As reuniões do Grupo Oficina Literária de Piracicaba são realizadas sempre na primeira quarta-feira do mês, na Biblioteca Municipal das 19h30 às 21h30

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segunda-feira, 8 de maio de 2023

TODAS EM UMA

Christina A. Negro Silva

 

MÃE SÓ TEM UMA, conforme o ditado popular.

Será? Vamos multiplicar essa afirmativa?

Uma mãe biológica, sim, fato. Alguém que nos doou seu ventre e nos abrigou por nove meses

Uma mãe amorosa que nos nutriu, agasalhou, limpou e educou para a vida.

Uma mãe enérgica que nos fez caminhar no lugar correto, que nos deu conselhos e, muitas vezes, ralhou por causa de nossas atitudes irresponsáveis.

Uma mãe preocupada com nossa saúde, alimentação, bem-estar, amigos, estudos, provendo nosso sustento e vestimentas, cuidando do nosso dia a dia.

Uma mãe confiante em Deus que reza e pede bênçãos e proteção a seus filhos.

Uma mãe...quantas MÃES!

Deixo um desafio para vocês, filhos e filhas, completem a lista de adjetivos para as mamães, porque, conforme a matemática explica: 1x1x1x1x1x1 = 1.

MÃE SÓ TEM UMA, mulher com somatória de qualidades.

sábado, 4 de março de 2023

EMMA *

 


Christina Aparecida Negro Silva

Debruçada no parapeito da janela da velha casa, ela olhava ao longe...olhos miúdos, pesados pela idade, porém brilhantes, pois voltava seu olhar para outro tempo, outro espaço, para dentro de sua vida de outrora, rica memória.

Via-se menina, de avental xadrez, carregando o ovo quente no bolso do acessório para a mamma grávida do irmãozinho que nasceria brasileiro. Via-se rindo... uma largueza de dentes bonitos a encantar o cozinheiro que, escondido, entregava o alimento durante a travessia do navio da Itália para o Brasil.

Ao piscar de olhos, via-se mocinha, enamoratta  de Victório, primo amore, com quem teve 12 filhos e muitos netos. Via a netinha, da filha mais nova, sentada em seu colo na cadeira de balanço, embevecida com suas histórias.

Quantas saudades! Saída ainda menina de sua terra natal, apreensiva em um país de língua e costumes diferentes dos seus, apesar do aconchego dos pais e irmãos, descobriu-se uma mulher forte, decidida a lutar contra as vicissitudes com maestria. E quantos percalços enfrentou no início do século XX, que nós, hoje, nem fazemos ideia!  Sem energia elétrica, passava a ferro em brasa a única camisa que seu marido tinha. Lavava-a à noite e de manhãzinha, já limpa e passada, ele a podia vestir para o lavoro. Criou seus filhos, ajudando seu marido na lida com tijolos de barro. Sim, ela também carregava a matéria prima para construir seu sonho, sua vida, seu país.

Enfrentou a Revolução Constitucionalista de 32, abrigando os soldados paulistas na disputa contra os mineiros, pois morava quase na divisa entre os dois estados. Agradecia a Deus por não haver visto nenhum derramamento de sangue por ali, apesar da tensão do conflito. Os bonitos moços de farda, segundo uma das filhas, só se hospedaram na grande casa, desfrutando da mesa farta e gostosa. Nessa época, a situação financeira estava mais estável com a fábrica de cerâmica produzindo para uma crescente população tambauense.

Aos 60 anos, perdeu uma das vistas para o glaucoma, o azul do olhar como o mar mediterrâneo foi substituído por uma prótese de porcelana, tão perfeita que enganava até os filhos que sabiam desse procedimento cirúrgico. A imagem de Santa Luzia, carregando os olhos no pratinho, era sua relíquia. 

Tanta vida deixou às gerações que a precederam. Muitas histórias de família, de risos alegres nos almoços festivos, de superação em situações difíceis, também de momentos de dor e perdas de entes queridos, da música de todos de sua família. Marido maestro ensinou a Arte aos filhos, netos e formou uma bela banda na cidade; a todos que queriam aprender música, tinha prazer em ensinar de graça. Tocava violino nos incipientes cinemas de então, enquanto era necessário esfriar a tela de projeção.  A eterna saudade do companheiro que, dizia ela, vinha cobri-la todas as noites de frio por longos anos, mesmo depois de morto.

Quando lhe perguntavam se gostaria de voltar para rever seu país, respondia com um categórico – No...o Brasil é mio país. 

Recordar da minha nonna me traz muitas saudades e também deixa meu coração cheio de gratidão por ter me  permitido dar continuidade ao seu legado de amor por minha pátria, por gostar de música, de contar histórias, de comida italiana e ter muito respeito e reconhecimento pelos imigrantes ( de todas as nacionalidades) que fizeram o  Brasil.

* Texto Premiado em segundo lugar no Concurso Literário Viajando na Leitura, organizado pela Academia Piracicabana de Letras e Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

CARVALHOS E EUCALÍPTOS


Christina Negro Silva


 "O Educador educa a dor da falta cognitiva e afetiva na construção do prazer"
                                                Madalena Freire

Não atrelar autoridade (direito de se fazer  obedecer,  domínio , influência , exercício  do  poder - segundo  os  dicionários )  à  figura  do  professor  é  quase impossível  na  imaginação  dos  maiores  de  40  anos.Sentimos  na  carne  ou  o  sabemos  pelas  nossas recordações dos bancos escolares,  qual  o  “peso”   da autoridade docente : tapas, puxões de orelha e toda sorte de agressões que nós, crianças brasileiras éramos sujeitos. Nada mais coerente para aquela escola de então.
O escritor Viriato Correa descreve, no livro Cazuza, o temor que um grupo de escolares sentia por seu mestre. Por qualquer brincadeira em sala ou não compreensão da lição - hora de levar bolos nas mãos.  Bolos eram assim chamados os ferimentos produzidos pela palmatória - um instrumento de tortura muito empregado em nome da disciplina e respeito infantis.
Maus tempos!
Há que se lembrar da famigerada “vara”- empunhada pelos mestres, na Idade Média, a qual simbolizava “amor” aos pequeninos.
Outros tempos!
Não muito “antigamente” quando cursava a quarta série do I Grau (hoje chamado 5º ano do Ensino Fundamental), levei um tapa na cabeça porque, repulsivamente, tapei os ouvidos com as mãos por não suportar os gritos histéricos de minha professora que teimava em ensinar tabuada a um menino aos berros.
Foi-me difícil encontrar coragem para, aos dez anos, tentar reverter o quadro de opressão em que vivíamos, no dizer de Freire - a característica do oprimido é o medo de falar.  Contei o ocorrido à minha família. Meu pai tomou minhas dores e foi falar com o Diretor do Colégio, que, ao solicitar explicações à professora, foi surpreendido por sua atitude:chamou-me de mentirosa e expulsou-me, literalmente, de  sua  sala  de  aula.
Tempos dolorosos!
Quantos alunos deixaram a Escola vítimas de maus tratos? Quantos resistiram ao horror? Quantos reprovados tiveram que“ comer o pão que o Diabo amassou”  novamente no ano seguinte ?
Os tempos mudaram.
A  LDB reza sobre a Escola livre e democrática para todos. No seio de escolas públicas e privadas, entretanto, continua a haver  evasão, repetência, desinteresse em aprender, faltas, indisciplina como sempre - o que não condiz em nada com a  Legislação brasileira.
Há que se reinventar outra estrutura escolar. No dizer de Freire- a reestruturação da Escola,...implica na mudança da concepção do que é aprender, do que é ensinar e do que é  ser Educador.
E o que é ser Educador? É ter vocação para ensinar?  Ensinar o quê? Sobre isso, Rubem Alves nos diz
...vocações são como plantas. Vicejam e florescem em nichos ecológicos, naquele conjunto precário de situações que as tornam possíveis e - quem sabe - necessárias. Destituído esse habitat, a vida vai murchando, fica triste, mirra, entra para o fundo da terra até sumir.
Alves utiliza-se conotativamente do termo plantas, para distinguir metaforicamente professores e Educadores. A seu ver, os  educadores habitam um espaço artesanal de relação a dois onde a Educação acontece  -  São velhas árvores !
Já os professores habitam outro espaço, o descartável. O que lhes interessa é o crédito cultural que os alunos adquirem em uma determinada disciplina e para fins institucionais. Não faz diferença quem administra esse crédito, para Alves, são eucalíptos - essa raça sem vergonha que cresce depressa para substituir velhas árvores seculares que ninguém viu nascer, nem plantou...(Alves)
A analogia utilizada é pertinente. Velhas árvores são frondosas, abraçam a todos que precisam de sua sombra, têm identidade própria, são lembradas, reconhecidas, enquanto os eucaliptos servem apenas aos interesses comerciais - tanto faz um ou um milhão deles, todos são iguais.
Como,então, distinguir professores de Educadores nas escolas?
Os poucos educadores que teimam resistir  nos  nichos ecológicos das instituições de ensino, acabam, por vezes, influenciando outros  professores através de suas atitudes alegres, cheias de carinho por seus alunos.
O escritor Ziraldo no livro Uma professora muito maluquinha,  vem avivar nossa memória infantil :
...antes de a sineta tocar para o início das aulas, nós todos já estávamos amontoados em frente à porta da sala...As velhas professoras não entendiam nada ! ... Ela entrava voando pela sala (como um anjo ) e tinha estrelas no lugar do olhar. Tinha voz e jeito de sereia e vento nos cabelos. Seu riso era solto como um passarinho. Ela era uma professora inimaginável.

