Páginas

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

(foto de Wilmar Santin)
Amor de Estação
Leda Coletti

Nas caminhadas matinais, Rosana passa com frequência perto daquela escola. Lá está em lugar de destaque, o casal de namorados. Ficam próximos à calçada da rua movimentada, perto da mureta, junto ao gramado verde, onde estudantes fazem “rodinhas,” e pais aguardam a saída dos filhos.
Indiferentes ao bulício do local, trocam doces afagos. A moça se recosta no rapaz alto e esguio. Dá pra notar a felicidade estampada em seus semblantes. Rosana os conhece há bom tempo. Lembra-se dela ainda menina, irrequieta, com ares de moleca, mas já irradiando frescor e beleza. Ele menos expansivo, não se expunha em demasia. Agora, já quase adultos, não conseguem esconder a satisfação de ficarem juntos.
Mas para Rosana, “ilustre desconhecida” dos namorados e fã anônima, o namoro de ambos sofre altos e baixos. Frequentemente vê a moça com aparência triste, demonstrando ter chorado muito. Chegou a pensar que cogitam possível rompimento, e até tomou as dores da rapariga. Percebe que o rapaz em várias ocasiões é indiferente aos seus chamegos.
Felizmente nesta estação fria do ano, ela está feliz e reconfortada. Ele a agasalhou e a enfeitou como uma rainha. Escolheu a cor predileta da amada para fazer os arranjos, a qual por coincidência combina com os seus cachos de ouro; teceu ricas guirlandas douradas para cobrir sua luzidia cabeleira. Para o transeunte atento, não escapou a visão do delicado tapete verde-amarelo, que ele cuidadosamente estendeu nesse pedaço do jardim. Por todo esse aparato, Rosana até justifica sua ausência de carinhos em outras épocas. “Deve comungar a idéia do viver com intensidade o presente,” pensa enquanto caminha.
Já acabou o inverno. É hora do seu passeio diário. Ao passar à frente do local, observa-os. Ele, feio com os trajes em desalinho, ela, aparência abatida, sem a luminosidade do último encontro. Os estudantes e pessoas desocupadas, quase esbarram neles, ao se acomodarem no muro baixo que os separam; não dão sequer importância à sorte do casal.
Nesse momento ela se volta para o lado que o sol desponta, e exibe seu verde-esperança, deixando-se despentear pelo vento amigo. Ele, parado, sem quase se mover, parece esperar a chuva chegar para torná-lo forte, e apto para de novo florescer. Ambos, já meus amigos, a palmeira e o ipê, símbolos do eterno amor verde-amarelo, farão uma trégua nas manifestações amorosas, mas as retomarão nos próximos invernos, dando testemunho desse amor tão brasileiro!

Escritores Amigos - Richard Mathenhauer

Memórias de um menino
Richard Mathenhauer

Dirce Migliaccio morreu aos 75 anos no dia 22 de setembro. Início de Primavera, aqui no interior paulista, chuvoso, feio, frio, cinza demais. E esse tempo colaborou com minha volta ao passado, sem o pó mágico e as palavras mágicas do pirlimpimpim: vejo-me menino, sentado na poltrona de couro preto da sala menor da nossa casa, em frente à usina, numa tarde fria de um tempo já perdido.
Eu tinha medo da Cuca. O Saci só me punha um certo incômodo com sua risada, e era-me curioso que tivesse uma única perna (e muitas vezes brinquei pulando como ele). O medo da Cuca era estranho, porque, apesar de assustadora, a Cuca me causava um sentimento, talvez de pena. E entre medo e pena (não sei bem se seria pena...), Eu encolhia as pernas na poltrona e aguardava sempre o retorno de Cuca, na sua gruta, com seu caldeirão. Amava Dona Benta e tia Anastásia... não gostava que tomassem o gorro do Saci (apesar da sua risada...)... morria de vontade de comer o que Pedrinho e Narizinho comiam na mesa farta de sítio, e intrigava-me como Emília podia dormir numa caixa de costura... Mas de todos, o que mais me divertia, sem dúvidas, era Emília. Birrenta. A engenhosa e geniosa (e por vezes maldosa, como costumam ser maldosas certas crianças) boneca de pano!
Sem o pó do pirlimpimpim, volto a sentir o frio de algumas tardes, o cheiro típico da safra de cana-de-açúcar, ouço minha avó na cozinha, e no fundo de alguma parte em mim, a música de abertura que me deixava cheio de uma alegria inocente de quem aguarda algo. E Eu aguardava as aventuras, porque me via nelas, Eu era Pedrinho que podia conversar com o Visconde, com Rabicó, que podia brincar com Emília e Narizinho, que podia sentir os braços de tia Anastásia e ouvir as histórias de Dona Benta. Sem fechar os olhos, viajava nas tardes daquele tempo que hoje ressurge como uma ilha rica com a baixa das águas do mar!
“O Sítio do Pica-pau Amarelo” não é uma doce lembrança apenas minha. Milhares de homens e mulheres de hoje, crianças e adolescentes daqueles tempos em que Migliaccio era a boneca geniosa do Sítio de Dona Benta, lembram-se das aventuras da turma do Sítio. Quando Dirce interpretou Emília, a primeira na TV Globo, em 1977, Eu tinha quatro anos; minhas lembranças mais fiéis são, portanto, do início da década de 80 e das reprises. (E quando Dirce saiu do papel, estranhei muito que Emília “não era a mesma”).
Com a morte da atriz Dirce Migliaccio, parece que se perde um pouco do encanto, pensando hoje, como adulto. Vieram outras Emílias, mas nenhuma foi como a primeira - para mim. Não me lembro de Lucia Lambertini que interpretou a primeira Emília na TV (TV Tupi, entre 1952 e 1963), nunca vi um vídeo daquela época, se é que existe. Mas não tenho receios em pecar dizendo que Migliaccio foi a Emília perfeita, aquela que Monteiro Lobato concebeu, assim como não houve um Visconde de Sabugosa como André Valli.
Emília do Sítio do Pica-pau Amarelo goza da imortalidade que os personagens da literatura têm. Nas minhas memórias (mortais) de menino, Dirce não será Dirce, será sempre Emília. Aquela Emília. E Emília continuará com a mesma cara-feia de quando era contrariada, o mesmo jeito de pular e comemorar quando conseguia algo. Será a verdadeira engenhosa e geniosa boneca de pano de Monteiro Lobato.

