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quinta-feira, 31 de março de 2011

O Elefantinho...


Maria de Fátima Rodrigues

Não sei o que é ser mãe. Acredito que nesta atual encarnação, este “papel” não me foi designado. Mas, dentre todos os outros personagens que representei nesse “palco de ilusões” (como dizia, meu “véio” paizão, Seo Vinicius) : filha, irmã, amiga, namorada... A que mais me divertiu, e o fiz com muito carinho... foi o de TIA!
Tenho sete sobrinhos, cinco mulheres e dois homens: Ana Paula, (e agora uma sobrinha-neta, a Joana), Roberta Maria, Marcelo, Maria Cristina, Maria Helena, Davi e Débora.
Sempre gostei de lhes dar a maior atenção possível, e isto quer dizer: presentes, conversar, levá-los ao cinema, ao Shopping, ao Teatro, viajar e brincar... mas brincar mesmo: de casinha, escolinha (eu sempre era a aluna), trocar as roupas da Barbie, cantar, dançar ou contar mais de dez vezes a história da “Sereia Ariel e seu amigo Linguado” ...para a Dedé (Débora), quando tinha cinco aninhos.
Só que existiam 2 brincadeiras que eles não gostavam. É que eu as utilizava, quando estava cansada. Uma delas era radical:
“- Muito bem, agora vamos brincar de múmia!”
“- Ah, não tia Fá! (pois isto queria dizer que tia Fá, estava definitivamente cansada e todo mundo tinha que “descansar” também).
No entanto, havia outra mais leve:
“- Agora vamos brincar de adivinhar um nome de animal que começa com a letra... (isto queria dizer que tia Fá estava mais ou menos cansada).
E dentre todas as vezes que fizemos esta brincadeira, houve um dia em que a Maria Cristina demonstrou tanta criatividade na resposta, que nunca esqueci. ( tinha seis aninhos)
“- Tá, agora vamos brincar de dizer nomes de animais que começa com a letra E.
“- Ema” – disse a Robertinha.
“- Elefante” – disse o Marcelo.
Daí era a vez da Maria Cristina, e ela me olhou assustada, com aqueles olhos grandes, como se dissesse: “- Não vale...!”
E eu, sabendo que nosso repertório de animais que começavam com a letra E já estava esgotado, quis ajudá-la:
“- Tá bom Cris... você passa.
“- Não passo não, tia “ – disse ela.
“- Ah, não? Então diga qual outro animal que começa com a letra E !!
“O filhinho do elefante do Marcelo!?

terça-feira, 29 de março de 2011

Cafezinho Literário - CONVITE

Neste sábado, 02 de abril, acontece o primeiro Cafezinho Literário do ano, às 14h, na Casa do Médico. Pedimos a todos que compareçam levando seus textos e um prato de doce ou salgado para a confraternização ao final das leituras.

Alguns momentos dos inúmeros cafezinhos:


. Doutor William Moffiti Harris, idealizador do evento

segunda-feira, 28 de março de 2011

Os presentes

William Moffitt Harris

Faz exatamente trinta e sete anos que saímos de Osvaldo Cruz, na Alta Paulista, para fixar residência em Campinas, onde residia a família de minha esposa. Recordo-me com saudades daqueles dois anos e pouco que ficamos lá no sertão, onde ensaiei os primeiros passos longe da monitoria de meus professores e residentes do Hospital das Clínicas de São Paulo. Eu estava cheio daquele fogo santo do recém-formado, crente que sabia tudo, e disposto a pôr em prática tudo que aprendi. Na parte técnica, trombei com a realidade e me vi muitas vezes em palpos de aranha, precisando me socorrer de colegas bem mais experientes. Em pouco tempo ficamos conhecendo o pessoal da cidade e fizemos boas amizades, das quais algumas perduram até os dias de hoje. Não éramos preparados para enfrentar a simplicidade e sinceridade com que o homem simples da roça manifestava sua gratidão. Dentro daquele corpo rijo, mãos calejadas com a enxada, a pele enrugada e amarronzada com a excessiva exposição ao sol, a roupa cheirando a suor e fogão a lenha, havia um ser tentando nos alcançar, comunicar-se de uma forma cândida, límpida, cristalina. Queria apenas dizer “muito obrigado, seu dotô”. Chegamos a ter, ao mesmo tempo, quase vinte frangos e galinhas num cercadinho que fiz no fundo do quintal. Não dávamos mais conta de comer carne de frango, por mais variada que fosse sua apresentação à mesa. Numa das ocasiões, uma senhora, acompanhada do marido, trouxe-nos num domingo à tarde meia dúzia de uma só vez. Já não me lembro do que é que “salvei” seu filho. Eram descendentes de italianos e lembro-me de ter ido até o portão para ouvir um verdadeiro discurso inflamado com uma grande gesticulação por parte de ambos. Nossa boxer mestiça, a Pipoca, vez por outra invadia o galinheiro e saía triunfante com uma apavorada galinha cacarejando e freneticamente batendo as asas. Pipoca a trazia abocanhada pelos fundilhos e sacudindo seu coto caudal, corria alegremente pelos quatro cantos do quintal. Minha dedicada esposa Maria Lúcia, já no sexto mês de nossa primogênita, não mais subia e descia aquela longa rua poeirenta sem calçamento, duas vezes ao dia, para me ajudar no consultório. Ficava para trás para cuidar da casa, do almoço e da criação. Todas as quintas-feiras passava por lá o peixeiro com sua carrocinha. A vizinhança batia aquele papo enquanto o velho pesava a mercadoria e ia embrulhando as encomendas em jornal. Era afável e comunicativo. Sempre tinha alguma novidade para contar. Numa fria madrugada de inverno foram em casa me buscar de charrete. O peixeiro acabara de ser internado na Santa Casa e estava passando muito mal. O médico de plantão havia saído para atender a um chamado. Constatei ponto de Murphy extremamente sensível e sinal de Blomberg positivo, denotando peritonismo. Diagnostiquei uma colecistite aguda e mandei chamar um amigo cirurgião, enquanto ia preparando a sala de cirurgia e o paciente, com as enfermeiras. Ajudei a retirar a vesícula com seu único cálculo quase do tamanho de um ovo de galinha. O velho, com seus 70 anos, nunca tinha tido uma cólica biliar. Lembrei-me bem do que um de nossos caros mestres de Anatomia Patológica, Prof. Lombardi, nos dissera durante uma necropsia que cálculos renais e biliares são achados de necrópsia em quase trinta por cento dos casos, a grande maioria assintomática a vida toda. O peixeiro, após remoção do dreno, uma semana depois, teve alta e de quebra levou o cálculo para casa. Restabeleceu-se logo e voltou a trabalhar. Por mais que minha esposa insistisse, recusava-se, daí em diante, a receber pagamento pelo peixe que trazia para ela todas as quintas-feiras, até virmos embora de Osvaldo Cruzem agosto de 1963. De vez em quando, havia chamados domiciliares. Um que vem às vezes à minha memória, por ter sido inusitado, foi o caso das abobrinhas. Num prolongado fim-de-semana compareci à casa de um alto funcionário do governo estadual para cuidar de suas duas menininhas pré-escolares que haviam apanhado sarampo. Fiquei preocupado com uma delas que mostrava sinais de comprometimento pulmonar e durante aqueles quatro dias fui à casa delas três vezes. Encerrando esta série de visitas, o engenheiro indagou de mim quanto seriam meus honorários. Disse-lhe que duas abobrinhas estava bem. Pediu desculpas por não dispor delas naquele momento, mas durante a semana providenciaria. Alguns dias mais tarde levou pessoalmente em casa duas enormes abobrinhas para que a Maria Lúcia as preparasse para o jantar. Até hoje fiquei na dúvida se ele estava me gozando ou se realmente achava que havia cobrado o serviço profissional daquele jeito. Quem sabe se ele me achava com cara de vegetariano? Para os leitores que não são daquela época, esclareço que a nota de mil cruzeiros era alaranjada e popularmente cognominada de “abobrinha”. E o que dizer dos ovos-caipira bem fresquinhos que ganhávamos de vez em quando? Havia os que traziam três, já de caso pensado, para pagar a consulta. Outros, mais abonados ou com maior produção em casa, traziam dez ou uma dúzia. Sabiam que a minha esposa, que me secretariava, e eu, nunca mandávamos pessoa alguma embora sem atendimento. Adorávamos ovos e toicinho fritos quase todos os dias com o café da manhã. Naqueles dias, início dos anos sessenta, ainda não dávamos importância ao problema do colesterol. Um sitiante comentou com seu vizinho que minha esposa gostava de chupar cana e, embora fosse pagante, fez questão de apanhar em sua roça, e nos trazer, dois enormes toletes de quase oito centímetros de diâmetro e seguramente quase dois metros e meio de comprimento. Era cana-de-açúcar arroxeada. Nunca tínhamos visto aquele tipo. Uma delícia! Nosso quintal era pequeno e o jardim da frente muito reduzido. Num sábado à tarde, apareceu em casa um senhor acompanhado de sua filha adolescente. Queria por toda a lei dar uma carpida no meu quintal. Até levou sua enxada. De tanto insistir, acabamos deixando-o entrar. Fui acompanhá-lo, enquanto a Malu foi preparar um café, fazendo depois companhia para a mocinha no terraço. Essa, orgulhosamente, mostrou como estava com as mãos completamente boas. Abria e as fechava quase que normalmente e as cicatrizes operatórias estavam sumindo. Era negra e eu observei, alguns meses mais tarde, quando retornou ao consultório para acompanhamento, que havia poucos sinais de quelóide. Nunca me esquecerei daquele largo sorriso desdentado do pai com alguns tocos amarelo-enegrecidos de tanto mascar fumo. Tinha uma barba rala, começando a esbranquiçar e um ligeiro bigode. Repetia sem parar o que já me havia dito inúmeras vezes no consultório: não sabia como me agradecer. Este foi um dos casos que mais trabalho me deu e que tanta satisfação me proporcionou, não só pelo resultado profissional, mas pelo alívio do sofrimento alheio. A jovem de uns quinze anos era catadora de café e havia se machucado em ambas as mãos durante seu trabalho. Em sua casa, colocaram diversos curativos e compressas de ervas medicinais populares, mas sua situação só piorou. Quando foram me consultar, estava com dez panarícios envolvendo todas as falanges. Todos os dedos estavam terrivelmente inchados, duros e amarelados – flutuando, como falávamos no HC “pedindo um bisturi” – inclusive com áreas perioniquiais arroxeadas. O dorso e palma das mãos estavam com características de imensos flegmões. A intervenção cirúrgica durou quase três horas. A anestesia local foi anular a roda dos punhos – um bloqueio perfeito. Transfixei as partes moles das falanges uma por uma, colocando em cada uma um dreno de borracha besuntado com pomada de Furacin. No dia seguinte e, diariamente, durante uns dez dias, mobilizávamos os drenos e renovávamos o Furacin. A adolescente nem piscava. Dizia que não sentia dor enquanto mexia nos drenos. Eu ia aplicando, complementarmente, calor local com uma lâmpada infra-vermelho que havia no consultório. A paciente passava duas vezes ao dia para tomar sua injeção de antibiótico, na farmácia. Aos poucos, fui dispensando os drenos e depois de duas semanas só embrulhava os dedos e as mãos com gazes embebidos com a pomada. A olhos vistos, as feridas foram fechando e as mãos desinchando. Não acreditava que não estava doendo. Eu achava que a paciente estava sendo estóica. Um mês depois da intervenção cirúrgica, iniciei a fisioterapia. Foram exercícios lentos, passivos e progressivos. Passados mais uns quinze dias, iniciamos exercícios ativos dentro de glicerina amornada. Um dia, ela me apareceu com o pai no consultório sem os curativos e com as unhas feitas. Ambos estavam sorrindo de felicidade. Vieram saber quanto deveriam pagar. Disse-lhes que estavam dispensados de pagamento, que o prazer era todo meu e que não se preocupassem com o material. Estava tudo certo. Fiz as recomendações de exercícios em casa duas vezes ao dia. O farmacêutico, Sr. Alípio, também nada cobrou pelos antibióticos lhe aplicados. Cobrou-me o pacote de Furacin pelo preço que pagou ao distribuidor. Recebemos também outros presentes em espécie: espigas de milho, feijão, amendoim e uma vez um rolinho de fumo. Acabei passando-o para a frente porque não havia me habituado a fumar cigarro de palha. Eu, desgraçadamente, fumava na época. Saboreava um bom charuto e dava umas cachimbadas com uma mistura que aprendi a fazer com meu pai. Na composição entrava o Capstan, o Half and Half, um fumo irlandês e um nacional cujos nomes agora não me recordo. Espalhava aquilo tudo num jornal aberto e raspava um quarto de tablete de chocolate amargo da Kopenhagen por cima do fumo. Misturava tudo cuidadosamente e prensava-a no interior de um vidro octogonal, cujas paredes haviam sido besuntadas com mel de flor de laranja. O vidro era fechado e somente aberto após três meses. Sinto até hoje o sabor daquele cachimbo... Abelhas se aglutinavam na tela da janela da sala, procurando entrar, devido ao cheiro, quando meu pai acendia seu caximbo. Sou, caro leitor, profundamente agradecido a Deus pelos momentos de felicidade que estas memórias me trazem. Como disse certa vez o Doctor Samuel Johnson: “Deus nos deu memórias para que colhêssemos rosas em nossos invernos”.