Inimaginável? Nem tanto. Conheci alguns quando criança e nos corredores das escolas ainda encontramos muitos Educadores, que estabelecem relações afetivas com seus alunos, criam situações de aprendizagem baseadas no respeito - na alteridade -revêm constantemente sua prática pedagógica e  optaram por
uma visão de mundo que oferece possibilidades para uma reorganização vagarosa e difícil daqueles elementos que, em nossa ação, são os mais difíceis de serem organizados : bondade sem que isto signifique tolerar tudo, coragem sem fanatismo, inteligência sem apatia e  esperança  sem cegueira. Todos os outros frutos da filosofia são de importância secundária..( Kolakowski  in Alves, Rubem.)

Onde estão eles vicejando ?  Acreditamos que  todas as instâncias  educacionais  têm  muito a contribuir, mas  só  servem para  “limpar o terreno. A  maior  mudança virá daqueles que vivem o ensino. De dentro ( Ilari,Rodolpho)                    
Por este pressuposto é  possível  então transformar eucaliptos em  carvalhos ? Por acreditar  que ainda há espaços para isso no interior das escolas, presto-me a este exercício metamorfósico,  justamente porque comungamos  com  Sousa a mesma opinião :

Não basta tomar conhecimento das críticas que são feitas, é preciso construir, a partir delas, a própria análise e reflexão, individual e coletivamente, na escola; o que desencadeará...um compromisso com uma prática capaz de promover permanência, terminalidade e ensino de qualidade  para todos.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

EE PROFª CATHARINA CASALE PADOVANI


Direção – Christina Aparecida Negro Silva

Proposta de Redação - O Ensino Médio que queremos
Alunos das Professoras Margarete O. Pagotto e Karen de Melo Pedreira

1-      Jovens  no mercado de trabalho
      
Atualmente,  o mercado de trabalho pede ao candidato uma série de requisitos para que o mesmo possa ,futuramente, ter uma oportunidade de emprego e melhor renda. Para isso, tal “senhor” exige  que os jovens se qualifiquem em  cursos profissionalizantes, tenham ensino médio completo,dentre outros itens que dão aos candidatos certo destaque, e consequentemente, possam ser  melhor remunerados e ter uma boa colocação profissional. Alguns jovens, porém, não estão preparados, são  até desqualificados para os ofícios disponíveis,por falta de base.
O governo incentiva os jovens e adolescentes,  oferecendo cursos como o PRONATEC, uma brilhante ideia governamental, o qual prepara os alunos a partir dos 16 anos em cursos profissionalizantes de curta duração,  concomitantemente ao curso regular do Ensino Médio das escolas públicas. Há ainda as escolas técnicas profissionalizantes, tais como : ETEC , FATEC, SENAC, SENAI, as quais realizam tal formação, dando oportunidades aos jovens. Porém, se as escolas estaduais oferecessem cursos profissionalizantes dentro de sua grade curricular, o estudante teria um rumo a seguir, uma profissão já escolhida para o futuro.
Em suma, temos grandes oportunidades para o ingresso no mercado de trabalho, mas precisamos incentivos para que todos os jovens aprendam na idade certa para poder participar em igualdade na disputa para uma vaga no concorrido mercado de trabalho.

Nome do Aluno: Gabriel Almeida Costa
RG:56.686.102-1                                          
Idade do aluno: 15


2-      Jovens na Ativa

A participação cidadã dos jovens no ensino médio, poderia ser mais trabalhada, com o intuito de levá-los a entender a necessidade do voto como direito do cidadão de participar do processo de eleger alguém que o represente.
Em nossa escola, somos do grêmio estudantil, e temos uma eleição. Para tanto ,trabalhamos como candidatos apresentando projetos a todos os demais alunos, então, como nas eleições reais, todos escolheram os que mais lhe transmitiram confiança na realização das ideias propostas.
Uma forma de os jovens sentirem-se mais cidadãos seria participar de projetos para que os alunos interajam na comunidade onde convivem, ter uma vida ativa em relação à sociedade, de maneira que possa participar de outras atividades sociais  junto com os governantes, para a melhoria do bairro.
Contudo, para que estes “projetos” saiam do papel, é necessária a ajuda dos mestres das Escolas, dentro do currículo estabelecido, focar no aprofundamento de temas como liderança e participação ativa para que os alunos possam engajar-se, desde cedo ,no pleno exercício de sua  cidadania, na construção do Bem comum.

Nome do Aluno: Gabriela Monteiro
RG: 54.316.080-4                                    
Idade do aluno: 16


3 -      O caminho para o futuro

Pensemos no Ensino Médio como a porta para o futuro e o início de uma nova vida, a qual precisaremos  estar preparados e dispostos para as dificuldades e obstáculos que enfrentaremos até nos estabelecermos. Agora pensemos na escola como o meio de transporte para tudo isso. Será que esse meio e essa porta estão aptos para receber nós jovens, ou melhor ainda, será que a escola está preparada para nos incluir nesse futuro próximo?
A maioria de nós, como jovens do Ensino Médio das escolas públicas, nos preocupamos, agora mais do que nunca com o que viremos a fazer após a conclusão da escola, ou pelo menos é o que deveríamos fazer.  Como adolescentes críticos devemos exigir isso da escola, devemos cobrar que nos ensinem o que fazer ou não no primeiro emprego, como reagir com algumas críticas ou elogios e por último, mas não menos importante, a escola deve nos encaminhar para o mercado de trabalho e  mundo afora prontos  para o que “der e vier”.
O Ensino Médio é a etapa de fazermos uma das escolhas mais importantes para nossa vida: nós temos que escolher qual caminho seguir. E se a escola não nos mostra quais os caminhos, é difícil para nós tomarmos essa decisão sozinhos.Nossas escolhas certas dependem da Escola.
Portanto, é dever da escola nos preparar para o que nos espera fora dela e cabe a nós aproveitarmos essas oportunidades . Só assim , com preparo e vontade, poderemos encarar o futuro.
Nome do Aluno: Natália Pinheiro Pinto
RG: 53.217.311-9                                                       
Idade do aluno:14

4- Escola Não é Lugar Pra se Dormir, Mas Tem Seus Motivos

 Escola :um lugar onde passamos quase metade da nossa vida.Um lugar que é a base da nossa vida profissional;um lugar importantíssimo,mas que, muitas vezes, torna –se entediante.Não por falta de atividades pedagógicas ,mas sim por falta de entretenimento.
Há vários professores que planejam aulas  de maneira bem interessante,mas há também aqueles professores que não movem um dedo em relação a isso, continuam com a velha metodologia da lousa e giz.
É claro que o conhecimento é precioso e que o interesse por ele  tem que começar dentro de nós, muitas vezes,  a disciplina é bastante interessante,  mas quando o aluno entra na aula  “daquele professor” ,  ele desanima.
Nós, jovens, por mais que alguns tentem discordar, temos em comum a agitação.Sempre adoramos professores carismáticos e que , sempre que possível , planejam aulas interessantes e agitadas.
Portanto, o ensino médio que nós jovens queremos, não se trata só de  equipamentos  nas salas de aula,mas sim de professores  que procurem em si mesmos o seu amor pelo que fazem e que torne esse sentimento explícito no preparo de aulas para os jovens alunos.