Histórias Infantís

O cavalinho, a menina e o sonho ...
Ivana Maria França de Negri

A vida, para ele, era só girar, girar e girar...
Todos os dias, alegres crianças de bochechas rosadas, cabelos ao vento, escolhiam um cavalinho para cavalgar. Havia o malhado de olhos verdes, o ruivo de olhos cor de mel, o negro de olhos de fogo, e ele, que era todo branco e de olhos azuis.
Eram momentos sempre mágicos. A escolha, a escalada ao dorso, e o girar, girar e girar, até ficarem ambos, cavalo e cavaleiro, tontos e exaustos.
As crianças davam gritinhos de prazer, gargalhavam e se agarravam às crinas emaranhadas dos pequenos corcéis.
Com o passar dos anos, a brincadeira se tornou monótona. O cavalinho branco via ao longe os campos verdejantes a se perder de vista. E a pradaria se unia no horizonte a um céu muito azul, pontilhado de nuvens que pareciam flocos de algodão. Imaginava as montanhas, os vales, rios e mares que sua visão de cavalinho de madeira com olhos de vidro, não alcançava, enquanto girava sem sair do lugar.
Desejava ardentemente sair dali e correr o mundo, conhecer cidades e países diferentes. As crianças cresciam e não vinham mais. Outras mais novas apareciam e todas agiam da mesma forma. Às vezes reconhecia em algum adulto uma dessas crianças que o montaram em outros tempos. Ele os reconhecia pelo brilho no olhar que denotava a saudade da infância perdida.
No carrossel da vida, tudo girava incessantemente, e ele sempre ali, enraizado, fincado fortemente no chão, sem poder fugir, só girando, girando e girando.
Havia dias em que ficava mais angustiado e fazia muita força para se soltar, mas os parafusos e porcas que o prendiam eram muito resistentes.
Certa vez, uma linda menina, de olhos azuis como os seus, escolheu-o para voltear. Mas havia algo nela dizendo que naquele dia tudo seria diferente. Pressentiu isso assim que a garotinha delicadamente o montou e sussurrou ao seu ouvido:
-“Vamos voar, lindo cavalinho branco!”
O cavalinho pensou:
-“Finalmente chegou o momento de realizar meu sonho!”
Fechou os olhos, concentrou-se com todas as suas forças e iniciou o galope. Isso mesmo, não estava girando e sim galopando! Conseguira libertar-se da roda do eterno girar. As patas, antes fixas, moviam-se rapidamente. A menina não cabia em si de felicidade e ele parecia estar numa outra dimensão. Tudo o que pensava, a menininha adivinhava. E ele também conseguia ler os pensamentos dela. Era como se fossem um só naquela cavalgada. Em frêmitos, subia montanhas, descia pelos vales, atravessava rios e densas florestas. Sentia o calor do sol aquecendo seu lombo e até as refrescantes gotinhas de chuva que pingavam nele.
Num momento de maior arrebatamento, conseguiu sair do chão. E como se fosse o lendário Pegasus, levantou voo. Possuía asas invisíveis e voava bem alto com a amiguinha agarrada ao seu pescoço. Por breve momento, avistou lá embaixo o parque de diversões e os outros cavalinhos que continuavam presos, girando, girando e girando, sem sair do lugar.
Pensou consigo:
-“Será que essa menina é uma fada?” E ela, adivinhando-lhe o pensamento e sorrindo docemente respondeu:
-“Não, meu querido cavalinho branco, sou apenas uma menina que sonhou o mesmo sonho que você... E meu pai falou que quando dois sonham o mesmo sonho, ele se realiza!”

Escritores Amigos - Francisco de Assis Ferraz de Mello

(foto de Francisco de A. G. de Mello)
O túmulo de Nho Lica
Francisco de Assis Ferraz de Mello

Eu não conhecia o túmulo de Nho Lica. Vi-o, pela primeira vez, por ocasião da tomada das fotos aqui estampadas. É ao rés do chão, num espaço exíguo, cercado por outros maiores. Mas isso não lhe diminui a dignidade, exalta-a.
É simples, como foi Nho Lica, coberto por uma pedra de granito. Na cabeceira, perpendicularmente a esta, numa outra lê-se a inscrição:
Milionário de Ilusões,
Foi bom e amou sua terra.
Essa frase resume quem foi o grande capitão.
E assim o homem, que pela vida sonhou com brilhantes, após a morte repousa sob a maior de todas as suas pedras. E para sempre. E em paz.
Foi construído por uma ação entre amigos. O grande milionário não teria dinheiro para adquirir uma só das pedras.

Artigo publicado no jornal A TRIBUNA PIRACICABANA em abril de 2009 por ocasião da palestra do escritor Loyola em comemoração aos 20 anos do Golp

Vinte anos de muita prosa
Ivana Maria França de Negri

Quando esteve em Piracicaba, há 20 anos, coordenando um curso de literatura, o escritor Ignácio de Loyola Brandão não imaginava que seria o responsável pela formação de um grupo que se dedicaria à literatura por tanto tempo, ininterruptamente.
A sigla, num primeiro momento, pode assustar algumas pessoas, GOLP, mas depois de se inteirar das atividades dos participantes, passam a admirar um grupo que, mesmo sem ser registrado, sem uma diretoria, sem cobrar mensalidades ou seguir regimentos, funciona perfeitamente e é um dos mais atuantes na área da literatura em Piracicaba. Seus membros participam de comissões julgadoras de concursos, de exposições literárias e lançamento de livros. O grupo já teve três coletâneas editadas: “Mistérios do Engenho” em 1992, “Contos Guardados” em 1995 e “Noites de Prosa” em 2000.
A formação inicial teve nomes consagrados como Ludovico da Silva, a contadora de histórias Carmelina de Toledo Piza, Florípedes Maria D´Avilla de Moraes, Malu Bernoux, que atualmente reside na França, Paul Marques Ivan, Ilze Munia, Penélope Rodrigues Coelho entre outros.
Loyola que é escritor, autor teatral e jornalista, foi o vencedor do prêmio Jabuti de melhor livro de ficção em 2008, “O menino que vendia palavras”. Ele vem à Piracicaba no sábado, 4 de abril. Nas dependências do teatro do SESC, às 15h00, comandará um bate-papo que vai relembrar a sua contribuição para a formação do Golp e também vai autografar seu mais novo livro.
Pelo Golp, nestes vinte anos, já passaram dezenas de pessoas. Algumas mais perseverantes permaneceram por anos. Outras participaram apenas uma única vez das reuniões e outras, ainda, aparecem esporadicamente.
Muitos chegam ao grupo pensando em expor suas poesias para apreciação, mas logo são informados que o Golp é um grupo onde se escreve apenas textos em prosa - contos e crônicas.
Ludovico da Silva é o único membro do grupo inicial que permanece ativo desde sua formação. Há quase dez anos, portanto na metade de sua atuação, o jornal A TRIBUNA PIRACICABANA ofereceu uma página para que os textos produzidos nas reuniões fossem publicados, uma maneira de incentivar a produção literária e divulgar o trabalho do Golp. Como muitos dos frequentadores também escrevem poesia, uma parte da página é dedicada à poesia. E a PROSA E VERSO também divulga os eventos literários que fervilham na cidade.
Os textos dos participantes do Golp têm prioridade nas publicações, mas muita gente já teve a oportunidade e privilégio de ocupar esse espaço para divulgar seus escritos, tanto em prosa como em verso, mesmo não participando das ações do grupo.
Todos estão convidados para esse evento memorável e também para conhecer mais de perto o Golp e suas atividades e dar as boas vindas ao escritor Loyola, é claro.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Bate-papo com o Loyola - por Ivana Maria França de Negri