*Capítulo do livro do autor (esgotado): Era Uma Vez Um Menino Travesso. São Paulo: Legnar Editora, 2004. Apresentado na 125ª tertúlia literária do Movimento Médico Paulista do Cafezinho Literário – MMCL realizada na Associação dos Médicos de Santos em 24 de abril de 2010 (21ª reunião do MMCL em Santos), na reunião literária do Movimento Literário Saberes e Sabores – MLSS de 10 de maio de 2010 em S. Gonçalo do Sapucaí - MG e na 17a tertúlia literária do Núcleo do MMCL de Taubaté em 12 de junho de 2010. Pediatra Sanitarista, Prof. Doutor aposentado da Faculdade de Saúde Pública da USP; Fundador (05/05/05) e Coordenador Estadual do MMCL; Membro Titular desde 2003 da Associação Brasileira de Médicos Escritores – SOBRAMES (BR, CE, PE e RS); Separatista e Dissidente da SOBRAMES-SP; Membro Honorário e Correspondente da Academia Maceioense de Letras; Membro Titular da Sociedade Brasileira de História da Medicina; Sócio Titular da Associação Paulista de Medicina; Membro Associado Remido da Associação dos Médicos de Santos. Associado Efetivo da Academia Vicentina de Letras, Artes e Ofícios “Frei Gaspar da Madre de Deus” de S. Vicente – SP.