Nome do Aluno: Elaíse Gabriele Martins
RG: 57.990.442-8                                         
 Idade do aluno: 14


quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Um continho do fim do mundo


Christina Aparecida Negro Silva

Paula, olhando aquela paisagem desértica, sorriu, lembrando-se de sua promessa ao terminar aquele namoro que se arrastava há quatro anos -  Vou para o fim do mundo – e lá estava ela, literalmente, no extremo sul do planeta, na Patagônia Argentina, rumo à última cidade antes da Antártida. O avião aterrissara em El Calafate em escala e ao descer parecia ouvir no vento sibilante a melodia do filme “ O dólar furado”. Viu-se em 3D, dentro da tela ,cuja paisagem, a  estepe, estendia-se a perder de vista, sem uma única árvore. Onde estaria o Giulliano Gemma ? pensou ela rindo de si mesma. Que loucura ! Justo ela, tão racional, sair de seu conhecido mundo e conforto para procurar um homem visto em um sonho ! Pipo. Quem seria ele ? Por que ela tivera aquele sonho maluco ,porém claro – Sou o Pipo, procure por mim no fim do mundo... seu personagem onírico assim se manifestava nos sonhos recorrentes de Paula. Por três vezes, ele aparecera e lhe dissera as mesmas palavras. Mistério.
Ruidosos turistas esperavam suas bagagens – uns 5 passageiros tiveram suas malas extraviadas e estavam no balcão reclamando suas perdas. Quantos brasileiros ! Gostoso ouvir sua língua no meio do burburinho espanhol. Pegou seus pertentes e rumou para o hotel Esplendor. Faria uma pausa em El Calafate antes de seguir viagem. O hotel localizava-se no alto de uma colina de onde podia avistar o lago gelado na frente e nas costas do prédio, as imponentes montanhas. Mais ao longe – os Andes com seus picos gelados. No dia seguinte, embarcou em um ônibus já cheio de turistas de seu país para visitar o famoso glacial “ Perito Moreno”. Soube que o nome era uma referência a um engenheiro que mapeou a costa da Patagônia e foi , tardiamente, reconhecido por seus feitos. O guia, falando um portunhol engraçado, comunicou aos passageiros que se olhassem à esquerda do ônibus, logo veriam o belo glacial . Eis que chega o momento esperado e ouve-se um uníssono – OH ! Tamanha beleza azul só poderia ser descrita emocionalmente assim. Uma majestade de gelo avança das montanhas rumo ao verde lago formado do derretimento das geleiras dos Andes. Da altura de um prédio de 20 andares reina por todo o ano. Mesmo no verão argentino, com temperatura oscilando entre os 09 a 13 º graus centígrados, o glacial mantém-se imponente. Impossível não agradecer a Deus por ver essa maravilha da natureza. Aos poucos, o exterior do glacial derrete-se caindo ruidosamente no lago. Um espetáculo que fazia pipocar os botões das máquinas fotográficas de todos  que ali foram conferir tanta realeza . Que fim do mundo mágico – pensou ela. Sentia-se como aquele imenso bloco de gelo, derretendo-se por dentro, procurando uma pessoa que vira em seu sonho. Derretida ? Aventureira ? Não encontrava definição para si mesma. Seu coração apenas lhe dizia para entregar-se ao novo, ao desconhecido, às novas aventuras. Começara bem, estava prestes a explodir de emoção quando chegou bem próxima, nas passarelas do parque nacional, ao “Perito Moreno”. Tanta coisa ainda por descobrir ! Jamais imaginara-se estar naquele lugar incrível. Sem expectativas, naquele instante só queria curtir a imponente montanha de gelo azulada ali à sua frente. Um grupo de turistas passou por ela. Uma baixinha falante, seu companheiro idem e outro casal mais jovem que diziam – Só dos pesos ! e riam, como eles riam ! Impossível não entrar no clima alegre que reinava ali. Pesos, a moeda argentina, equivale a 1/3 do real, quantas coisas poderia comprar se estivesse ali para isso, como as mulheres da excursão de brasileiros que de uma loja, entravam em outra. Nem mesmo o frio, o vento e a chuvinha fina que caía impediam as pessoas de brindarem o belo presente que receberam naquele dia. El Calafate, cidade pequena, nomeada pela frutinha de um arbusto espinhoso, próprio da estepe, entraria de vez em sua memória e em seu coração.
No dia seguinte, mais um vôo, agora sim para o fim do mundo ! O que esperar de Ushuaia, a última cidade porto antes do continente gelado ? Estava tão embevecida com o glacial que se tivesse que voltar naquele momento, já agradeceria a vinda até ali. Mas seu pacote incluía a procura por Pipo, então...
Ushuaia estende-se ao largo , aos pés das montanhas , uma faixa de casas coloridas  entre a baía do estreito de Benning e a Cordilheira dos Andes. Janeiro, calorão no Brasil , em Ushuaia, neve nos picos das montanhas. Nunca vira neve de pertinho. Será que teria a chance de sentir, tocar, escorregar na neve ? Por onde começar sua meta ? Seu hotel ficava na rua central e comercial da cidadezinha – Los Naranjos. Excelente localização para quem procura por um nome. Começou perguntando para os recepcionistas do hotel que lhe indicaram o centro de informações turísticas, na mesma rua, onde até poderia carimbar seu passaporte. Ah ! sim, Pipo ! Melhor pegar o trenzinho dos condenados e conferir de perto sua história – disse-lhe a mocinha do balcão  em bom português. Mais mistério.
Ao retornar ao hotel notou um rapaz sentado no hall lendo um livro – O TREM DO FIM DO MUNDO – O título chamou sua atenção,  o jovem também. Magia do olhar, ela olhando para ele que mudou a direção de seus olhos e a fitou brevemente, ambos por uma fração de segundo , analisaram-se – Paula, jovem, bonita, cerca de 30 anos, olhar travesso. O leitor, moreno, alto, rosto longo e sério. Belo. Marcou na recepção a visita à estação do trenzinho. De repente, chegaram os ruidosos turistas brasileiros, que também estavam hospedados no mesmo hotel. Notou que marcavam uma noite de vinho e queijo e bate papo animado. Será que o rapaz sério fazia parte do grupo. Opa ! Outro mistério ?
Na manhã seguinte, embarcou no mesmo ônibus dos brasileiros, rumo ao trem  do fim do mundo.  Nele também estava o moço moreno, acompanhado do livro e , coisas do destino, acabaram sentados lado a lado. O trajeto embora curto não foi impedimento para que se apresentassem e se conhecessem superficialmente. Demonstrando interesse na história do livro, Paula ouviu com atenção as explicações de Leandro - belo nome, como o dono – pensou ela. Ele explicou-lhe o porquê daquela região ser chamada Patagônia – local dos nativos pés grandes: patagons, em espanhol – ou Terra do Fogo, outro nome dado pelos espanhóis conquistadores ao local onde havia muitas fogueiras. Também ficou sabendo o  motivo de existir Ushuaia- baía virada para o oeste. A Argentina, na disputa pela conquista daquela região, enviou condenados para lá. Daí a origem do trem do fim do mundo: o transporte desses homens, presos do regime , que por 25 km iam buscar matéria prima para a construção da cidadezinha, principalmente a madeira da “lenga” na floresta nativa do local. Um terremoto, porém, ocorrido nos anos 50 do século passado, destruiu a maior parte da estrada de ferro. Apenas nos anos 90 ,um empresário interessou-se em resgatar essa história e recuperou os últimos 7 km das vias do trem do fim do mundo. A voz de Leandro era calma, quente. Paula sentiu calor nas faces, embora o termômetro do local marcasse 2º graus centígrados. Enfim, chegaram.
Trem vermelho, estreito, bem fechado, um mimo para os turistas de todas as línguas que se apertavam para comprar seus tíquetes. Separaram-se. Paula, vendo alguns  casais abraçados, pousando para fotos no belo cenário, sentiu falta de Leandro. Opa ! o estava acontecendo consigo, afinal? Avaliou sua situação – tirou férias, impulsionada por um sonho, viera até o fim do mundo, queria desvendar o mistério do tal do Pipo. Fez um amigo (?) , ouviu histórias do local, perdeu o jovem de vista e já estava sentindo sua falta ? Essa não ! – censurou-se.
Embarcou em uma cabine, rodeada por casais de muitas línguas – espanhol, português, inglês, francês – a música nostálgica e a voz gravada em tantos idiomas e em tom poético, provocaram  nela uma melancolia jamais sentida, ficou triste e sorumbática ouvindo com atenção a história contada. O trenzinho serpenteava as lindas paisagens : rios, vales, pequenas pontes, um cemitério de árvores a céu aberto, imagens de tocos, parecendo cadáveres descarnados em sua madeira branca...Um condenado tentou fugir, pulou do trem. Alguns dizem que sobreviveu e constituiu família junto a uma nativa, mas o certo mesmo é que morrera congelado. Seu nome, porém , ficou registrado na história do trem do fim do mundo, Pipo... seu coração deu um salto! Seu fantasma onírico existira de fato ! E lá estava ela, ouvindo sua história dramática. Pobre Pipo, tentou a liberdade. Daí em diante, não conseguiu ouvir mais a voz da guia. Em seus ouvidos, ricocheteavam a voz do Pipo fantasma – eu procurei a liberdade, correndo todos os riscos e você, o que procura ? O que procurava ? Não sabia responder. Tinha um bom emprego, era realizada profissionalmente. Terminara um relacionamento que a consumia por anos, queria sua liberdade, afinal. Onde a encontraria ? No fim do mundo ? Quanto mistério preparara-se para si mesma. Tão conversando consigo estava que nem percebeu que o trajeto chegara ao fim. Foi a última a desembarcar. Viu esquecida no banco uma mochila verde, levou-a para as simpáticas atendentes. Quem a esquecera, logo viria resgatá-la, pensou.  Ela também esquecera suas emoções em tantas estações ! Encontrar-se com elas naquele local foi a sua melhor sensação em anos. Onde estaria o moço moreno de voz quente ? Não queria perder essa emoção jamais. Decidiu o que faria dali prá frente.
O retorno para o hotel foi feito de ônibus. Estranhou não ter a companhia de Leandro. Ele não estava mais entre os passageiros. Por onde se escondera ? Estava ele também, como Pipo, procurando sua liberdade ? Paula já a encontrara.
Na manhã seguinte, dia de subir a montanha – Martial – para ver, sentir e escorregar na neve. O percurso incluía – táxi, teleférico e muita caminhada íngreme por terreno lamacento .Enfim, a neve ! Outra sensação indescritível para uma habitante de país tropical, cuja temperatura baixa não ultrapassa os 7º graus no inverno na cidade de São Paulo. Gosto de gelo de congelador. Aparência idem. Brincadeiras de criança. Uns atirando bolas de gelo nos outros. Gargalhadas, tombos e muita alegria. Na descida, pausa para um chá quentinho no chalé ao pé da montanha com direito a ritual - almofada, erva, chaleira e até uma ampulheta para controlar o tempo de infusão. Onde estaria  Leandro ? Tão bom seria poder dividir este momento glorioso com ele. Sua razão lhe dizia que amor à primeira vista era coisa de folhetim barato, sua emoção pulsava negando essa racionalidade. Estava apaixonada ! Sentia-se livre para amar novamente e com toda intensidade para derreter até o gelo das Cordilheiras. Riu e olhou em volta para ver se alguém havia notado sua insensatez, mas qual ! As pessoas estavam tão excitadas pela aventura que uma risada a mais não faria a menor diferença naquela imensa alegria reinante.
Já na entrada do hotel, ela o viu. Sentado no mesmo local onde o encontrara pela primeira vez, lendo seu livro. Chegou de mansinho, parando à sua frente. Leandro levantou os olhos e ato contínuo sorriu para ela  - Senti sua falta – disseram simultaneamente. E claro, riram pela tamanha coincidência. Não registrou tudo o que se passou depois, apenas que estavam sentados bem próximos, conversando como velhos conhecidos. Descobriu que ele era historiador, que escrevia para um blog e recolhia histórias surpreendentes dos povos da América Andina. Sua próxima parada seria Mendozza, partindo dali para o Chile. Um convite. Um “aceito” sem incertezas. Paula , Pipo, livres em suas decisões.


quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Adelle


Christina Ap. Negro Silva

Abriu uma porta. Nada. Outra e mais uma. Nada. Ouvira  aquele barulho novamente e vinha do andar de cima. Parecia o ronco de um despertador do celular – há dias o escutava e não conseguia identificar sua localização. O que seria aquilo? Não se lembrava de ter deixado  nenhum aparelho ligado nos cômodos da casa. Era sim uma casa grande e velha, já estava mobiliada quando se mudara ali há tantos janeiros, que nem mais se lembrava com exatidão do ano. Àquela época, tinha verificado em todas as gavetas, portas de armários e não se lembrava de ter visto nada além do mofo nas paredes. Estava só, completamente só. Este incidente, porém, até trouxera-lhe algum alento – tinha algo para ocupar –se : descobrir o causador do barulho.
O que parecia uma brincadeira, com o passar dos dias, tornou-se uma obsessão – era preciso encontrar a COISA SONORA a qualquer custo. Planejou com cuidado de detalhes sua inspeção pela casa – ou melhor, pelo andar de cima, pois tinha certeza de que o som vinha dali.
Primeiro o banheiro, palmo a palmo vasculhado – dentro do armarinho, encontrou apenas a pasta e escova de dentes e um velho aparelho de barbear – Será que funciona ?  pensou, enquanto o colocava na tomada ... rooommm – gemeu o dito sob suas mãos . Como o jovem imberbe que anseia por fazer sua primeira barba, levou-o com cuidado à face enrugada. Sensação boa, lembranças de um tempo engravatado, trabalho de abotoaduras, vida apressada em pasta de couro. Desligou-o e voltou à sua obstinada tarefa. No banheiro não estava.
O quarto da filha, sua próxima parada. Entrou devagar, talvez com receio de acordar as recordações que ali jaziam. A filha tinha casado há dois anos, mas seu perfume ainda rescendia nas paredes. Parou um instante para observar ao redor – teto claro, chão limpo e encerado, cama arrumada, escrivaninha organizada, penteadeira vazia. Onde havia guardado a imagem da filha na moldura do espelho que lhe sorria? Agora, parecia que a via ali, presa em um tempo-espaço de sempre – atenciosa para com ele quando  a procurava para uma conversa, uma dúvida, um carinho em palavras. O silêncio, porém, reinava implacável. Vasculhou tudo, nada encontrou. Receoso, foi andando de fasto, pés  para trás, para não se despertar daquela memória: a filha sorrindo, penteando seus cabelos, passando o batom, o som cálido de sua voz de menina-moça. Chacoalhou a cabeça, ele tinha um propósito, não devia dar-se ao desfrute de sentir essas sensações todas, não depois de tudo o que lhe havia ocorrido.
O quarto do casal – nunca mais tivera coragem de penetrar seu corpo naquele recinto, sua alma o visitava com frequência, isso sim, mas a carne, o sangue, todo seu ser, arrepiava-se ao tocar na maçaneta da porta. Mas agora, não tinha jeito, ele precisava encontrar a COISA SONORA. Fechou os olhos por um instante e tocou a porta, empurrando-a com força. Talvez quisera espantar a imagem que tinha diante dos olhos da sua recordação – a mulher sem vida jazia naquela imensa cama, seus brancos cabelos emolduravam seu rosto pálido e sereno. De um salto, pulou sobre a cama vazia, chorando como uma criança que tem seu brinquedo arrancado à força. Que saudades ! Quanta falta sentia dela. Quantos beijos secos, abraços estragados, palavras ocas ,  o tempo – este inexorável senhor – levou embora ? ! A solidão era sua melhor companhia, se não fosse aquele terrível barulho a tirar-lhe da zona de conforto que sua nova amante lhe propiciava, ele jamais teria entrado no quarto do casal.
Tramm- trammm- ouviu o som tão perto. Ah, então era ali que ele brincava de pique esconde ? Foi aproximando-se mais e mais do criado mudo. O diário da esposa cuidadosamente deixado sobre o tampo, seus óculos de leitura ao lado, a gaveta entreaberta e ... ali estava o que tanto procurava ! Um pequeno porta-joias de madrepérola – trammm- trammmm  - tremeu o maldito. Até que enfim, a busca estava terminada. Mas o mistério persistia. Depois de tantos anos , como a corda ainda funcionava ? ou melhor, emperrara , provocando o barulho do desassossego ? Pegou o objeto nas mãos e deu-lhe cordas – uma melodia, uma valsa vienense ou algo parecido, encheu o quarto. Ele deixou-se bailar nos pensamentos. Viu-se jovem, elegantemente trajado,  tirando a menina de cabelos encaracolados para dançar. Valsou pelo salão, sussurrou-lhe palavras de amor...Valsou pela cidade, viu-se bem sucedido em seu negócio. Valsou pela vida – viu-se novamente só, sem a mulher amada, sem qualquer humana companhia, tocou o diário e ato contínuo, viu-se abrindo o caderno e lendo o último registro feito – Querido, sei que um dia você acabará por encontrar-me (...) aqui , você estará com meu amor em palavras escritas. Eu sabia que partiria antes de você, (...) não fique triste, vivemos felizes e isso é tudo o que importa. Por favor, nunca se esqueça de mim, de nós, do que fomos (...) Com carinho, tua Adelle.