Ivana Maria e Loyola
2009


Era uma tarde de sábado bastante quente. Fui ao teatro do Sesc meio hesitante, sem grandes expectativas, assistir à palestra do escritor Ignácio de Loyola Brandão, pois como integrante do Golp (Grupo Oficina Literária de Piracicaba), entidade que ele ajudou a criar, tinha uma certa obrigação de comparecer. Por conhecê-lo apenas pelas imagens passadas através da mídia, tinha comigo que era um tanto petulante, arrogante até, do alto de sua fama. Mas quando tive acesso à sua pessoa mais de perto, essa imagem se dissipou imediatamente. Solícito ao posar para fotos e ouvir placidamente o estonteante falatório feminino, mostrou ter também um bom humor que eu pensava não encontrar nele, arrancando risos e lágrimas da platéia. Bastante informal, dando a entender que nada foi previamente preparado, a “conversa” fluía e pululava de um assunto para outro, conforme surgiam as situações. Ora o tilintar de um celular o fazia reportar-se a algum episódio. Ora alguém palpitando alguma coisa e ele já acrescentava uma situação semelhante vivida. As palavras iam brotando e a plateia devorando cada uma delas em silente cumplicidade. Em poucos minutos, contou-nos muito de sua vida, falou do seu primeiro amor – nada menos do que a doce Branca de Neve! Relembrou as primeiras professoras e os cavalinhos do carrossel que o avô carpinteiro construiu, mas os corcéis encantados foram destruídos num incêndio criminoso só restando os olhos, que eram de contas de vidro coloridas, as chamadas “bolinhas de gude”. Emocionou-se ao falar do sonho do avô que foi consumido pela voracidade das chamas. Falou de coisas simples, mas que prendem a atenção de todos: amor, família, filhos, sua imensa fé e os pequenos milagres. Para a ávida platéia, relatou momentos angustiantes, quando teve um aneurisma cerebral extirpado numa longa e delicada cirurgia de risco, que fez com que enxergasse, a partir de então, a vida com novo olhar. Todos saímos do encontro mais enriquecidos, não apenas no âmbito literário, mas bem mais ricos espiritualmente. Merci! Gracias! Thanks! Arigato!Obrigada!

Ivana Maria França de Negri

Troca de correspondência com o escritor Ignácio de Loyola Brandão


Caro Loyola

Espero que goste destas minhas impressões sobre o bate-papo literário no Sesc. O texto será publicado nos jornais de maior circulação aqui em Piracicaba, nas páginas semanais literárias sob minha responsabilidade. Se me passar um endereço, posso enviar os exemplares.
Espero que venha mais vezes a nossa Piracicaba!
Grande abraço e obrigada
Ivana Negri

Resposta do Loyola:
Ivana,

Como poderia não gostar do seu texto? Carinhoso, sincero, autêntico. Gostei muito da abertura, da sua não esperança, da crença em minha arrogância, de me imaginar alçado ao altar da glória, um altar que não existe. Minha cara (rosto) muitas vezes atrapalha, transmitindo essa sensação. Fazer o quê? É a minha cara, não tenho outra. O que procuro fazer, acima de tudo, é comunicar que escrever é prazer, que literatura é prazer. O que você poderia contar em seu espaço é que me emocionei muito ao ver que uma atividade modesta de 20 anos atrás pegou, frutificou, que as pessoas decidiram, se reuniram, continuaram, conversam, discutem, produzem. Criar é a única maneira de combater a rotina, a mediocridade do cotidiano. Fiquei triste pela ausência do Ludovico, uma das pessoas mais esforçadas e firmes que conheço. Foi um prazer tê-lo como aluno. Outra, a ausência da Floripes. Talvez estivesse viajando. Mas revi tantas caras amigas, conhecidas, risos de gente com quem eu encontrava, e que me devolveram o clima gostoso daqueles dias. Até hoje me lembro das viagens semanais de ônibus, da turma reunida, dos textos, as conversas, os encontros, o hotel no fim da noite, o silêncio da noite piracicabana cortado pela ruido das águas. Pena que o restaurante do Mirante se foi. Ali escrevi um conto, A Sexta Hora, dedicado a Joana Fomm, por quem fui apaixonado em 1966. Namoramos um tempo, até hoje temos uma terna amizade. O conto saiu primeiro na Claudia, depois no livro Cabeças de Segunda-feira.
Obrigado Ivana, pelo seu texto.
Se puder, coloque essas palavras minhas no jornal.
Beijos Loyola

Carmen Maria da Silva Fernandez Pilotto


Ouvindo e refletindo com Ignácio de Loyola Brandão
Carmen Maria da Silva Fernandez Pilotto

(abril/2009)


Brilhante a idéia do SESC de comemorar os vinte anos do Grupo Oficina Literária – GOLP trazendo o escritor que deu origem ao projeto com suas oficinas criativas. O SESC tem incentivado a ARTE em Piracicaba com programas de alta qualidade em todos os segmentos, o que só contribui com a população no desenvolvimento das potencialidades espirituais de cada um. Especificamente sobre o Loyola, que abordou o tema Memória, percebemos em suas reflexões como todo artista é parecido na alma. Pelas afirmações dele trazemos em nosso interior muito de nossos entes queridos e somos, em grande parte, reflexo da aldeia de onde viemos ou estamos. A maturidade do artista, que sempre viveu de literatura, confirma-se na constatação de que tem grande pretensão de escrever livros infantis para melhorar a qualidade intelectual das crianças brasileiras – sábia decisão. Particularmente, me senti especialmente comovida quando o escritor revelou uma lembrança de seu avô que havia esculpido um carrossel. Imediatamente me transportei para minha própria história, meu avô Paschoal, de apelido Nhô Ca que foi também um fabricante de alegria na cidade de Tietê. Homem criativo e de muitos talentos, não teve oportunidade nos estudos, entretanto, confeccionava em sua oficina toda espécie de artefatos para Parques de Diversão: gôndolas de roda-gigante, cavalinhos e carrinhos lindos para carrossel, cadeirinhas para o brinquedo chapéu mexicano e outros. Nós, os netos, adorávamos porque tínhamos entrada permanente nos parques. Além de confeccionar, se ocorria algum problema nas engenhocas, lá ia meu avô para sanar a questão. E não era só isso. Na casa dele, todos os utensílios eram de sua própria manufatura: a máquina de lavar-roupas, o ventilador, o liquidificador, o chuveiro e tudo mais. Como se não bastasse, confeccionou uma ferramenta especial usada para limpeza das ruas de pedras da cidade evitando que os senhores se curvassem constantemente. Até hoje, engenhos para mexer tachos de doce são utilizados nas docerias da cidade. Uma das peças mais raras de seus engenhos foi certamente um carro que ele construiu. O fato se tornou notícia que mereceu destaque na Folha de São Paulo, edição de 7 de abril de 1962: “Com as próprias mãos pedreiro construiu carro – Ser pedreiro não é obstáculo para quem deseja construir um automóvel... Basta firmeza de propósito, meia dúzia de ferramentas e o uso das próprias mãos.” O carro de Nhô Ca, motor Ford, chassis Lincoln e uma carroceria que projetara foi atração por muito tempo e até transportou pessoas famosas, como Adhemar de Barros quando esteve em Tietê. Assim, Loyola, concluo que todas as famílias e aldeias se parecem, trazemos muito do código genético de nossos ancestrais. Aqui, lá e acolá nossos corações são repletos de afetivas e saudosas memórias que precisam virar palavras escritas, como disse você na palestra, para registro apropriado de nosso tempo...