domingo, 27 de março de 2011

Mulher 104

Dirce Ramos de Lima

O mundo hoje está muito mais alegre do que nunca!
Já houve flertes, paqueras,namoros...
A moda agora é ficar. E, como sempre , cada qual fica à sua maneira. Bem, um dos meus últimos ficantes teve a ousadia e o atrevimento de me dizer que, em suas conquistas, eu era a mulher 104. Entendi, ri, mas não gostei. Reclamar? Jamais! Disse-lhe que estava feliz por 104 não ser uma senha senão iria demorar muito pra chegar minha vez. Curiosa, pedi que esclarecesse melhor. Onde e como fazia sua conta? Será que lá onde vive tem uma parede onde vai colocando risquinhos? Surpresa maior: mostrou-me o celular onde havia uma foto minha com o número 104 embaixo. Que horror! Assustei-me mais ainda. Mas ele, gentil, carinhoso, atual, moderno, habilidoso, tranquilizou-me: - Quando conhecer a 105, apago a sua foto e coloco a outra!
Que alivio, heim! Logo, logo iria desaparecer de sua vida, de sua lembrança e do seu celular. Uma experiência nova e diferente: ser a mulher 104 na vida de alguém... Continuando o assunto ele me perguntou: - E eu? Que número sou pra você? Disfarcei, continuei rindo e respondi com a maior tranquilidade: - Sei lá! Nunca me preocupei em enumerar homens...
( mas por dentro, falando comigo mesma,conclui: acho todos eles número zero...)

sexta-feira, 25 de março de 2011

Premiação - "Felicidade é..."

A escritora Aracy Duarte Ferrari teve sua frase classificada em primeiro lugar no concurso realizado pelo Clube de Campo de Piracicaba.
Cerca de 200 concorrentes participaram por e-mail, facebook, twitter ou cupons colocados em urnas espalhadas pelo clube completando a frase: "Felicidade é..."
Sua mensagem premiada:
"Felicidade é...sentimentos em alta maré!"

quinta-feira, 24 de março de 2011

Planeta Água

Elda Nympha Cobra Silveira

Águas que caem do alto dos céus lavando o mundo das perdidas ilusões. Águas que buscam no porvir as bênçãos derramadas pelo amor divino, a me advertirem que posso ser feliz, posso ter as bênçãos dos estados da matéria:, nos três quartos de água que cobrem; como um manto azul, todo esse planeta. Quando o vapor se eleva nos ares e produz nuvens, que apenas vêm até a terra, como se marejassem dos olhos daqueles que sofrem, que choram por um amor escasso, na angustia de se sentirem infelizes, por culpa de um viver tão complicado. Lagrimas vertidas pela saudade de alguém que já partiu e não voltará jamais. Águas essenciais para o nosso viver, elemento substancial, imprescindível no cotidiano do planeta Terra. Águas que são como ouro, como jóias da natureza.
Águas que precisam de respeito, para que um dia não sejam garimpadas, devido à sua escassez, motivada pelo desperdício desenfreado. Águas legadas aos nossos filhos e netos. Águas tratadas com muito afeto e não pela incúria dos ancestrais, que priorizaram o vil metal e não cuidaram dos mananciais. Águas pródigas com quem as respeitam, águas são dádivas divinas. Águas nascentes, ribeirões, rios, cascatas, cachoeiras e costas marítimas. Águas a quem pedimos perdão, por nos comportarmos como herdeiros ingratos, sem capacidade para dar continuidade àquilo que ganhamos de mão-beijada..
Águas que na pia batismal fazem do recém-nascido um bom cristão, para saber discernir de onde veio e para onde vai. Água benta, que nessa hora tão divina, derruba todo mal que no gênese adquiriu.
Chuva que ensopa meus cabelos, envolva meu corpo e escorra pela minha face! Quero a companhia de um lago, um rio, um mar para sanar tudo que me entristece, para refrescar corpo e mente, pra ver tudo em volta com os olhos da alma! Chuva seja minha amiga! Limpe toda negatividade, a obscuridade e me ajude a construir a paz!

