Maria de Fátima Rodrigues
Tive ótimos professores, tanto no
primário como ginásio e colegial que fizeram a diferença em minha vida, e
gostaria de escrever sobre todos eles, mas decidi começar por uma professora que admirava muito, onde
estudei no Instituto Estadual de Educação Sud Mennucci, em Piracicaba-SP, durante
sete anos, ginásio e colegial. Minha admiração por ela era por vários motivos:
seu modo peculiar de lecionar e pela sua, digamos, “exuberante” personalidade e
inteligência... minha professora de História Geral, Marly T. Germano Perecin!
Hoje é historiadora proeminente nessa cidade, e com vários livros publicados.
... “Primeiro dia de aula de
História Geral, da quarta séria ginasial: entrou na sala uma senhora elegante,
de cabelos negros, pele alva e com uma bolsa lindíssima. O detalhe de um lenço
de seda delicadamente nela enlaçado, era fantástico. Usava um batom vermelho, e
o que mais me chamou a atenção foi seu anel no dedo, que era um relógio.
Imaginem um anel relógio? Alunos
costumam prestar atenção na maneira de vestir de seus professores! É claro, que
há diferença entre as observações das meninas e dos meninos! rs.
Apresentou-se, fez a chamada e
disse à classe:
- “Não adotarei nenhum livro em
especial, pois vocês é que o escreverão, porque prefiro consultar vários
autores. Não quero que decorem a história, mas tenham o prazer de ouvi-la,
tenham a curiosidade de saber como e por que os protagonistas tomaram essa ou
aquela atitude. Tenham vontade de saber seus costumes, e anotem o que acharem
interessante, os nomes, as datas, não só porque lhes será perguntado nas
provas, mas para se situarem na época. E, ao ouvirem o nome deles, saibam em
que eles contribuíram para a história da humanidade, mesmo que tenham realizado
obras boas ou más, certo? Espero conseguir esse intento.”
E assim foi. Eu gostava de suas
aulas, mas houve uma que nunca esqueci, pela maneira ousada com que relatou a
história, e não “perdoou” nada sobre o rei, o bispo, a rainha, ninguém mesmo!
Naquele dia ela estava inspirada:
- “ Hoje vamos falar sobre o rei
Henrique VIII da Inglaterra, de sua corte, suas 300 esposas e mais 200 amantes!
(nós sabíamos que era só “força de expressão”, é claro), e seu injusto e
corrupto reinado e sua amante, que depois se tornou sua esposa, a qual,
acredito eu, a que mais amou: ANA BOLENA.
Ah! Quando ele se apaixonou por ela, coitada
de Catarina, sua atual esposa, que morreu
não se sabe como, nem de que... Bom, o bispo deveria saber, mas deixa prá lá!
Como definirei Ana Bolena: ela
era solteira, mas não fanática ” (achei aquela definição, a
maneira mais sutil e criativa de falar sobre uma mulher, para aquela época,
muito independente. Nós rimos muito, com certeza!).
E continuou contanto a história,
não só de sua trajetória como esposa de Henrique VIII, mas também das
injustiças da administração do rei, descrevendo como viviam os pobres ingleses,
do poder que a Igreja Católica tinha sobre a corte, etc... mas ele se
decepcionou com Ana porque ela não conseguia ter um filho homem, é, acho que
foi isso. Então, infelizmente alguém, se encarregou de arranjar um adultério
para que o rei “não a perdoasse” e fosse condenada a morte. Acho que foi mais
ou menos assim!
Sim, professora Marly, a senhora
conseguiu seu intento: inspirou-nos a querer saber e compreender a História, e
mais ainda, nos ensinou como contar
uma história, pois se não fosse isto, eu não teria conseguido contar em apenas
uma hora e meia para uma colega de classe, a Ivete, um livro de 600 páginas: “Quo
Vadis?”, de um escritor judeu,
de um nome tão complicado que nem sei escrever direito, o qual nos foi
solicitado ler para uma prova oral, para a nota mensal, e justamente para a
matéria História Geral.
Ela fazia parte de meu grupo, que eram cinco
alunas, e contou-me que não tinha lido o livro, nem uma linha sequer, nem sabia
do que se tratava a história, e teríamos uma prova oral de História Geral na
última aula sobre do dito cujo. O que fizemos? “Matamos” duas aulas anteriores
e eu tentei contar-lhe “meio estilo professora Marly”, e não é que deu certo?
Bom, chegou à última aula e a
professora Marly “sorteou” os nomes,
para apenas um representar, portanto responsável pela nota do “grupo
todo”. Adivinhem quem foi “sorteada”? Ela mesma, a IVETE!
Ela quase teve “um treco”, mas eu
disse: vai lá e responda só o que tiver certeza, não “chute”! Pois ela
conseguiu responder 60% das perguntas e sua, ou melhor, nossa nota foi 6,5 e a professora Marly, ao final, perguntou:
“- Ivete, só por curiosidade, por
que você ficou olhando o tempo todo para a Maria de Fátima, quando respondia as
perguntas?”
Ela deu um sorriso sem graça, e
respondeu: -“Sei lá, acho que foi nervosismo, então olhei só para uma pessoa e
me concentrar, só isso.”
Pois bem, professora Marly
Therezinha Germano Perecin, depois de 34 anos a senhora ficou sabendo a
verdade! rs.
E a Ivete teve que saber quem foi
Nero, porque disseram que ele colocou fogo em Roma, quem foi Ligia, Marcus
Vinicius, Caio Graco e Brutus. O que era um gladiador,
qual o símbolo ou a “senha” dos cristãos (um peixe), e quando e onde Jesus
disse:
- “Quo Vadis Pedro?”
Tenho certeza de que esse foi o
livro que a Ivete nunca leu... rs, e o qual jamais esqueceu, e nem eu!
Professora Marly, obrigada pelas
suas prazerosas e “peculiares” aulas e exemplo de criatividade, como grande
educadora que foi, e hoje historiadora que é.
Um comentário:
Que bom, obrigada Ivana... esta crônica me traz tantas lembranças. Bjs.
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