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Reunião do Grupo Oficina Literária na Casa do Médico em 2001

Oficina Literária

Oficina Literária do Golp para alunos da Escola Alfredo Cardoso - Ruth, Ivana, Leda e Ludovico

domingo, 27 de setembro de 2009

Livros publicados pelo Golp

Mistérios do Engenho publicado em 1991

Noites de Prosa publicado em 2000

Contos Guardados publicado em 1995

Histórias infantís


O arco-íris fujão
Ivana Maria França de Negri

Sempre que chovia, Mariana ficava na janela esperando a chuva passar. Sabia que logo, logo, o rosto gordo e amarelo do sol vinha espiar por entre as nuvens. E aí, apareceria o arco-íris. Sete cores em arcos atravessando o céu de ponta a ponta. Coisa mais linda de se ver!
Alguém contou a ela sobre uma lenda que dizia existir um pote de ouro, muito bem guardado por dois duendes, escondido lá onde acaba o arco-íris. Mariana ficava encantada com a idéia.
Naquele dia, depois da chuva, o sol espiou, espiou, e espiou de novo...Mas, cadê a belezura do arco-íris?
Mariana ficou triste porque o céu estava cinzento e feio, coberto por uma fumaça preta e melequenta.
-“Cadê o arco-íris?” ela perguntava para todo mundo e ninguém sabia responder. Até que seu avô, um homem muito sábio, disse que o arco-íris havia sumido por causa da tal da poluição.
-“Polu o que, vovô?” queria saber Mariana, já ficando preocupada com o sumiço do arco-íris.
-“Poluição, Mariana, a fumaça que as chaminés das fábricas cospem no ar, a que se solta dos escapamentos dos carros e também a fumaça preta e fedorenta que sobe das queimadas.
Mariana perguntou ao avô o que as crianças da cidade poderiam fazer para que o arco-íris fujão voltasse a aparecer no céu depois da chuva. E o avô falou que elas deveriam procurar o prefeito, lá na prefeitura.
E não é que o prefeito ouviu as crianças e imediatamente baixou um decreto proibindo as queimadas e criou uma lei para as indústrias? As fábricas só poderiam trabalhar a todo vapor se colocassem filtros em suas chaminés.
Determinou também que as pessoas só podiam sair de carro quando fosse extremamente necessário. Deveriam andar a pé, de bicicleta ou de ônibus.
De tanto andar a pé e de bicicleta, os moradores da cidade que andavam meio gordos, ficaram até mais magros e saudáveis. A poluição diminuiu e quase acabou.
E teve um dia que choveu bastante. Mariana, na janela, aguardava ansiosa pela visita do sol. E ele espiou uma vez, espiou outra, e mais outra... e de repente o arco-íris fujão apareceu no céu todo pomposo, explodindo de tanta cor!
Tinha vermelho-cor-de-fogo, laranja-cor-de-cenoura, amarelo-cor-do-sol, verde-cor-de-árvore-da-floresta, azul-cor-dos-olhos-da-Mariana, anil-cor-do-céu-quando-está-escurecendo e violeta-cor-de-suco-de-uva, uma enxurrada de cores M-A-R-A-V-I-L-H-O-S-A-S!
Um viva para as crianças, para o prefeito, e claro, para o vovô sabe-tudo!

Histórias infantís


O LIVRO MÁGICO
Maria Emília Leitão Medeiros Redi

Menino esperto esse Ivan! Tem uma energia incrível. Joga futebol. Nada como um peixe! Solta pipas com os amiguinhos. Anda de bicicleta. Enfim, inventa milhares de brincadeiras. A vida para ele é uma festa sem fim!
Mas, quando está com fome, ninguém o segura - tem um apetite de leão!
Aí , Ivan corre azucrinar a pobre da Amelinha (a incansável ajudante dos afazeres do lar):
- Ameliiinha! Ameliiinha! Estou com fome! Cadê minha comida?
Amelinha faz uns pratos deliciosos que são de dar água na boca!
- Hum! Hummmm... Que delícia!
Ivan adora brincar com os joguinhos de computador. Fica um tempão se distraindo com eles... Mas, quando é hora de estudar?! Ivan inventa mil e uma desculpas.
Se tem que ler um livro, o bicho pega! Ele enrola, enrola...Ivan não gosta nem um pouquinho de ler. Só quer saber mesmo é de brincar.
Dias destes, entrou correndo na biblioteca do avô atrás de uma bola fugitiva, quando...
CRASH!!! A bola ligeira e esperta ricocheteou, bateu na parede e veio com tudo sobre a estante de vidro...
Além dos cacos, diversos livros se espalharam pelo assoalho. Entre eles, havia um, de capa de couro marrom, “muiiito” especial - tinha o poder de transportar as pessoas que o abriam para um lugar qualquer dos quatro cantos do mundo. Era um Livro Mágico!
Quando caiu no chão, abriu-se bem ao meio. De dentro dele começou a jorrar uma luz intensa... que foi se concentrando numa força luminosa, girando... girando e feito um redemoinho enlouquecido envolveu Ivan sugando-o num – Vapt Vupt!
Ivan, muito assustado, sem ter tempo de reagir, fechou bem forte os olhos.
Quando os abriu, surpreendentemente, encontrou-se numa densa Floresta Tropical, em algum canto do mundo...
- Uau ! Que árvores gigantescas!
Em seus vãos caiam longos cipós, por onde uns macaquinhos atiravam-se de galho em galho, numa brincadeira contagiante.
Eram Macacos-Aranha! Moviam-se com grande rapidez por entre os ramos das árvores. Quando viram o Ivan sacudiram as pontas dos galhos, algumas vezes os quebrando e os atirando para baixo, dando uns gritos de satisfação que soavam como latidos. Tudo isto, só para chamarem a atenção do menino.
Ivan não acreditava nesta cena! Muito menos, quando surgiram uns indiozinhos arrastando pela mata uma grande Onça - Pintada, fortemente amarrada com cipós...
Ivan arregalou os olhos e beliscava-se sem parar.
- Será que estou sonhando?
Mais adiante, avistou um rio. Era tão grande que mais parecia um braço de mar!
Nunca tinha visto tantas águas assim... Ficou encantado com as enormes flores que deslizavam sobre elas:
- Ah! Vitórias-Régias? Que Maravilha!!!
Ao descer pela margem do rio, notou que as águas se avolumavam formando várias cascatas. E, nas espumas branquinhas, os raios do sol refletiam um maravilhoso e colorido Arco- Íris! Ivan ficou extasiado!
Mas, bem ali, na margem do grande rio, surgiu um jacaré enorme e faminto que vinha lentamente na sua direção.
- Uai !!! Como vou sair desta?
Ivan sentiu um calafrio na boca do estômago.
Neste instante, uma linda indiazinha, segurando-se num cipó muito longo, voou rente ao Ivan e segurou-o forte! E os dois foram parar na outra margem do rio.
Ivan ficou aliviado e muito feliz com a nova amizade.
Mas, para sua surpresa, reparou que não havia uma árvore sequer deste lado do rio.
– Onde estão todas as árvores? Perguntou, angustiado, para sua mais nova amiga.
– Chegaram uns homens maus e, com as motosserras, cortaram milhares e milhares de árvores, respondeu a menina com os olhos cheios de lágrimas.
– Aqui está parecendo um deserto. Que coisa mais triste! É de cortar o coração.
Ivan começou a chorar de tristeza - pelas árvores cortadas, pelos animais desabrigados, pela natureza destruída...
De repente, ouviu uma voz conhecida a chamá-lo:- Ivan, Ivan!
Como num passe de mágica, viu-se de novo na biblioteca do avô - era ele que o estava procurando.
Ivan deu um abraço forte no avô. E, já com saudades das aventuras que acabara de viver, pediu, quase suplicante:
- Vovô, me empresta um livro sobre a Floresta Amazônica?
Deste dia em diante, Ivan tomou gosto pela leitura, encontrando em cada livro – um novo mundo de encantamento!
Além do mais, tornou-se amigo e grande defensor da Natureza!