domingo, 20 de março de 2011

Águas que rolaram - Parte II

Ruth Carvalho Lima de Assunção

Após ler e reler as lembranças do artigo anterior veio-me a necessidade de um complemento mais audacioso que me redimisse dos pecaditos da infância, me consolasse e colocasse minha mãe em seu devido lugar – de mãe.
Levei um pito. Um pito que me deixou sem chão. Acabrunhada, com uma lágrima pendente na ponta do nariz corri para minha cama, em busca de consolo.
Agarrei-me ao travesseiro, puxei o cobertor tentando abafar os meus soluços tão
sentidos Eu correra tanto, não era fácil acompanhar o meu irmão, ele era o grandão, voltei com aquela dor que sempre me dava quando eu corria, bem na barriga da perna, e eu queria ver o sorriso dela, de felicidade, eu tinha a certeza que ela ia me agradecer.
Não era aquilo que eu esperava. UM PITO.
Eu queria, eu queria mesmo era um grande abraço, um abração. E dormi bem abraçada ao travesseiro. De pés sujos e cabeça rodando.
Depois, meio dormindo, meio acordada percebi minha mãe me carregando e me levando para o banheiro e fui entrando em baixo do chuveiro. Foi aquele banho, que além de tirar a terra, também levou as minhocas de minha cabeça.
Foi muito gostoso, a medida que mamãe falava, que se desculpava, os meus medos, os meus demônios iam se afastando e eu passei a rir quando ela me abraçou dizendo que aquilo não iria mais acontecer, que ela só queria o meu bem, a minha alegria e o meu amor.
Bom, não é preciso contar que passei a dormir, sentindo-me um anjinho.
A Revolução continuava. Muitos comitês, geralmente liderados por mulheres, se organizaram na intenção de levar às famílias, palavras de apoio e de esperança.
Discussões, intrigas, sabotagens iam se consolidando, se interligando em tramas de uma nova guerra. A politicagem se posicionava, queria levar vantagem.
As famílias religiosas continuavam a orar todas as noites pelo fim desse confronto que só viria dividir, retalhar um continente, e o pior, trazer em nossos corações o ódio pelo irmão. E a oração que protege, que nos livra dos males, que
nos guia, não faltava. Todas as noites terminavam com o infalível ...Santo anjo do Senhor, meu divino guardador, se a ti me...
Daí a alguns dias eu olhava a rua quando muitas cabeças surgiram nas janelas gritando:
A Guerra acabou, a Guerra acabou. Mulheres e crianças saíram para as ruas. A maioria dos homens ainda estava nas trincheiras, e talvez nem soubessem das últimas.
Mamãe, papai vai voltar?
Graças a Deus. Ele ouviu as nossas preces.
Como ele vem? A pé?
Eu acho que ele vem de trem.
Quero ver o trem. Ele é bonito?
Vamos esperar mais um pouco. Por enquanto não sabemos muita coisa.
Seu pai logo estará entre nós. E vai voltar para a escola, onde é o seu lugar.

sábado, 19 de março de 2011

Um povo que chora em silêncio

Adenize Maria Costa

Recebi um e-mail, desses que pede pra repassar para todos os contatos, pedindo orações aos japoneses e ao final é mandado “um abraço virtual” e abaixo a lista de todos os que aderiram a essa “corrente”. Nada de anormal, dentro do que recebo nesse fantástico e louco mundo virtual, mas o que definitivamente me levou a recusar e a responder à pessoa que me enviou foi devido ao tamanho da ignorância, da falta de informação de quem teve essa idéia infeliz. Num trecho está escrito o seguinte: “Conheço sua dificuldade cultural para o choro, para a exteriorização de sentimentos... E sei que, apesar de todo o esforço para sublimar, o seu coração grita e chora... E nós,ocidentais,juntamo-nos a vocês, na dor desse momento e oferecemos , dentro da nossa impotência aquilo de que podemos dispor: nossa empatia,nossas orações e nosso ABRAÇO VIRTUAL”
Não posso compartilhar desse comentário infeliz, dessa imagem distorcida sobre a cultura oriental.
Nesse momento me solidarizo sim com a dor dos nossos irmãos japoneses e todos os de outra nacionalidade que residem naquele país.
A cultura oriental é sábia por ser silenciosa, por se reconhecer insignificante diante da força da natureza. Aos nossos olhos eles podem parecer frios, incapazes de externar o choro, o sofrimento, mas, na verdade eles (com toda a Sabedoria da crença que a maioria professa) sofrem pela coletividade. Japoneses do mundo inteiro buscam no silêncio de seus corações se unirem ao sofrimento daqueles que estão experimentando na carne e na alma a dor dessa tragédia.
Nos ocidentais temos a tendência para o escândalo, o famoso “barraco” na hora do sofrimento, aprendamos pois com os orientais a nos reconhecermos pequenos e buscarmos no silêncio com expressão serena unir forças para superar os desafios.
Por falar em silêncio, não foi assim que o Verbo de Deus se fez carne? Não foi no silêncio que se deu a Ressurreição de Jesus?
Existe mais Sabedoria no silêncio do que na euforia, no escândalo disso eu não tenho dúvidas...

Concurso de Crônicas Laura Ferreira do Nascimento

Premiação:

Primeiro lugar: R$ 1.000,00 (mil reais) + certificado + livros
Segundo lugar: R$ 500,00 (quinhentos reais) + certificado + livros
Terceiro lugar: R$ 250,00 (duzentos e cinqüenta reais) + certificado + livros
Quarto lugar: R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais) + certificado + livros
Quinto lugar: R$ 100,00 (cem reais) + certificado + livros