Meu Deus ! Ela já sabia que estava morrendo. Ele fizera segredos, proibira as visitas dos parentes, ela fora tão forte. Chorou, soluçou, chamou-a pelo quarto vazio, passou não se sabe quantos minutos naquele estado de descoberta e saudade. Por fim, carregando o diário e o  porta joias, desceu para o primeiro pavimento. Agora teria sua Adelle a fazer-lhe companhia. Uma vírgula, porém, interpunha-se nesta sua nova fase de lobo solitário – como a corda do aparelho voltou a funcionar / emperrar depois de tanto tempo ?

sábado, 2 de novembro de 2013

Parodiando Marina Colasanti, “ eu sei, mas não devia”



Christina Aparecida Negro Silva – 58 anos, diretora de escola, professora, contadora de histórias e hoje, cronista assustada com essa absurda “onda de violência”.

01/11/13
                                                          
Eu sei que estamos todos, ultimamente, assustados com a violência, tão presente em nossa sociedade, haja vista a quantidade de notícias que tratam sobre este tema. Ao ligar a TV, logo cedo, somos “metralhados” por uma série de notícias ruins – acidentes, roubos, agressões de qualquer ordem, abandono, tudo o que nosso humor matinal não gostaria de ouvir. Eu sei que deveria achar que isso é  natural, afinal, a mídia tem que cumprir seu papel de divulgar os acontecimentos, os quais, recentemente são péssimos e em todos os canais; a qualquer hora do dia, as notícias se repetem : bala perdida mata criança na rua , sequestradores seviciam e matam suas vítimas, idosos são ludibriados por marginais, a Cracolândia recebe não sei quantos mais viciados/dia, maluco atira em estudantes dentro de escola...
Meu Deus, para tudo ! Somos tão absurdamente envolvidos que perdemos o bom senso  no trato com outros humanos, nos fatos simples da vida. Agimos desconfiados, temos medo de tudo e de todos,  nossas casas vivem trancadas, lacradas, evitamos sair à noite ou até deixar o carro em qualquer rua. Eu sei que isso é normal, mas não devia ! Não deveria ser normal agir com desconfiança nas atividades corriqueiras do dia-a-dia. Parece que somos controlados pela mídia, seguindo regras ou tendo posturas que desafiam nossa autonomia.
Hoje pude sentir na pele esta teoria a que estou me referindo – as pessoas perderam o discernimento e agem como marionetes controladas pelo senso comum , ou seja,  é preciso desconfiar de todo mundo ! quem quer que seja, é sempre uma ameaça...vejam o que me ocorreu ...
Fui até uma igreja, rezei um pouco e dirigi-me à secretaria, cuja porta de ferro estava entreaberta, a atendente passou por mim rapidamente, fechou a porta e ainda passou o ferrolho. Tomei um choque ! Sou uma senhora de quase 60 anos, ela também já deve estar na casa dos “entas”. Uma vez lá dentro, engaiolada entre as grades da porta , protegida de MIM, disse:
__ Pode falar.
__ ....
__ Pode falar – repetiu em tom mais alto.
Recuperada do susto, balbuciei – quero marcar uma missa de sétimo dia... Era mesmo necessário fechar a porta, passar o ferrolho, atender-me daquela maneira ? O que a fez pensar ( se é que pensou ) sobre mim ? que eu iria assaltar a secretaria ? fazer-lhe mal ? praticar atos delinquentes dentro da igreja ? Meu Deus ! Eu sei que devia entender o cuidado daquela senhora, mas não consigo. Não entendo este exagero a que estamos acostumados a agir por conta dessa  glamourizada  violência que nos cerca. Além do susto e constrangimento por que passei, ficou-me uma dor imensa de saber que todos nós, independente da idade ou modo de agir, sofremos violência gratuita de pessoas simples que , teoricamente, deveriam ter a função ou a missão de nos dar atenção. Apenas isso.
Por isso, reforço : eu sei que a violência é pano de fundo nas atuações da sociedade , mas não devia, ou melhor,  EU não devo conformar-me com isso. Em meio a tantas ações descabidas, somos pessoas que se relacionam no dia-a-dia em várias situações e, no mínimo, soa muito estranho tanta desconfiança nas nossas pequenas interações sociais. Talvez seja este o motivo por haver tantos boletins de ocorrência com queixas de preconceito. Olha, no meu caso, só se for preconceito contra baixinha, gorda e bem madura . Se ela estiver lendo este texto, o preconceito também a ela se aplica.
Que coisa !

