Elda Nympha Cobra Silveira
O Carnaval brasileiro é muito
diferente daqueles que existem em outros países, talvez porque o nosso tem nas
suas origens, a influência da cultura dos escravos africanos, que nos legou
ainda, costumes sociais, gastronômicos, artísticos e religiosos. Nos carnavais
estrangeiros, se bem que, atualmente, tenham inserido nestas festas muito da
cultura brasileira, a música é morna, o ritmo é um hiato entre o minueto e o
rock, ou entre o reagge e o soul music. Nada que tenha sequer longínqua
semelhança com os instrumentos usados nas nossas escolas de samba, como o
surdo, a cuíca, pandeiro, ganzá, reco-reco, tamborim, e muitos outros.
Não tenho nada contra uma festa
de Momo sem samba, sem batucada e sem mulatas, ingredientes imprescindíveis,
desde os primórdios do Carnaval brasileiro, definido, desde os tempos coloniais
como um rito de passagem, uma grande brincadeira, que se iniciou, longinquamente,
com os afoxés, de fundo religioso, e por isso mesmo, proibidos e combatidos
severamente, e mais modernamente, os entrudos, que eram uma festa de rua, da
qual participavam ricos e pobres, brancos e negros.
A partir da década de 20, as
guerras de limão-de-cheiro, de farinha de trigo e de água perfumada, que tinham
tornado o nosso tríduo momesco inconfundível, ganha os salões dos ricos
senhores de engenho e das famílias abastadas para tornar lendários o baile
carnavalesco e as marchinhas, músicas alegres, despretensiosas, que satirizavam
a vida e a política de forma ácida e mordaz. Chiquinha Gonzaga foi a precursora
das marchinhas, que hoje puxam o cordão infinito de milhares de composições e
centenas de autores, como Ary Barroso, Zé Ketty, Braguinha, Colombina e muitos
outros.
Nos carnavais aqui de Piracicaba
dos anos 40 e 50, o ponto alto era o corso, uma espécie de desfile de carros de
passeio pelas ruas da cidade. Certa vez, no Bairro Alto foi construído um leão
enorme para ornamentar o caminhão da “Turma do Leão”, que participava
anualmente do corso e usava o slogan “Sossega leão!” Um outro carro foi
ornamentado como o quarto de harém, com sultão e lindas odaliscas recostadas em
almofadões de cetim, semi-escondidas atrás de cortinas transparentes, para
ilustrar a letra da marchinha: “Vem odalisca pro meu harém/Vem, vem, vem./Faço
o que você quiser/Pelas barbas de Maomé/Não olho mais para outra mulher”. Tudo
tão simples e tão modesto, que hoje pareceria até ridículo, como a brincadeira
de espirrar jatos de lança-perfume da marca “Rodouro” nas partes íntimas dos
brotinhos, que se arrepiavam e soltavam gritos por causa do líquido gelado.
O moderno Carnaval perdeu toda a
sua ingenuidade e se transformou em mega-espetáculo, exclusivo para turistas, como
podemos ver nos luxuosos desfiles que engalanam os sambódromos do Rio e de São
Paulo. Nada que possa lembrar, nem de longe, o deslumbramento dos desfiles de
Piracicaba, aplaudidos entusiasticamente, por seus carros alegóricos muito bem
feitos, ora a réplica singela dos nossos bondes, ora um carro mais luxuoso, que
desciam a Rua Boa Morte.
Na década de setenta o carnaval
de rua de nossa cidade era um dos mais comentados do interior. Famílias
inteiras da sociedade local desfilavam nos carros alegóricos, ou no chão,
mostrando muito samba no pé, num grande congraçamento, muito descontraídos e
eufóricos. Lembro-me de uma comissão de frente formada por homens elegantemente
vestidos de smoking e cartola. Nessa época, vinham para cá muitos artistas
globais, como o casal Tarcísio Meira e Glória Menezes, Hélio Souto e Pepita
Rodrigues, o jornalista Giba Um, o jurado de TV Décio Pitinini e muitas outras
celebridades da capital e de cidades vizinhas, para assistir e participar dos
desfiles de rua e curtirem os bailes do Clube Coronel Barbosa, que era muito
prestigiado.
Foi uma época marcante do nosso
carnaval piracicabano, que teve a Neidona como a foliã por excelência, e as
escolas de samba, entre elas a Zoom-zoom e a Equiperalta como as instituições
que sempre procuraram manter vivo o nosso carnaval!
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