Maiores informações no site:
http://www.concursosdecronicas.blogspot.com/

quarta-feira, 16 de março de 2011

Natureza Furiosa


Pedro Israel Novaes de Almeida

Os desastres naturais ocorridos no Japão revelam, mais uma vez, que a natureza tem seus chiliques, e ainda somos dependentes de seus humores, apesar de todo o avanço tecnológico que temos experimentado.
Terremotos, furacões, tsunamis, chuvas em excesso, secas, vulcões, frios e calores atormentam a humanidade desde o tempo das cavernas. Ao perigo do clima, soma-se o risco de pestes, que já fizeram milhões de vítimas, com bactérias, fungos e vírus desafiando sem tréguas a ciência humana.
Os prejuízos e sofrimentos causados pelos fenômenos naturais geram inconformismos, mas curvamo-nos à inevitabilidade de tais desastres, que independem da ação humana. Contudo, o risco de contaminação radioativa, que ronda grande parte dos países, nada tem de natural, e gerou ondas populares contra a instalação de usinas nucleares.
Tais usinas parecem um risco necessário, aos países onde é impossível a instalação de grandes reservatórios de água, como o Japão, cuja demanda por energia é gigantesca. No caso brasileiro, ainda é prematuro tal risco, apesar de estarmos edificando nossa terceira usina nuclear.
O grande desafio à ciência reside, hoje, em otimizar o rendimento de fontes alternativas, como a eólica e solar, reduzindo os desastres da combustão de fósseis e impedindo que o mundo seja transformado em um grande lago, para atender à crescente necessidade de energia. A energia nuclear é eficiente e economiza espaços, mas gera lixo perpétuo, de difícil descarte, e permanente sobressalto quanto ao risco de acidentes, por maiores que sejam os mecanismos humanos de proteção.
Soam, país afora, gritos ambientalóides, relacionando terremotos e tsunamis ao aquecimento global, mas tais eventos já ocorriam antes mesmo do homem acender sua inaugural fogueira. Ambientalistas de fato não integram tais turbas.
A aventura humana sempre envolveu a submissão aos inevitáveis humores da natureza, mas convém confinar os desastres àqueles ocorridos naturalmente. Contudo, temos sido imediatistas, buscando lucros e confortos que acabam gerando descontroles ambientais e desastres os mais variados.
A natureza nada tem a ver com os vazamentos industriais, que poluem vastas regiões e oceanos, nem está preparada para receber indiscriminada quantidade de sacos plásticos e resíduos os mais variados. O aquecimento global, que naturalmente levaria milênios, está ocorrendo em décadas.
A natureza não extermina espécies com a intensidade com que o fazemos, nem é obrigada a guarnecer humanos empoleirados em morros e seus sopés. Já usufruímos os produtos transgênicos, antes mesmo de atendido o princípio da precaução, e apesar da pouca independência produtiva e afunilamento genético que gera. Sequer o direito humano de saber estarmos ou não adquirindo e consumindo produtos transgênicos é respeitado.
A natureza já dispõe de suficiente arsenal de desastres, e convém não engrandecê-lo.

terça-feira, 15 de março de 2011

Concurso Nacional de Contos Josué Guimarães

Premiações:
1º lugar: R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e Troféu Vasco Prado
2º lugar: R$ 3.000,00 (três mil reais) e Troféu Vasco Prado

Mais informações sobre o regulamento no site:

http://www.jornadadeliteratura.upf.br/2011/index.php/concursos/12o-concurso-nacional-de-contos-josue-guimaraes.html

segunda-feira, 14 de março de 2011

Dia Nacional da Poesia

O Grupo Oficina Literária de Piracicaba é um grupo de prosas. Mas como hoje é o Dia Nacional da Poesia, abrimos uma exceção e publicamos poemas de integrantes do Golp e de alguns dos amigos das letras. JÓIA DO NILO
Rosani Abul Adal

Olhar triste cabisbaixo,
rabo entre as pernas.
A fome e o medo,
os seus companheiros.
As marcas do abandono
na costela quebrada.
Passos trêmulos se aproximou.
Saciou a sede e a fome,
sem forças para caminhar,
deitou-se ao meu lado.
Trocamos afagos e carinhos,
uma lágrima deslizou até o focinho
- não resisti e ele me adotou.
Bijou, a minha jóia do Nilo,
acompanha meus passos,
conhece meus segredos
e me acolhe nas noites de solidão.
Na calada da noite conversamos
através de mantras caninos,
Bijou suspira aliviado.
Dormimos e sonhamos sem medo
.


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HAIKAIS
Carmen M.S.F.Pilotto


Gatos nas telhas
Em eternas melodias
É outono...



Pássaros voejam
Encantos de poeta
Sonhos de verão...

Ventos rastejam
Tristezas de um cantor
Dor daquele inverno...

As flores cantam
Os prados verdejantes
É primavera...

Poemazul
Ivana Maria França de Negri

Compus um poema azul
etéreo,
com versos brancos
leves como as nuvens do céu
Queria que trouxesse paz
felicidade e alegria.

Mas surgiu um poema forte
pulsante e cor de sangue
arrebatando minha alma
como o vento do outono
que sacode as árvores
e carrega as folhas.

Criou asas meu poeminha azul
Era feito de sonho
e voou como pluma
para os mares do sul.

Ficou o rútilo poema,
denso, quente e vibrante
e dei-lhe o nome de Vida.

TROVA
Leda Coletti

Ser poeta é não ter medo
de extravasar emoção,
mesmo que escape segredo
que até mereça sanção
.

O POETA
Lino Vitti
Pegasus
Quando o enxergam passar, passos pequenos,
A face magra, quieto, entristecido,
Lançando, às vezes, no ar, mudos acenos
Em gestos de abraçar o indefinido;

Quando o enxergam passar (e o seu ouvido
Não atende aos insultos dos terrenos)
Todos, num quase acento comovido,
Dizem: "Deve ser louco, mais ou menos".

Um dia (nem eu sei como se deu)
Conversamos. Contou-me todo o seu
Viver cheio de angústias e revezes.

