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quarta-feira, 25 de julho de 2018

UM ESCRITOR



25 de julho: Dia do Escritor
Olivaldo Júnior

Sim, um escritor.

Alguém que escreva sobre a vida,
alguém que fale sobre o amor.

Sim, um escritor.

Alguém que à máquina se sente
e, com ela, por ela, siga em frente.

Sim, um escritor.

Alguém que escave a própria vida,
alguém que esconda a própria dor.

Sim, um escritor.

Alguém que a lápis surpreenda
e, com ele, por ele, se arrependa
só daquilo que não disse,
não teve peito de dizer.

Sim, um escritor.

Alguém que não se anule,
que o mundo não macule,
alguém que mesmo a sós
só confabule.

Sim, um escritor.

Alguém que se frustre 
com o inesperado,
mas se torne o ilustre
deus des-avisado.

Sim, um escritor.

Alguém que, espelho toda a vida,
ao fim, se mostre, um escritor.


quarta-feira, 18 de julho de 2018

TRAGO O QUE ME BASTA


Raquel Delvaje

Não trago jóias: nem ouro, nem prata
Trago as brumas prateadas
Pelas noites enluaradas,
Trago o doiro das crinas
Dos cavalos das campinas.

Trago o dourado do sol
Irmanado com o vento,
Trago o prateado dos cabelos
Pincelados pelo tempo.

Não trago jóias: nem ouro, nem prata
Trago somente as pratas do orvalho
Das manhãs frias e sonolentas,
Trago somente o ouro do crepúsculo
que nas colinas se acalenta.

E meu coração satisfeito
Se abriga ávido em meu peito.
Todo o seu amor... é o que me basta
Não trago jóias: nem ouro, nem prata.

Três microcontos


O DISCO 
Olivaldo Júnior 

Maria era uma jovem senhora de cinquenta anos. Havia curtido sua juventude com tudo a que tinha direito: música, festa e muitos amigos. Saudade!... 
Desse tempo inesquecível, ficaram-lhe todos os discos de seu irmão, um mochileiro que não parava por mais de dois dias no mesmo lugar. Onde andará?... 
Um dia, bateu-lhe uma vontade de escutar o compacto com a canção Vapor Barato. Por ironia, entre inúmeros “bolachões”, foi o único que jamais encontrou. 


A ESTRADA 
Olivaldo Júnior 

João gostava mesmo era de estar na estrada. Homem de espírito livre, tinha cunhado suas asas à custa de muito trabalho e, hoje, aos sessenta anos, voava. 
O problema era a saudade que ia sentindo de tantas pessoas maravilhosas que conhecia pela estrada. Dizem que o mundo não tem fim. Pagaria para saber. 
Por vezes, pedia carona, dormia em albergues, comia o que dava, não o que queria. Quem sai na estrada é pra caminhar! Morreu esta noite. Voou para o céu. 

 O CÉU
Olivaldo Júnior

São Pedro tinha aberto a porta do céu, mas só o espírito de um cão sem dono que morrera atropelado entrou no Éden. É, o cão queria os ossos mais celestiais. 
O céu ficou aberto, e isso causou um frio danado na Terra. “Será que ninguém quer vir para cá?” - pensou São Pedro, com seus botões. Seria preciso fazer algo. 
Assim, pediu aos anjos que fizessem tabuletas, luminosos e um sem-número de cartazes indicando o caminho. Ninguém apareceu. Só mesmo o tal cachorro... 

terça-feira, 17 de julho de 2018

O Rio e Eu

(rio Piracicaba foto Ivana Negri)

Daniela Daragoni Alves

É agosto, fim de tarde
Pra esquecer as mágoas da vida
Pedalo até a Rua do Porto
Pra ver um rio que entende as minhas feridas.

E com ele desabafo
Posso ser quem sou
Caminho sobre as suas pedras
E vejo tudo o que ele já passou...

Momentos de glória e seca
Momentos de revolta, enchente e calmaria
Momentos bons e ruins
Como todos nós já passamos um dia.

Vejo a sua espera pela chuva
Por um momento melhor
Vejo o desespero das pessoas ao olhar pra ele nesse estado...
A tristeza...a dor...

Talvez por isso me identifique tanto com ele
Talvez por isso goste tanto daqui
Somos parecidos, eu e o rio
Na nossa capacidade de ressurgir...

Na nossa conversa silenciosa
Eu entendo muitas coisas difíceis de entender...difíceis de explicar...
E como o rio , percebo que há momentos em que não há nada a fazer
A não ser esperar...

Esperar pela chuva, por uma benção divina
Coisas que não podemos controlar
e como o rio eu espero e compreendo

que há situações que só Deus pode mudar...

segunda-feira, 9 de julho de 2018

Qual livro você está lendo?