terça-feira, 16 de julho de 2013

Je me souviens ou as impressões de uma brasileira sobre Montreal, QC, Canadá


Christina Negro Silva

Tomo emprestado - Je me souviens – traduzindo : Eu me lembro, verso ícone dos québécois de um conhecido poeta da mesma origem , como título desta crônica para homenagear este incrível e imenso país, o Canadá. Eu também me lembro, assim no tempo presente mesmo...porque na minha memória as impressões ficarão sempre ali, remanescendo emoções, cheiros, sabores, imagens fixas na retina das recordações.
 Tiramos ( o marido e eu ) 15 dias de férias para visitar o filho, morador há um ano e dois meses em Montreal. O leitor já deve ter tido algum ente querido distante e pode imaginar nossa expectativa e estado de espírito ansioso para chegar a hora de rever nosso filho. Para nós, o passeio tinha conotação secundária, já que o primeiro objetivo era matar a nossa saudade. Logo, não tínhamos aquele frisson característico dos turistas, talvez, por isso, sinto-me à vontade para relatar aqui tudo o que vi, senti, apreciei nesses dias. Vou dividir este texto, então,  em sensações para organizar meu pensamento ao escrever sobre essa viagem.
A  primeira impressão : VISÃO: Montreal é uma cidade grande – 3 milhões de habitantes, mas nem parece ter tudo isso, haja vista a tranquilidade em metrôs, ônibus, trânsito. Gente nas ruas ( claro, mãe, é verão ! – diria meu filho ), tudo junto, mas não misturado...explico-me – há muitas tribos, se assim posso chamar os grupos diferentes que vi – gente com piercings, tatuagens, cabelos multicores, engravatados, bem vestidas em trajes de festa, etnias diversas em duplas, em turmas, separados e juntos. Também vi muita gente bonita e simpática de lá mesmo ou imigrantes de muitos países, cidadãos canadenses. Vi ruas limpas, flores enfeitando as árvores, os postes, as casas. Prédios imensos só na área central da cidade, as demais construções obedecem a um padrão – blocos de 4 andares, quadrados, com escadas de acesso à porta principal. Tudo igual se não fossem os telhados, pintados em cores berrantes e os detalhes nas bay-windows e portas. Este padrão torna a cidade aconchegante e harmoniosa. Também seguem em simetria os vários parques espalhados pela cidade, grandes gramados , árvores gigantescas, lagos ( que no inverno viram pistas para patinação no gelo ), flores coloridas, muitas variedades, um agrado aos olhos. A estrada margeando o rio Saint Laurent também é outro presente para as cansadas vistas da autoestrada – casinhas lindas, pintadas com cores extravagantes – azul marinho com janelas brancas , laranja com detalhes em marrom, cinza com vermelho e outras combinações agradáveis, assim também na zona rural, os celeiros e seus telhados recortados geometricamente, os cilos imensos em formato de ogiva ou outra comparação menos catastrófica. É certo que no verão, tudo fica mais brilhante e vivaz, por isso, muito bom guardar essas imagens assim tão nítidas. Para tudo, pausa para uma foto , na ânsia de perpetuar em imagens o que me suscitaria sentir as mesmas emoções ao revê-las.
Segunda sensação – TATO. O abraço de meu filho, suas esquisitices em tirar os “cravos” de meu rosto, a grama macia dos parques, uma sensação de seda gelada, refrigério para o calor de 30  graus ! Água potável e de graça para todos os sedentos – em casa, nos parques, nos restaurantes, assim deveria ser em todos os lugares do mundo ( lembro-me de meus 10 anos, morando em Tambaú, um pequeno município do estado de São Paulo, quando disseram que a água, um dia, seria cobrada ! Eu me perguntei – como assim ? como será cobrar por água? Uma dádiva da natureza não pode ter dono ! – santa ingenuidade...hoje quanta água já paguei...). Água pura, saudável, fria, quente, chuva de verão, gostosa de tomar ( mesmo à noite, em Quebec, a caminho do B & B). Toque de apertos de mão – firmes, interpretando-os : sinceros.
Terceira sensação – PALADAR – Não há uma comida típica canadense, há sim uma variedade imensa de outras culturas gastronômicas à escolha do freguês: da Grécia, da Itália, da Tailândia, da Índia, da  China ( em profusão – muitos chineses e outros asiáticos já são cidadãos canadenses ),de Portugal, até do Brasil ...aff ( como diria minha filha ) tanta comida assim daria para alimentar o mundo todo ! desde que paguem por isso, por que não ? pois é, os pratos típicos são  caros, como nos grandes centros do Brasil, mesmo assim os restaurantes estão sempre lotados, e haja local para comer ! Montreal tem muitos restaurantes e a “ Tim Horton’s” – uma franquia de fast-food  que domina este segmento, lanches baratos e os doces –em sua maioria douhghnut ( uma espécie de massa de farinha de trigo, recheada com cremes e uma espécie de geléia de frutas locais- as berries – frutinhas sem graça ao nosso paladar, bem delicadas e bonitas ). Vinhos bons, embora os estrangeiros façam mais sucesso ali. As pizzas são de massa grossa e há aquelas  baratas que são apenas massa e molho de tomate( sem queijo, sem nada - ugh !), claro que se pode acrescentar o recheio, mas eu vi um rapaz comendo um pedaço assim mesmo. Ah, que maldade, estava me esquecendo de mencionar a famosa POUTINE – um petisco ou às vezes, uma guarnição de lanches. Talvez, ela seja o prato típico daquela região do Canadá: batatas fritas e quadradinhos de queijo  tipo frescal, cobertos com um molho especial, parecido com o barbecue. Ao receber o calor do molho, o queijo fica puxa-puxa, mas a batata frita perde sua crocância.  Gostoso e enjoativo. Outra iguaria  típica são as carnes defumadas – de boi, porco, ovelha, peru, frango e até de peixe. Um item de degustação importante para o turista. Bom, forte, cultural ( já que a defumação é conservante alimentar em países castigados por invernos rigorosos ). Café é um susto para os brasileiros – copos grandes de chafé são consumidos pelas pessoas, em toda hora e lugar e até para acompanhar as refeições e lanches.  Para tomar um cafezinho parecido com o nosso, melhor pedir um espresso alleong ( para nós, um expresso longo ). Nos supermercados, há muitos pós de café de regiões produtoras do mundo afora – África, Colômbia, Equador, República Dominicana... do Brasil ? Só em lojas de produtos importados e custam “os olhos da cara” – nunca mais vou reclamar do preço de nosso café quando comprá-lo aqui em nossos supermercados, eu juro ! Para mim, boa gourmant ( e gourmet também ) que sou, a comida é pouco temperada, tanto de sal, açúcar, pimenta ou outros temperos conhecidos por nós – alho, cebola, orégano...Meu filho, que já está adaptado, estranhou eu ter reclamado da falta de alguns deles. Talvez, se ficasse mais tempo, também me acostumaria...Há muita variedade de frutas, legumes e verduras frescas. Carnes, peixes, frutos do mar, leites com tantas derivações que a gente até se perde para escolher – 3%, 2 %,  1 % de gordura, desnatado, semi e tantos etecéteras. País desenvolvido e industrializado é isso – muitas escolhas para o tudo igual.
Quarta sensação – AUDIÇÃO – Os québécois são francófonos e fazem questão de o ser. Também falam  inglês como segunda língua, mas adoram e têm orgulho em falar francês. Nas sinalizações de rua e nas liquidações das lojas – o idioma é o francês. O atendimento aos turistas pode ser bilíngue, mas não se iluda, o inglês é uma segunda opção. É bonito ouvir o povo nas ruas, som harmonioso aos ouvidos latinos, da mesma raiz. No estado do Quebec, há uma resistência à hegemonia britânica – na cultura que relembra sempre a França - na arquitetura, na língua, nos boullevares  charmosos, na religião. Parecem dizer para os demais estados do Canadá – Somos católicos e  falamos francês ! quer queiram ou não, nem ligamos. Uma advertência a quem pretende obter cidadania canadense e morar neste estado – aprenda francês ! Se não, não vai conseguir arrumar emprego facilmente, porém  há sites que ensinam o estrangeiro a falar o idioma de graça, mas é bom pensar em frequentar um curso regular para aprender também a escrever ( os melhores empregos são reservados a quem domina as duas habilidades – falar e escrever bem o francês ). Além do idioma dominante, há muitos sotaques dos estrangeiros que vêm em busca de melhor qualidade de vida – uma orquestra , uma sonoridade fabulosa !
Quinta sensação – OLFATO – Cheiros de todos os tipos, identificando os espaços – de restaurantes , boulangeries ( padarias  sofisticadas com variedades de pães, bolos, brioches, tortas...), de vinhos frutados, de flores – ah, que perfume suave têm as flores do carvalho canadense ! delicadas e fugazes – florescem e em apenas dois ou três dias já perdem seus cachinhos  cor de baunilha. Perfumes finos ( franceses, claro ! ) ou os globalmente conhecidos – Polo, Ralph Lauren, Carolina Herrera, dentre todas as outras marcas. Cheiros acres, doces, fortes, suaves, inebriantes... haja narizes !
Pois então, tentei resumir ou descrever minhas impressões sobre  Montreal e as regiões do Quebec que visitei. Região turística, arrumada para os visitantes, muito limpa, organizada, atraente. A cidade de Quebec é uma lindeza, conquista pela organização e por sua História, um símbolo da resistência francesa ao poderio anglicano. As construções do período de dominação francesa são bem conservadas e focos do turismo local. Os eventos de verão acontecem em áreas abertas, convite ao público, gratuitos. Os restaurantes expandem seus espaços pelas calçadas, enfeitadas todas com vasos de flores, os quais são cuidados pela prefeitura ( os carros passam molhando as flores, quando não chove e faz calor insuportável ) – as ruas são cartões postais ! Conheci a cidade subterrânea  em Montreal, que abriga a população durante o inverno. Dizem seus habitantes que há duas estações do ano ali – o inverno e Julho, quando o verão ocorre em todo o seu apogeu – sol das 5 a.m. às 9 p.m. – calor, tempo para encontros, concertos, passeios, piqueniques nos parques, longas caminhadas por toda a cidade, hora de pedalar as bicicletas que  ficaram descansando no longo inverno, rever amigos, beber cerveja nas muitas cervejarias artesanais espalhadas pela cidade, enfim, viver o verão.
Entrei no país com o propósito único de rever e abraçar meu filho, ver onde mora e como está no seu estudo e trabalho, de lá, porém,  saí gratificada com dois presentes – a convivência familiar e o turismo que veio anexo ao meu intento. Gostei muito dos dois, voltei renovada, feliz, agradecida a Deus por ter tido essa oportunidade de 2 em 1. Não posso deixar de registrar que fomos os primeiros brasileiros a chegar no B & B do “Gile” em Rivière do Loup. Estávamos off road da rota normal para os turistas de nosso país, por isso, colocamos o  primeiro alfinete sobre o mapa do Brasil. Do leste dos EUA, o mapa múndi estava cheio de alfinetes, muitos na Europa e alguns na América Central. O hospedeiro, pai do proprietário, um senhor muito simpático, ficou feliz em ter hóspedes brasileiros ali. No café-da-manhã fomos muito bem servidos com crepes preparados na hora pelas netas gêmeas – recheados com creme patissieur, frutas da época e top de chantilly. Tudo artesanal e chic, muito chic !  