Histórias infantís


O PASSEIO DE JOÃOZINHO
Leda Coletti


Joãozinho era aluno de uma das escolas de Ipeúna. Naquele ano escolar fez bastante progresso, passando para o ano seguinte sem recuperação. Por essa razão, seus pais aceitaram o convite dos tios, para que fosse passar alguns dias das férias escolares, no sítio de sua propriedade, que ficava apenas a 3 quilômetros da cidade.
Joãozinho gostava muito dos tios Jorge e Ana, além dos primos Bruno e Amanda. Ir ao sitio Paraíso foi seu melhor presente de final de ano.
Logo no dia seguinte, o tio o levou para ver três nascentes, no capão de mato existente em suas terras. Joãozinho ficou surpreso ao saber que daqueles pequenos pontos, onde nascia uma corrente d’água, surgira aquela linda represa do sítio e mais adiante a cascata, que jogava suas águas no rio Passa-Cinco. Ficaram de ir tomar banho naquelas águas no dia seguinte. Que gostosura brincar com os primos em suas águas límpidas!
Após o passeio, com muita sede, foi ao filtro d’água. Não deixou de comentar:
- Que delícia de água! Ela vem do rio Passa-Cinco, tia?
-Não meu querido. Você não foi passear com seu tio na trilha das nascentes? Pois bem, essa propriedade é um cantinho abençoado por Deus. Ele nos deu muitas nascentes e essa água que você está bebendo vem de uma delas, localizada num vale a uns dois quilômetros daqui. Nós a filtramos para garantir a sua qualidade, sem risco algum para a saúde.
Seu primo Bruno completou:
-Você viu o quanto são cristalinas as águas das nascentes e também do rio Passa-Cinco? Sem aguardar resposta foi logo explicando:
- Isso acontece porque pela preservação dos bosques e reservas florestais elas conservam o frescor e não secam. Na trilha que beira o rio, nós caminhamos dentro da mata ciliar, ou seja, na vegetação natural. Não sei se você notou, mas nosso pai plantou centenas de árvores nativas nos terrenos próximos para garantir a umidade do solo.
- É verdade que o Rio Passa-Cinco vai engrossar as águas de outro rio, de nome Cabeça, que por sua vez desemboca no rio Corumbataí, que joga suas águas no Rio Piracicaba?
- Sim Joãozinho, respondeu a tia. Mas antes quero lhe fazer algumas observações. O rio Passa-Cinco é um dos poucos que tem as águas menos poluídas. Dias atrás fui a Piracicaba, e passando pela ponte mais antiga e depois pela pênsil, fiquei muito triste ao ver tanta espuma e até peixe morto. Está tão diferente do tempo em que meus avós moravam lá. Suas águas eram limpas e havia muito peixe. O salto era um verdadeiro cartão postal. Nós éramos crianças e nos encantávamos com os peixes que tentavam subir na cachoeira e não conseguiam. Era o tempo conhecido como época da piracema.
- Eu fiquei sabendo disso. Nossa professora contou que ele e outros rios brasileiros estão feios e doentes por causa dos esgotos e lixos que recebem, tanto das indústrias, como das próprias residências.
- E pensar que nós homens somos os maiores responsáveis por esse estado tão lamentável! diz a prima Amanda.
Chegou a vez do tio Jorge entrar na conversa:
- Vocês já ouviram alguém dizer: “uma andorinha sozinha não faz verão”? Isso significa que se cada um de nós fizer a sua parte com exemplos e palavras, estaremos valorizando a natureza. E ela agradecida, nos dará o que sempre teve e tem prazer em nos oferecer: flores, frutos e sombra amiga.
- Sabe tio, vou procurar defender a vida dos nossos rios, pois sem água não podemos viver.
Joãozinho voltou para sua casa e em cada atitude diária no lar, na escola, nos lugares que freqüenta, demonstra o seu modo inteligente de tratar o meio-ambiente. Procura deixá-lo em condições ideais para todos viverem com saúde e bem-estar.
Ele está fazendo a sua parte. Vamos fazer a nossa também!