É poeta. . . arrependo-me dizê-lo,
Pois eu sei que dirão, agora, ao vê-lo:
"Poeta?. . . então é louco duas vezes!"


POETISAS
Esio Antonio Pezzato

Carla, Ivana, Ivani, Leda, Carmen, Marisa,
Myria, Shirley, Raquel, Sílvia, Cecília, Helena...
E outras mais, tantas mais... Junto à brisa serena
Tecem inspirações junto à serena brisa.

E cada alma sublime evoca a cantilena
Dos amores sem fim de maneira precisa.
Cada alma evoca a luz, cada alma – poetisa! –
Poetiza o sublime e o amor, no céu, acena.

Glória ao Sublime Deus que as fez cantar em versos,
Modelando em canções dos timbres mais diversos
Conquistam nosso ser no sonho que seduz.

Poetisas que eu amo! A vós de almas inquietas
Há um séquito de amor de todos os Poetas
Que aplaudem com prazer vossos fachos de luz!

SONETO
Irineu Volpato

O sol veio domingo de requinte
Inda alindavam-se morros de sereno
Ventinho desses brandos tom ameno
Manhã toda de luz quase um acinte.

Na estrada uma charrete perseguia
carregando família impertigada
No Vilar missa de ano anunciada
Em paisagem comum se acontecia.

Missa rezada obrigação cumprida
Marido indo cuidar coisas da lida
E mãe fez-se visita nuns parentes.

Dia nadou entre prosas e escambo
Voltavam quando dia ia zambo
e tarde debruçava-se entrementes.


DIA DA POESIA
André Bueno Oliveira


O Sol poeta do espaço
sorvendo a etérea poesia
em compassado compasso,
ao declamá-la dizia:

“ Quero a Lua em meu sistema,
em meu sistema solar;
ela é musa, causa, tema,
de meu rimado cantar.

Hoje é dia da Poesia,
vou compor-lhe uma canção
extraindo a melodia
do amor de meu coração.

Mas por que um dia exato
pra brindar a Poesia?
Se sou poeta de fato,
o seu dia, é cada dia...”

AOS POETAS
Carla Ceres

Quisera saber mais sobre esta lida
De ver a própria dor de dor repleta
Surgir como cantiga enternecida,
Fazer valer a pena ser poeta.

Quem dera tal vontade desmedida
De ver como o poema se completa
Mostrasse como se completa a vida
Qual dor que no cantar se faz concreta.

No entanto meu caminho já termina.
Mal deixo a quem seguir a mesma sina
Poemas mapeando falsas metas.

Mas sei que, após andar assim a esmo,
O verso é quem se escreve por si mesmo,
A vida é quem se inscreve em nós, poetas.



OH! VIDA!
Maria Emília L.M. Redi

Vidinha tonta sem sonhos desliza
Doida a galopar horas indomáveis,
A seguir velhos rumos e onde pisa
Deixa laços nos rastros incontáveis.

Sinos dobram as esquinas sob a brisa
Das ilusões perdidas e inefáveis...
E nos olhos a alegria agoniza
A escorrer em prantos infindáveis.

O brilho da saudade entardecida
Chicoteia o céu impunemente,
No crepúsculo, triste luz perdida...

Segue longe a esperança emperdenida
Carregando seu fardo inutilmente:
-Tão surda se fazendo a ti – Oh! Vida!


O DURO RETORNO
Francisco de Assis Ferraz de Mello

Dizia: “- Nunca mais bebo desta água!
Nem deste pão amargo provarei.
Já não pertenço a esta maldita grei
De sofredores em perene mágoa.

Deixei o pântano onde a dor deságua.
No império da fortuna me amparei
E vou vivendo como vive um rei
- A vida que vivi, da mente apago-a.”

E extinguiu da memória a experiência
Então, a sorte, com feral demência,
Para o lodo de antanho o arremessou.

E foi beber exato daquela água,
Comer do pão e reviver na frágua
Do passado que tanto desprezou.

TRISTEZA SEM SORRISO
Vilma L. Ducatti

A vida esquecida
clama por justiça
Sofrendo as dores
da solidão
ficou apenas
um pássaro
Só...





sábado, 12 de março de 2011

Metamorfose

Lidia Sendin

O senhor de terno escuro, parado em frente à Igreja, colocou nervosamente a mão no bolso, tirou o lenço dobrado e passou pela testa, segurou com força a mão da elegante senhora ao seu lado e suspirou.
Dos olhos dela uma lágrima teimosa foi retirada disfarçadamente.
Levantaram as mãos ao mesmo tempo, como se tivessem combinado o adeus derradeiro, procurando nos olhos do outro algum conforto.
Vagarosamente desceram as escadas e entraram no carro. Ficaram ali parados, procurando o que dizer, perturbados com o próprio silêncio.
O que se pode dizer quando uma filha parte? Que um pedaço de nós foi arrancado, ficando um buraco cheio de saudade, rodeado de uma absurda carência de sua presença.
O sisudo senhor passou a mão com carinho nos cabelos da mulher: - é apenas uma viagem, ela voltará em breve, disse como consolo.
Mas no coração dela a saudade já era imensa, Uma saudade que não era de agora, uma saudade de um bebê para amamentar, de uma menina para fazer tranças, de uma adolescente graciosa e rebelde, mas tão encantadora, que jamais deveria ter ser substituída pela jovem senhora que partia agora para viagem de Lua de Mel.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Sessentando