Um dia, daqui a alguns anos, pretendo voltar, tenho mais a conhecer e a viver no Canadá – quero estudar sua história, aprender francês, passear por outras cidades ícones desse imenso país. Je me souviens.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

FLORES NAS JANELAS


Christina A. Negro Silva


      Dizem que os olhos são as janelas da alma. Não há ditado melhor para definir meus sentimentos sobre a Itália...minha alma voltou de lá florida, como as janelas das casas italianas. Não somente as fenestras são enfeitadas – portas, escadas, até pontes são adornadas com flores.  Os olhos dos passantes ficam sorrindo e pelas ruas vão seguindo outros encantos – uma caminhonete minúscula, parecendo de brinquedo, carregada de caixas de maçãs; um cachorro diferente, mas simpático ao nosso chamado; as montanhas suntuosas; oliveiras ao sabor do vento, roseiras multicores nos jardins públicos e particulares; as parreiras impecáveis amadurecendo vinhos; as fontes de água boa e cristalina nas piazzas, nos parques, entre arvoredos, nas ruas. Impossível manter-se indiferente, sem soltar um oh ! que lindo ! Outros sentidos também ficam aguçados – olores variados de flores, temperos, plantas do campo, abrem caminho para o paladar degustar sabores incríveis – um café macchiatto, o indescritível tiramissu ,  as tortas de mil folhas com creme de baunilha saborosíssimas, as pastas al dente, o gelatto ( depois de provar o sorvete de cereja fresca, não me atrevo mais a pedir este sabor nas sorveterias – quero guardar para sempre aquela  sensação  travessa de saborear algo único na vida ).
           Puxa, desculpe-me,  amigo leitor, estava tão ansiosa para escrever as minhas impressões sobre a Itália que nem me dei conta de que não fiz as apresentações necessárias para a leitura desta crônica. Pois bem, depois de anos ensaiando uma viagem de retorno às origens italianas (meus quatro avós eram italianos), finalmente, tirei quinze dias de férias e fui conferir tudo o que, em sonhos, imaginava sobre a terra de meus nonos. Confesso que encontrei muito mais do que ousei sonhar, ainda bem ! Minha nonna Emma costumava dizer que tudo era bonito, mas como viera muito criança para o Brasil, às vezes, sua memória a traía e ela misturava as paisagens. Ela veio de Pádua (Padova, em italiano, a terra de Santo Antonio), local muito próximo de onde fiquei hospedada por 10 dias  e posso dizer, com certeza, que minha nonna não fez propaganda enganosa – a paisagem de folhinha (alguém se lembra ?) nos cercava e acompanhou-nos por toda a nossa estada naquele belo país. Uso o “nós”, porque fiz parte de uma excursão de descendentes de tiroleses de Piracicaba e de outras cidades do Brasil que viajaram para ver ou rever seus parentes que ficaram por lá. Tive sorte, fui bem acompanhada e a viagem tornou-se ainda mais prazerosa – nada como estar rodeada de pessoas alegres, educadas e prontas para tudo, de bom, claro !
Nesse período, tivemos um tour bem variado:  conhecemos Roma a pé...meu Deus, acho que nunca andei tanto na vida ! Chegava ao hotel exausta, um banho e cama. Como não emocionar-me com os afrescos da Capela Sistina ! ou apreciar os detalhes da “Pietá” ? ou aguardar pacientemente nas filas de acesso à Basílica de São Pedro, ao Museu ?  e tomando sol de verão na praça do Vaticano! Roma é uma cidade engraçada, contemporânea, normal, cheia de prédios e lojas e ... de repente, no meio de tudo – um monumento do passado – a Fontana de Trevi , contrariando o que sempre imaginei, fica prensada entre edifícios, e só não é acanhada, porque é de uma beleza ímpar e atrai para si toda a atenção dos turistas (se bem que muitos estavam mais interessados nas lojinhas ao redor  -  tempos de consumo !).
De Roma a Assis, uma cidade medieval no século XXI. Novamente, impossível não sentir emoção à flor da pele. São Francisco de Assis tem um carisma extraordinário ainda hoje – rezar sua oração da humildade dentro da sua igreja é um privilégio do qual não abri mão e abri meu coração para as lágrimas correrem à vontade. Que força espiritual maravilhosa, que cidadezinha linda, que paisagem deslumbrante ! Flores e mais flores nas ruas, janelas, paredes de pedra.
     Veneza, então, é uma coisa de louco! Literalmente. Aquela muvuca de gôndolas, barcos, lanchas, ferryboat e sei lá mais como chamar os transportes marítimos ali...ai, meu Deus, agora vai bater...vupt ! que fina! os gondoleiros garbosos (o nosso era também cantor dos bons !) mostram toda sua habilidade naquele trânsito maluco. As ruelas entre o casario medieval, em terra, também são lotadas de transeuntes, as lojinhas de souvenires idem. Onde achar um banheiro ? ou um banco para descansar as cansadas pernas ? Missão difícil ! Naquele dia nessa magnífica cidade-ilha, houve um terremoto – 3 pontos e meio na escala, percebido por alguns companheiros da excursão. No momento, estávamos passeando de gôndola e nem o iríamos sentir tal o chacoalhar de ondas do grande canal. Aventuras de turista para guardar para a posteridade.
Horas de trem bala pela Toscana foram outro presente para os descendentes dos imigrantes italianos. Marcas do recente terremoto em alguns lugarejos, rolos de feno a perder de vista pelos pastos, plantações douradas de trigo que me remanesceram trechos de “ O pequeno príncipe”, uma vasta planície verde e agriculturável totalmente ( nosso código florestal não teria sucesso ali, não. Plantações de videira, principalmente, nas encostas dos morros, deixaria com vertigem os ecologistas brasileiros mais extremados).   De repente, norte da Itália, gigantescas montanhas emparedando as cidades da região de Trento. As imponentes dolomitas sustentando os Alpes...Ah, a neve ! que espetáculo raro para mim, voltei a ser criança, jogando bolas geladas nos colegas, recebendo outras, afundando o pé nos montes brancos e fofos, observando entre fascinada e respeitosa os picos alvos dos Alpes e as fronteiras – logo ali, Áustria, Alemanha, mais adiante, a Suiça. Aulas de geografia ao vivo e em cores, apesar do branco liderar absoluto.
De Trento, partíamos todos os dias bem cedo para conhecer outros locais igualmente maravilhosos – o lago Smeraldo, gelado, formado pelo derretimento da neve no verão europeu; o santuário de São Romédio – edificado sobre um penhasco, cuja subida já era uma promessa a ser cumprida. Paisagens de tirar o fôlego – castelos remanescentes do período feudal, suntuosos no alto das montanhas menores, os vales emoldurados por rios verde-acinzentados ( forte presença do calcário ) , espessos e velozes, sinuosos pela paisagem verde, florida; a travessia de balsa de Riva del Garda para Limone, um lugarejo incrustrado na montanha, de uma beleza singular. Classifico-o em primeiro lugar no item - “paisagem de folhinha”. Sentar em frente à lagoa, saboreando um spritz no fim de tarde ... que tudo !
      Agora, um destaque à parte para os tiroleses ! Que povo hospitaleiro, alegre;  junto com eles revivi cenas de minha infância: minha família sempre esteve rodeada de parentes para reuniões festivas – jantares, almoços, onde havia abundância de comida, vinho bom e música. Assim como lá. Bateu-me uma sensação de deja vu e  entrei no clima : comi, bebi, cantei, chorei, lavei a alma ! Saudades de meus queridos que já se foram, mas que me deixaram de herança essa paixão por tudo o que nos toca e faz bem ao coração – marca latina da qual muito me orgulho. O coro La Tor, formado essencialmente por homens, parece ainda ecoar em meus ouvidos – que afinação ! que harmonia ! quantas saudades !
      Tenho ainda muito mais para dizer sobre este país que, se não é meu de nascimento, sempre o foi de minha cultura doméstica – cresci ouvindo histórias de lá, cantando as músicas folclóricas e populares da Itália, aprendendo os aromas da culinária italiana, apreciando o bouquet de bons vinhos, degustando as sobremesas deliciosas e seus cafés cheios de personalidade. Vou finalizar este texto, porém. Outro dia, volto a abrir o relicário da minha alma para contar um pouco mais de onde tudo começou ...

