Ludovico
da Silva
Tarde quente de verão. Eu estava
mesmo à toa, fui até a barranca do rio Piracicaba, ali no salto, um dos
recantos mais lindos da cidade, para me distrair um pouco e prosear com alguns
pescadores. Sabe como é, pescador sempre tem uma boa história para contar.
Como todo bom caipira, o pescador
é meio cismado quando algum estranho se aproxima dele. É preciso paciência, ir
tocando a conversa até ele ganhar confiança para soltar a língua. Ainda assim,
com um pouco de receio. Apresentei-me. Ele era o Chico.
Conversa vai, conversa vem, perguntei-lhe se sabia
de algum causo pra me contar. De imediato, me falou que tinha, mas que eu não
acreditaria, porque era mesmo história de pescador. Provoquei-o.
Quando eu pescava, Chico,
aconteceu um caso engraçado. Eu sempre ia na lagoa da Fazenda Tamandupá, onde
tinha “assim” de traíra. Fiz um gesto com os dedos das duas mãos, para marcar
bem a quantidade de peixe. Não é que eu peguei uma traíra tão grande, mas tão
grande, que quando fui tirá-la do anzol ela saltou, deu uma volta na canoa,
mordeu meu pé e ainda por cima arrancou um chinelo de dedo. Saiu em disparada
com a linha de aço, a isca e a vara. Sete dias depois, voltei à lagoa pra mais
uma pescadinha e não é que vi a traíra esquiando no meu chinelo?
O Chico deu uma risadinha
irônica, tirou o cigarro de palha da boca, cuspiu de lado, ajeitou o chapéu na
cabeça e lascou esta.
“Isso não é nada dotô. Domingo
passado fui com o meu cumpadre Zé pescá no paredão vermeio, no caminhão véio
dele. Peguemo tanto pexe, mais tanto pexe, que encheu a carroceria. Na vorta,
numa ladera bem cumprida, o caminhão ganhô muita velocidade. O cumpadre Zé ficô
desesperado, tacô o pé no breque, que faiô; o câmbio não engatava marcha; vi os
pexes sartando da carroceria; São Cristóvo, que tava no painer, já tinha
sartado de medo. Oiei a cara do cumpadre Zé tava branca. Daí eu falei: carma
cumpadre, dexe cumigo. Quebrei o vidro do velocímetro e fui afastando o ponteiro
bem devagarinho, até o caminhão pará.”
Todos os pescadores em volta
riram bastante. Não sei se da piada ou da minha cara. E depois, com a maior
cara de pau, o Chico ainda me ofereceu uma pinguinha...
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