Histórias infantís


Dragões & Cia
Carmen Maria S. Fernandez Pilotto

Dragomar era um dragãozinho muito travesso. Estava sempre conectado com todos seus coleguinhas ao redor do mundo. Adorava informatiquês. Suas escaminhas chegavam a ficar embaçadas por tantas horas que passava no computador. As asas, sempre recolhidas, já estavam se esquecendo de como era voar.
Tinha criado um blog legal. Conversava pelo orkut com seus amiguinhos draconianos de toda parte. Toda noite se plugava animado:
- Oi, galera ! Digam o que acham do assunto, e blá,blá,blá passava horas conversando com dragos de todas as partes do planeta. Papo ia, papo vinha, dragos novos nas rodadas, e seguiam sempre contatos super-legais.
Na China, seu amiguinho Drag Yan Lung estava muito ocupado com os preparativos das próximas Olimpíadas. No Egito, Drag Ramsés cuidava das pirâmides que estavam se estragando por causa do efeito estufa. Nos Estados Unidos, John Green Drag distribuía na Disney folhetos para convencer as crianças do cuidado com o uso da água.
Com a esperteza de Dragomar, notou que o mundo andava de pernas pro ar, todos queriam preservar seus reinos encantados.
Já imaginaram... O ecossistema global ameaçado: a terra, a água o ar e a floresta correndo um grande perigo?
Como era super-ligado, começou a ficar preocupado e a perceber que a Terra só tinha línguas diferentes, mas que os sentimentos eram os mesmos em todos os cantos. E que nosso planetinha estava uma meleca.
Era realmente um grande problema...
Tomou uma decisão:
- Já sei! Vamos fazer uma conferência dos dragões para salvar o Planeta... Resolvido.
Passou uma mensagem em inglês para todos os coleguinhas e marcaram a reunião urgente na face oculta da lua, quando a lua nova chegasse.
Começou a receber e-mails de todos os cantos; até o Dragão de São Jorge ofereceu seu castelo para receber os amigos. Na Alemanha, Siegfried Drag fazia questão de organizar a noite de abertura do encontro com uma dancinha animada. Enfeitaram com estrelas multicores todo o castelo.
No dia combinado estavam lá. Cada um soltava uma chaminha da hora. De asinhas esvoaçantes e escaminhas lustrosas todos tinham gravatinhas ou lacinhos com as cores de suas pátrias.
Dragomar, Dragoaldo, Dragiselda e Draliana organizavam tudo, recebiam os visitantes com palavrinhas agradáveis, caprichavam no inglês:
- Hello (Olá).
- Hi (Oi).
- Good morning. (Bom dia)
- Welcome (sejam bem-vindos)
Um outro grupo da Colômbia, fazia, no capricho, uns sanduichinhos naturais que estavam uma delícia. Hum! que pimentinha naturalmente gostosa...
O grupo japonês entregava sacolinhas de pano que poderiam ser usadas para compras, explicando que o plástico polui o planeta. Já imaginaram... Que exemplo de atitude!
As palestras foram lindas... Todos estavam antenadíssimos com as mensagens. Mostraram os rios de suas cidades e como é necessário cuidar deles.
Outra reunião ensinou a separar o lixo de todo o dia. Oficina de papel reciclado criando lindas dobraduras que formavam animaizinhos divertidos. Como fazia diferença realmente!
Sabem que percebi, que todos juntos poderíamos salvar o Planeta.
Dragomar estava radiante.
- Vamos lá galera. Todos se sentaram em volta da grande cratera do lado oculto. Straussdrago, que viera da Áustria, começou a tocar uma alegre cantiga para agitar o pessoal.
- Vejam amigos, acho que será legal construir o varal do meio-ambiente e colocar todas as fotos dos lugares de onde viemos e que teremos de cuidar.
- Coleguinhas, chamou a bela Draliana, peguem papel e lápis. Vamos participar da gincana do lixo. Cada equipe montou um enorme quebra-cabeça com desenhos de um mundo com menos lixo, uma belezura de futuro. Nada de espuma, isopor, sacolinhas plásticas, pilhas e outros.
Tudo terminou com a Feira da Sucata e da Barganha, quando todos puderam trocar lembranças de suas terras natais.
Após tanta conversa, resolveram, que pelo bem do planeta, ficariam morando no castelo de São Jorge definitivamente, em constante atividade de magia. Como senhores dos ventos e das tempestades, alertariam sempre o bicho homem que o planeta está precisando de cuidados.
Quando o vento quente é mais suave, parece que ouvimos uma musiquinha misteriosa que traz o som daquela turminha:
A lua cheia, com as bochechas redondas, falou:
Êpa !
Opa !
Coloquem os parafusos nos lugares...
Reduzir
Reciclar
Reutilizar
Reinventar
Temos que aprender a mudar.
Para nascer um novo tempo
E tenho dito...

Histórias infantis


Joselito, o gatinho que queria voar...
Ivana Maria França de Negri

Ele não era um gatinho comum, desses que afiam as unhas nas poltronas e que ficam dormindo por horas seguidas em fofas almofadas ou nas camas macias dos seus donos. Joselito gostava mesmo era de subir no parapeito das janelas e ficar olhando o céu azul, os pássaros, e a dança das borboletas. Sua dona dizia: “Saia já daí gatinho desobediente, quer se esborrachar lá embaixo? Você não é pássaro, nem borboleta, e muito menos um super-homem – quer dizer, super-gato”. Ele descia, mas logo voltava e subia naquele lugar perigoso - para quem não tem asas.
E lá vinha sua dona ralhar com ele de novo: “- Gato não voa, sabia? Gato não é pássaro, nem inseto e nem avião. Desce já!”.
Só que havia uma coisa que ela não sabia. Ele tinha asas, sim! Só que eram invisíveis, uma espécie de asas pra dentro, que não dava para ver. Só pessoas muito especiais, as que possuíam olhos-de-ver-dentro sabiam que ele tinha asas.
Joselito era todo amarelinho, com enormes olhos verdes que pareciam duas esmeraldas. Nascera perto do mar, mas não gostava de água, essa era a verdade. Viera morar no interior, e desde então, tornou-se gato de apartamento. Não é que não gostasse dessa vida, pois tinha cama quentinha, comida boa e muito carinho, mas era uma vida monótona, não podia correr pelos campos ou subir em árvores. E o seu sonho secreto era mesmo voar.
Naquela cinzenta manhã de chuva, como sempre, foi espiar na janela. O peitoril estava molhado e escorregadiço. Não sabia porque, mas acordara muito ansioso naquele dia. Seu pêlo lustroso dançava ao vento e os olhos verdes refletiam o brilho de um sol ausente. Sentiu-se poderoso, forte, e com muita coragem, saltou no espaço em direção ao infinito...
Planou por alguns instantes e logo se viu num lugar maravilhoso e soube de imediato que era o céu dos animais. Lá podia voar à vontade, como as aves no céu, como as borboletas. Tinha asas sim! Podia voar! Queria mostrar à sua dona, que o amava tanto, como estava feliz. Mas não conseguia entender o desespero dela olhando pela janela vazia, e o motivo de suas lágrimas despencando como gotas de chuva lá embaixo.