domingo, 24 de julho de 2011

AOS AMIGOS ESCRITORES


Christina Aparecida Negro Silva (educadora, contadora de histórias e escritora)

Já me sentei umas pares de vezes na cadeira defronte deste computador que me serve para escrever as minhas homenagens aos caros amigos escritores, os quais ainda acompanham-me neste quase meio século de domínio desta linguagem fenomenal – a escrita ! Pareço a personagem de Clarice Lispector em “ Felicidade clandestina”, postergando o momento sentir-se feliz em ler o livro; no meu caso,de deixar sair as palavras que, insistentemente, gritam dentro de mim – diga-lhes o que sente, vamos, mãos à obra ! O que realmente sinto é uma profunda gratidão a todos eles e faço desta data – 25/07 – DIA DO ESCRITOR, uma simples e sincera crônica de agradecimento aos consagrados, aos conhecidos e aos desconhecidos escritores que fazem nossa vida mais alegre.
Gosto de ler, mas gosto ainda mais das pessoas que me fazem ler, que provocam em mim este desejo de adentrar às páginas dos mais diversos livros – literatura brasileira, universal, clássica, popular, best sellers , paradidáticos – enfim, todos e qualquer um, não tenho preconceitos, sou leitora ! Faço minhas as palavras de Daniel Pennac em “Como um romance” – o leitor tem o seu direito – se quiser continuar lendo, muito bem. Se não, fecha-se o livro e procura-se outro; fiz isso a vida inteira e não me arrependo, porque pude, com prazer, selecionar meus queridos amigos escritores.
Assim foi que comecei minha vida de leitora, emocionando-me com José Mauro de Vasconcellos em “Rosinha, minha canoa” e “ Meu pé de laranja lima” – quanto chorei, meu Deus !Ou devorando Monteiro Lobato, rindo do alter-ego “Emília”- irônica, debochada, autêntica. Na escola do século passado me foram apresentados: Machado de Assis e José de Alencar, também Camões e Fernando Pessoa e ainda (pasmem!) Shakespeare já no que hoje chamamos de ensino Fundamental II. Fiz uma amizade certeira com eles e para sempre.
Outros vieram engrossando a minha lista de amigos preferidos: Jorge Amado em “ Tenda dos Milagres” e todos os demais escritos sobre as fortes mulheres bem como o belo “Capitães da Areia”; Aluísio de Azevedo com sua franca e contundente linguagem; encantei-me com Érico Veríssimo em seu engraçado “ Incidente em Antares” ou com ele mesmo chorei em “ Olhai os lírios do campo” ou maravilhei-me com os outros livros das trilogias.
Fui, devagar e permanentemente, tornando-me uma leitora mais autônoma, sem necessitar das indicações de meus mestres de então; virei uma freqüentadora assídua da biblioteca municipal, a qual ficava no meio do caminho entre minha casa e escola, sentia-me privilegiada e pude conhecer Morris West, Agatha Christie, Sidney Sheldon e tantos outros escritores da literatura universal - Charles Dickens, Mark Twain, Dostoiévyski, Conan Doyle, Victor Hugo (pai e filho), Jane Austen e outros mais que minha memória me trai, não me recorda dos nomes dos amigos, mas lembra-me de algumas de suas obras – “ Fernão Capelo Gaivota”, “Amores sobre o Don” , “ “Uma folha na tempestade”, “ Dois pontos e uma reta” ( esse me fez virar a madrugada lendo ), “Anjos e demônios” ... deixo minha lista com reticências , mas cheia de remorsos por não conseguir lembrar-me deles, tão caros e especiais que comigo fizeram-se presentes.
Só poderia tornar-me o que sou: professora, de leitura e redação, pois com toda essa paixão pelos livros e seus homens e mulheres que os escreveram, pude mais tarde indicar ( também apreciar ) outras leituras : as crônicas de Luís Fernando Veríssimo – todas, sem exceção – são especiais com seu jeito peculiar de dizer e fazer-nos rir ou pensar. Também sou fã de carteirinha de Marina Colasanti que não só tenho o prazer de ler, como também especializei-me (pretensão ?!) em contar suas fascinantes e sinestésicas narrativas fantásticas. J.K.Rowling também me encantou, e com ela vi crescer os jovens personagens da série “ Harry Potter” no cinema também.
Para todos eles e aos mais recentes amigos : Ana Maria Machado, Samir Meserani, Ivan Jaff, Walcyr Carrasco, Lya Luft ..., e aos escritores e poetas amigos locais – Ivana Negri, Carmem Pilotto, Leda Coletti, Élder Santis, Carmelina de Toledo Pizza, Luzia Stocco, Camilo Quartarollo, Jaime Leitão, Maria Helena Corazza, Miriam M. Botelho, Alexandre Bragion, Ana Lúcia Paterniani, Eunice Verdi, Ana Marly Jacobino, Daniel, o declamador, aos alunos – escritores embrionários e aos muitos mais que espero ( ainda) conhecer, deixo registrados meus parabéns, juntamente com um GRANDE ABRAÇO. O MEU MUITO OBRIGADA por fazer meus momentos mais alegres e prazerosos na companhia de todos vocês.

texto publicado na TRIBUNA PIRACICABANA de 06/08/2011