:~)
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