Paulo Ricardo Sgarbiero

Título:  O Chapelão: histórias da vida de Baden-Powell
Autor:  Antonio Boulanger
Número de páginas:  367
Editora:  Letra Capital Editora
Resumo:  O General inglês Robert Stephendon Smith Baden-Powell galgou promoções no exército britânico por méritos, sendo o mais jovem a ter chegado a este posto, herói de guerra pela defesa de Mafeking criou o Escotismo. Baden-Powell, como é mais conhecido, teve vários apelidos e um deles foi “O Chapelão”, devido a chapéu de abas largas que usava para se proteger do sol, que foi incorporado ao uniforme escoteiro. Este livro as melhores história deste militar, que foi sagrado Barão pela Rainha da Inglaterra devido aos benefícios que o Escotismo traz para a educação das crianças e jovens.
Opinião sobre o livro:  Eu como Escotista, o adulto no Movimento Escoteiro, estou apreciando muito a leitura. São fatos muito interessantes sobre a vida de B-P, o fundador do movimento do qual faço parte há 35 anos. Fatos que ajudam a compreender muito da mística do Escotismo.
Alguém indicou, emprestou, deu de presente ou o livro foi comprado?  Conheci o autor em uma assembleia escoteira, onde a pessoa que nos apresentou falou do livro. Me interessei e comprei.
Se comprou, foi em livraria ou em sebo?  Comprei na Loja Escoteira, onde são vendidos material escrito sobre o escotismo, bem como uniformes e outros utensílios para usarmos em atividades escoteiras.

terça-feira, 3 de julho de 2018

EQUILÍBRIO



Plinio Montagner

Em suas palestras o historiador e filósofo Leandro Karnal costuma abordar as causas do sucesso.  Uma frase que repete: “Sorte é o nome que o vagabundo dá para justificar o esforço que ele não fez”.
Faz sentido. Quem trabalha tem mais “sorte” do que aquele que trabalha menos ou que não faz nada.
É fato que trabalhando quase tudo acontece, que da inércia nada resulta e que nada provém do nada, talvez, por exceção, o amor. A chuva não cai por acaso e a temperatura não sobe nem baixa sem um agente. Tudo provém de uma causa.
Trabalhar, apesar de gerar conforto, quando é demais, abala a harmonia da família, se menos, conquista-se menos, mas provê o lar de mais presença e afeição. Quem não faz nada perde tudo.
Quando não há limites estabelecidos, nem regras, nem líderes, nem exemplos, nem repressão, a anarquia se instala. O Universo também necessita de equilíbrio de forças para se sustentar. A Física o define o como um sistema em que forças se anulam.
 A sociedade humana é igual, o homem necessita de regras e limites para equilibrar necessidades e desejos, deveres e direitos.
Com certeza a felicidade perderia seu significado se não fosse equilibrada pela tristeza; a saúde, se não substituísse a dor, e a abastança sem a carência.
Quanto comer, beber, ceder, negar, trabalhar, amar, descansar, para tudo há uma medida que deve ser respeitada. O equilíbrio depende do princípio da reciprocidade. Tudo que é dado volta. É a lei do retorno.
O homem precisa saber as respostas adequadas ao universo ao redor e às necessidades de seu corpo.
Velocidade, lentidão, quantidade necessitam de limites. A razão só não explica equações que envolvem sentimentos. Enquanto a experiência aponta riscos, o coração manda tentar. Nesses momentos, ser crente, agnóstico ou ateu de nada adianta para desvendar o caráter de uma pessoa, mas suas atitudes sim.
Segue um fragmento de um texto enviado por um amigo:
 “Quando o assunto é equilíbrio o problema não é você ser evangélico, católico, judeu, PT, Bolsonaro, feminista, corintiano, palmeirense, coxinha, mortadela, hétero, homo, ignorante ou sábio. O problema é o fanatismo. Fanatismo emburrece. Fanatismo gera guerras”.
Não há nada contra o fanatismo quando os focos são bem e a paz, todavia parece existir mais fanatismo do mal do que do bem, que são a bondade, o amor ao próximo, a amizade, o trabalho, o estudo, a família, a probidade etc.
            O fanático do mal parece que não ouve argumentos contrários, ou não consegue, pela sua estupidez, permanece no obscurantismo da ignorância que estimula preconceitos e desamor, renunciando a verdades comprovadas por pessoas do bem e em todas as instâncias da Justiça.
Joelmir Beting, jornalista, escreveu há uma década: “Há partidos que começam com presos políticos e terminam com políticos presos”.