* Esta é uma história verdadeira, escrita em homenagem ao Lito, um gatinho amarelo e travesso, que um dia pensou ter asas como as borboletas. Mas eu tenho certeza de que agora, ele pode voar, além da ponte do arco-íris, lá longe, muito longe, noutra dimensão, onde fica o céu dos animais.
Mas ele não foi sozinho, levou um pedaço do meu coração...
Ivana e Ludovico jurados do Prêmio Escriba de Contos em 2001 ao lado da pilha de textos




Vida Colorida
Elda Nympha Cobra Silveira

Após uma tormenta Deus manda uma mensagem através de um arco-íris. Ela nos chega de passagem, tão sutilmente, que não conseguimos, de pronto, entendê-la. As nuances multicoloridas derivam, uma a uma, em seqüência, mostrando as opções, ou algum marco que indica para onde devemos ir. Por exemplo, o vermelho pode representar a agressividade, os problemas, que devemos a todo custo evitar, para que não contaminem a nossa personalidade, e os perigos que devemos saber como contornar. Mas existem outras cores que representam saudade, amor, respeito, e tantos outros sentimentos, alguns que nos servem de exemplo, outros que nos inspiram. Ao fazer das cores exemplos para as nossas vidas, qual será o recado que Deus nos manda? Talvez ele queira que no cotidiano de nossas vidas, usemos as cores, conforme elas se apresentam, para que assim nos adaptando a elas, saibamos nos expressar e também contornar certos momentos no decorrer da nossa existência.
Mas não importa, o arco-íris mostra-nos que temos uma gama de cores para atravessar essas fases e vencer esses degraus enriquecedores, e que poderemos evoluir ou amadurecer, para aproveitar melhor certas situações representadas pelo amarelo, rosa, pelo azul, verde ou magenta, e assim por diante, até que finalmente ficamos em paz, quando nos deparamos com o branco, que nada mais é que o resultado da mistura de todas as cores.
Clemência
Ruth Carvalho Lima de Assunção

Como de costume, bem na hora do café da manhã, leio o jornal e para minha surpresa encontro a nota de falecimento de Clemência. Pensamentos voaram para bem longe e fui recordando sua imagem e suas palavras de sabedoria que os anos e experiências lhe trouxeram.
Nossos mundos foram diferentes, quando crianças e quando jovens; vim a conhecer Clemência quando já, as duas formadas, e ela uma artista plástica em destaque, aqui em Piracicaba.
Mas agora, premida pelas circunstâncias desta perda inesperada, pelas imagens e figuras verbais associadas à artista, não me curvo à solicitação do silêncio, e deixo-me levar pelo sentimento de tristeza que se abateu em todos nós, seus amigos e admiradores.
Da velha Europa conturbada, em crise, partiram as negociações para contornar e solucionar os problemas que se arrastavam em penúrias e desgastes. E foi aí que encontraram o caminho – Brasil, um país novo, com imenso território à disposição, uma natureza exuberante e muita água correndo em mananciais, numa terra fértil e generosa.
E como fica a artista Clemência nesse embate? Nada a ver, tudo a ver?
E aqui entram os italianos que deixaram suas terras em busca de outros horizontes, com mais possibilidades de um crescimento social e financeiro. Estavam dispostos a lutar, a lutar e vencer.
E mais uma vitória se agrega - a menina Clemência, a virtuose, que Piracicaba ganhou de presente, a semente vinda da Itália, de além-mar, do fruto que virou estrela, que brilhará para sempre.
Perdemos a figura insubstituível de um expoente que no mundo das artes mostrou seu talento e habilidades inatas pelo belo, pelas formas e pelas cores. Seus trabalhos expostos no Mirante, no muro da “Saudade”, como também outros, aqui e lá fora falam por si da grande veiculadora das artes plásticas e de sua maestria com os pincéis.
No rememorar a professora da História das Artes, seu vasto conhecimento no âmbito da arquitetura artística, o olhar consciente da beleza e da poesia que existe em todas as coisas percebemos a lacuna que sua ausência nos deixou.
Amou a sua terra e externou sua admiração ao retratar o caminhar do rio, do nosso rio, que encanta e canta em nossos corações.
Pelo seu caminho soube conquistar o respeito e admiração pelo seu senso artístico e humano. Amigos fez às centenas, devido à sua ternura, sinceridade e carisma.
Adeus. Você é e continua a habitar entre nós, junto à sua arte.
Ocupe amiga o seu lugar reservado aos eleitos, aos que passam e deixam um rastro de luz brilhando para a eternidade.

ESPELHO

Ludovico da Silva

O Espelho serve como referência na exaltação de modelos ou exemplos.
Quando se quer enaltecer alguém, por um ato praticado, diz-se que é o Espelho de uma pessoa famosa, de um ídolo e, por isso mesmo, é reconhecido e admirado por amigos e por todos que privam de sua amizade.
É uma homenagem que se presta a um cidadão, pelos seus feitos ou conduta.
Será que o Espelho reflete a imagem de pessoas que só praticam coisas boas, favoráveis, que merecem comparações com modelos que são exemplos a ser imitado? Parece que dá para pensar, não é mesmo?
É que o Espelho reflete qualquer plástica. A bonita e a feia. A boa e a má. A alegre e a sisuda. A simpática e a antipática.
Bem a propósito, você já se olhou no Espelho, de manhã, com o rosto ensaboado? Se ainda não fez, faça-o, para ver com cara de quê você fica.
Tem o indivíduo que é pra lá de chato, inoportuno, que incomoda todo mundo, principalmente aquele que fica na frente dos outros, querendo aparecer ou que quer sempre tomar conta da conversa, pouco se preocupando se está importunando.
Bem, esse é o verdadeiro Espelho sem aço.
Táticas de seduçãoMaria Cecilia Graner Fessel

Vem à minha procura com um andar coleante, silencioso, decidido. Aproxima seu rosto do meu, até penetrar dentro de mim com seus hipnotizantes olhos verdes. Tento escapar, ignoro sua presença, mas mesmo assim permanece ali do meu lado, a me encarar, suplicante. Se não lhe dou atenção, começa a mexer em minhas coisas desafiadoramente, joga canetas e papéis no chão, pressiona aleatoriamente as teclas do computador, então acaba aceitando a espera e senta-se ao meu lado .
Como preciso terminar o texto que comecei, confio em sua imobilidade e continuo meu trabalho, por mais algum tempo. Aí , chegando ao limite de sua paciência, aproxima-se de meu rosto e começa a me afagar. São delicados e suaves seus primeiros toques, depois vão se tornando mais insistentes, mais rudes, até que não posso mais ignorar sua ansiedade, revelada no arranhar de pontudas unhas.
Para poder ter sossego, enfim me levanto e falo: “Venha, Mila,
vou te dar sua ração de carne!” Aí minha gatinha empina o rabo e me mostra lepidamente o caminho da geladeira...
Coisas de criança
Maria de Lourdes Piedade Sodero Martins