domingo, 1 de julho de 2018

MOLL FLANDRES



                 (Impressões sobre o livro)
Eloah Margoni

       Esse romance de Daniel Defoe, escrito no século XVII, foi-me recomendado por um amigo historiador quando queria eu saber algo sobre os trajes ingleses da época, para o livro Zion. Ter-me-ia sido bem útil pois a personagem principal, Moll, fala de rendas e de panos, de adornos; a certa altura da vida diz que gostaria de se casar com um “cavalheiro”, com alguém que não tivesse a marca do chapéu sobre a peruca. Isso mostra que homens ricos e nobres ou não usavam chapéus, ou esses objetos eram muito bem cuidados tais como as perucas, e não teriam marcas. Contudo só consegui o livro mais tarde, um exemplar de edição fina com bonita capa vermelha, pela bagatela de cinco reais.
        O livro é um prazer. Muito interessante a história dessa mulher que, nascida em berço pobre e praticamente órfã na infância, conseguiu por sorte ter uma educação esmerada tal como as moças elegantes da época. Estava, acima de tudo, decidida a não ser uma criada; queria autonomia e pode-se imaginar que as perspectivas das mulheres daquele século eram bem escassas. Para não se tornar uma simples serva, Moll fez de tudo, desde trabalhar duro ainda em criança até se casar quando possível e conveniente (casou-se cinco vezes, sendo uma delas com um irmão, conquanto não soubesse disso), e tornar-se uma ladra profissional, eventualmente prostituta quando as circunstâncias a obrigaram. Poderia ela ser vista como uma feminista do sec. XV e até tem traços disso. Contudo não gosto da personagem e mais adiante direi os motivos, embora não possa deixar de admirá-la.
       O autor, Defoe, dá tom de veracidade à história, como se o narrador divulgasse manuscrito da própria personagem, que lhe caíra em mãos. Mas sendo isso verdade ou não, conta ele algo que poderia ter acontecido em seu tempo e Moll seria talvez mistura de mulheres, ou uma das que conheceu ao longo da vida. Aliás, a personagem salienta que seu nome verdadeiro não é Moll Flandres, sendo esse um dos nomes que adotou entre vários e pelo qual se tornou conhecida.
        Fora ela uma moça muito bela, ingênua e pura em certa fase, alvo de assédios e de conquistadores. Numa das passagens da obra diz algo parecido com o que segue, embora de forma bem mais literária: que não é favorável nem útil a uma jovem ser precocemente elogiada por sua formosura, que a façam acreditar ser linda. Porque a moça, ao se convencer disso, passa a crer que será natural e inevitavelmente amada, que despertará amor nos homens e, assim, torna-se presa fácil de manipuladores, os quais somente a desejam, seduzindo-a com promessas falsas. Isso lhe aconteceu ainda bem jovem, quando se apaixona por um homem de posição social muito superior à sua o qual, embora lhe prometa casamento, jamais pretendeu unir-se a ela.
         Houve também períodos muito amenos e prosaicos na vida da personagem que, estando casada posteriormente, tornou-se a mais discreta e fiel das esposas, fazendo e criando filhos, administrando a própria casa. Porém, de modo geral, a expectativa de vida não era longa para os homens ou maridos... E nada disso, nenhum dos azares impediu que, quando necessitada e para sobreviver, se tornasse uma ladra refinada e fria, o que era ao mesmo tempo um risco enorme e uma arte necessária, uma vez que os ladrões eram presos na tenebrosa Newgate, ou deportados para os Estados Unidos em viagem atroz e, se reincidentes na Inglaterra, sumariamente enforcados.
          Mas por que não simpatizo com Moll, nem gosto da personagem, conquanto sua história seja fascinante? Por sua falta de sensibilidade. Não mostra nenhum amor por animais, por paisagens ou por plantas, nem fala disso. Não se interessa por artes, por filosofia ou pela beleza de algum modo. Livra-se de todos os vários filhos de forma conveniente, conquanto não cruel, e não dedica qualquer pensamento a eles ao longo dos anos. É verdade, porém, que a reprodução acabava sendo compulsória para mulher fértil com vida sexual ativa, mesmo a contragosto, pois nada sabiam sobre sua fisiologia reprodutiva; mas mesmo assim... Tampouco se interessa por questões sociais e não se comove com a exploração das pessoas nem com a crueldade da justiça daquele século. Moll era, enfim, uma rematada sobrevivente. Calculista e inteligente, embora não fosse pessoa má faz coisas também más, e tinha ousadias masculinas. Também não era desprovida dos laivos religiosos do momento, que muitas vezes se manifestavam em muitas lágrimas, súplicas e arrependimentos, especialmente quando temia acabar pendurada na forca. 
       Moll vive muito, até a idade avançada, o que já é um enorme feito no século XV. Pode-se nem gostar muito dela, mas impossível desgostar do livro, tão bem escrito que é; pura literatura. Também necessário reconhecer que a vida de Moll foi bem mais interessante, movimentada e repleta do que as vidas de grande parte das pessoas no mundo contemporâneo, até daquelas que possuem televisões, telefones celulares, banheiros com água encanada, mas assim mesmo vivem vidas banais, sem grande sentido e, do fundo da alma invejariam Moll Flandres se lhe conhecessem a impressionante história, as aventuras, seus desejos, amores e crimes.