Encontro-me no Rio do Sul, Santa Catarina. Não tenho lido muito durante este período como gostaria. No entanto, tenho contado e ouvido as mais variadas histórias, todas estimulantes.
Ao lado dos meus netos não sinto o tempo passar. São horas e horas de comprometimento e muita energia. Novidades não faltam. Saímos a passear quase todas as manhãs, exceto nos dias de muito frio. A cidade é tranqüila e hospitaleira, o povo educado e atencioso. Durante as andanças vamos “pesquisando” e descobrindo coisas interessantes.
Gabriel, com cinco anos, é um garoto alegre e curioso. Pergunta sobre tudo e espera por boas e verdadeiras respostas. Temperamos as atividades sérias com brincadeiras do “faz de conta”. Às vezes ele inventa que é turista e se põe a falar em “outro idioma” Faz-me bem presenciar sua participação espontânea, é bonito ouvi-lo falar “cantado” com o sotaque e a forma de linguagem da região sul. Geralmente, ele vai pilotando sua motoca, com diz, e eu vou empurrando o carrinho de bebê com uma linda princesa a bordo. Isadora é seu nome e nos seus cinco meses já ri à solta, principalmente quando Gabriel graceja ou lhe faz micagens. Se alguém se aproxima e nos sorri gentilmente, ele se apresenta e diz:_ “Esta é minha mana Isadora , eu protejo ela. Tu não sabes?”
Tendo acompanhado a gestação de sua mãe, acabou assimilando que em toda grande barriga existe um nenê. Outro dia, no elevador, olhou surpreso para um senhor muito barrigudo. Perguntou-lhe de supetão: “-Tu estás esperando bebê?” O “grávido” não teve reação... Gabriel, por sua vez, completou: -“O da minha mãe já nasceu!”
Numa manhã morna, convidativa, e céu bem azul, saímos a caminhar com o propósito de examinar os jardins da redondeza. Mostrei-lhe uma bromélia florida e disse a ele que seu avô gostava muito daquela planta/flor... Argumentou prontamente: -Eu também, vovó. Adoro suco de bromélia! Admirada, percebendo algum “mal entendido” disse-lhe que nunca provara tal suco e gostaria de experimentá-lo. Com o semblante iluminado respondeu-me: -“ Vou pedir à mamãe para preparar um suco para ti.”
Voltamos para casa, como eu havia desconfiado, tratava-se do suco de graviola. Gabriel, sem qualquer constrangimento encerrou o episódio:
“Mas, são nomes parecidos , tu não achas, vovó?”
Um dia desses, ao atravessarmos uma pracinha demos de frente com uma senhora muito loira, toda vestida de preto, inclusive o gorro e as luvas e óculos escuros. Aguçado pela curiosidade, Biel, como às vezes o chamamos, dirigiu-lhe a palavra: -“Tu és espiã?” Rimos as duas, tomadas de espanto. A “espiã”, com certeza uma criatura sensível e segura atuou de forma simpática e convincente. Dirigiu-se a ele com semblante misterioso e perguntou: -“ Como tu sabes? Como adivinhaste que sou espiã?”
Perplexo, num misto de temor e felicidade pela sua “tremenda” descoberta, respondeu rapidamente: -“Ah! Pelo seu jeito, sua roupa, está na cara!”
Pois saibas, guri, eu estava te espionando e descobri que és um menino inteligente e espirituoso. Gostei muito de ti, muito prazer!
- Obrigado, “Espiã”! Mas, o que é espirituoso?

As três batatas



Cassio Camilo Almeida de Negri

A cidade era quase deserta, em meio à ocupação alemã, durante a segunda guerra mundial.
Vez ou outra passavam velozes caminhões Mercedes, carregados de soldados e tanques do Führer.
O silêncio da morte era entrecortado pelo ecoar das botas, cujas solas estatelando juntas durante a marcha, causavam um frio na espinha da família judia de três pessoas, escondidas atrás da parede falsa daquela casa .
De vez em quando, na escuridão da noite, rajadas de metralhadoras faziam parar sorrateiros passos noturnos daqueles que se atreviam a sair de casa em busca de alimento no gueto de Varsóvia.
Muitas vezes, botas pretas que abrigavam pés e pernas em pata de ganso, batiam duras nos degraus de madeira da escada,encostada na parede falsa.
Então, a respiração dos ocupantes do esconderijo ficava suspensa e o tempo parava.
-Seria hoje...? Pensavam os três.
Um suspiro de alivio, os pulmões voltavam a se encher, o coração disparava, quando, pelo buraco de rato,j unto a escada, lá estavam, mais uma vez, as três batatas.
Assim se passaram meses, naquela cidade semi fantasma.
Todos os dias,três batatas grandes, apareciam no buraco do rato.
Um dia, no entanto, após violento bombardeio, ouviu-se uma grande fuzilaria na escada.Algumas balas quebraram as paredes do esconderijo.
Após silêncio tumular,vozes num linguajar diferente do costumeiro.
A falsa parede é aberta e vários soldados americanos saúdam a família de judeus.
No pé da escada no entanto, um soldado morto, com a suástica nazista no braço, tinha em suas mãos semi abertas, três batatas grandes.
A Metamorfose
Maria Emília L. M. Redi

Sevilha, primavera de 2000... Percorrendo a Praça de Espanha, absorvida por suas belezas, Ella entregou-se às lembranças de uma vida.Voltou o pensamento àquela Igrejinha na Colina, acolhedora e toda enfeitada de flores, onde ao som da Ave Maria de Gounod, adentrou vestida de noiva. No altar o príncipe encantado a esperava... Parecia um conto de fadas ! Naquela Praça, onde a magia era sentida em cada respirar, deu-se conta de que o tempo havia passado. Ah... o tempo, este amigo-inimigo implacável, havia deixado suas marcas ... Já não era mais a moça sonhadora, mas a madura senhora quase prestes a desequilibrar-se do galho da vida.Sentia-se incomodada por uma sensação estranha de ter-se conduzido pela vida ao sabor das certezas e opiniões que a afastaram de seus sonhos , transformando-a em marionete por toda uma vida...As pessoas amarram-se naquilo que se esperam delas e tudo se transforma em obrigação. Bem pregou Sartre – “ O inferno é o outro ”!Ella, que viveu de doar-se, sentia-se albergada no gueto da solidão de si mesma. Deixou ,suspensa no tempo, sua inalienável vontade - a Liberdade de Ser...Na esplendorosa tarde de Sevilha, o sol se deitava...Ella tomou um prazeroso banho de espuma, como se fosse a grande atriz que era... Vestiu um roupão macio que, deliciosamente, deslizava por seu corpo nu.Um suave perfume de lavanda invadiu o pequeno quarto.Afastou as cortinas, abriu a janela, e, através das grades, lançou um olhar perdido no infinito ... Voou em pensamento!Viu-se vagando pelos labirintos das ruas estreitas do Bairro de Santa Cruz.Uma guitarra chorava a melodia de sua saudade!De um beco escuro surgiu um vulto, envolvido por uma capa negra, e ofereceu-lhe um regalo – um ramo de “ hermosas “ flores!!Por trás da capa , uma surpresa - seu Príncipe Encantado... O homem de sua ilusão! Olhares fixos e cruzados... mergulharam no âmago um do outro e fundiram-se num só corpo, numa só alma ... Na ânsia louca do amor incontido, bocas se colaram em “ ardientes besos ”...As carícias tomaram forma no incontrolável desejo de se amarem ali mesmo, naquele beco escuro do bairro dos amantes. Envolveram-se loucamente num amor que transcendia qualquer entendimento.O sol amanheceu o dia !As flores daquela manhã exalavam um perfume especial.Ella, inebriada, deu um profundo suspiro que transpassava a alma, como sempre, fechou a janela, e deitou-se , na cama macia, ao lado do príncipe que havia se transformado em sapo ...

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

MEMBROS DO GOLP


Reunião dos Membros do GOLP

FOTOS

Confraternização dos Membros do GOLP