Pedro Israel Novaes de Almeida

Duas idades marcam a vida das pessoas.
Para os que não cometem crimes, os dezoito anos são esperados como passaporte a qualquer cinema ou teatro, verdadeiro símbolo de maioridade, que permite até dirigir veículos. Passada a fase dos dezoito, o próximo marco vem aos sessenta, portal da terceira idade, quando os ímpetos já não são os mesmos e a atividade contemplativa figura como ameaça.
Estamos sessentando, e chegaremos a abril na deliciosa condição de idosos. Há tempos aguardávamos as regalias da terceira idade.
Seremos idosos ativistas, e ninguém deve estacionar veículos em nossa vaga ou furar a fila preferencial. Se estivermos em algum navio prestes a afundar, teremos, após as mulheres e crianças, direito aos botes salva-vidas.
Nas encrencas de rua, sempre teremos uma saída honrosa. Se alguém bater, será covardia, e, se apanhar do velhinho, será uma vergonha.
Poderemos até mexer com uma ou outra moça, na rua, sem correr o risco de sermos xingados de sem-vergonhas ou safados. Na pior das hipóteses, o velhinho será tido como atrevido ou tarado. Convém, antes, avaliar o risco da moça concordar com o gracejo, o que seria uma calamidade.
Estaremos, finalmente, autorizados ao uso de suspensórios e até chinelo com meia, além de novamente calçar aquele sapato que já não servia, pois os pés emagrecem, com o tempo. Farmácias aumentarão os descontos, e até alguns transportes serão franqueados. A desvantagem será o menor prazo para a renovação da carteira de habilitação, e o maior custo das apólices de seguro.
As aparências podem conturbar a vida dos idosos. Se for visto em algum motel, a polícia verifica se não foi sequestrado, e, se mantiver relacionamento com mulheres com menos de quarenta anos, será acusado de pedofilia.
A população está envelhecendo, e os idosos já fazem parte da paisagem. Convém aproveitar, pois as regalias acabarão sendo direcionadas aos mais novos, que levam vidas mais atribuladas e precisam descansar.
Tememos o envelhecimento da memória e raciocínio, e apavora-nos a idéia de não percebermos as esquisitices que podem surgir, com a idade. Palavras cruzadas, Sudoku, leituras, escritos, conversas, caminhadas, boa alimentação e utilidade ao semelhante tornam mais prazerosa a terceira idade, que não impede o empreendedorismo, o aprendizado e o trabalho.
Estamos sessentando, e as fotos dos artigos parecem haver parado no tempo, tiradas, algumas, há décadas. É hora de olhar um pouco para trás, percebendo erros e acertos que nenhum arrependimento deixaram.
É hora de olhar para a frente, agora instrumentado pelos erros e acertos do passado. Envelhecer é ter histórias para contar, saudades para curtir, planos a realizar e uma nova vida para viver.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Idades da Vida

Plinio Montagner

Durante a vida é sempre o presente o momento vivido.
A única diferença entre o agora, o passado e o futuro é que no começo o futuro é extenso, e no fim, sobra um longo passado.
Uma das mais importantes conquistas do homem é saber viver a vida para ser feliz.
Escreveu Voltaire: “Qui n’a pas l’esprit de son age; de son âge a tout le Malheur.” (Quem não tem o espírito de sua idade, dela terá todas as desventuras.)
O homem sábio aceita o espírito e os desejos de sua idade, respeitando os limites de seu corpo e entende os porquês de suas fantasias.
Na infância as necessidades e as responsabilidades são brandas e diminutas, como lenta e imperceptível a excitação dos desejos.
Para as crianças o futuro não existe; o presente é que é sentido. Mais tarde vão fazer igualzinho aos adultos, dedicando seu tempo pensando no futuro.
O homem amadurecido, enriquecido pela experiência, vê o mundo de modo diferente. Quem viveu mais teve mais experiências, errou mais e caiu várias vezes, mas proveito tirou das derrotas. Talvez seja a explicação por que as crianças têm alegrias, tristezas e medos imaginários.
Um filósofo comparou a vida a um bordado, em que a primeira fase é o que lado que se vê, a frente bonita, e na segunda, o avesso, se não tão belo, revela os segredos da beleza, mostrando como os fios estão concatenados entre si e como os caminhos da vida são difíceis e complicados.
Uma sutil diferença entre a mocidade e a velhice é a coragem dos jovens e sua impetuosidade, contra a vigia constante dos idosos aos seus corpos combalidos.
O medo da morte e o início da decrepitude potencializam os arrependimentos e os desejos do perdão não conquistado. Nesses momentos o homem volta a ser criança, dogmático, e procura a remissão dos seus pecados.
Na idade adulta o tempo é economizado, somos mais exigentes e mais seletivos. Nessa fase da vida os medos ignorados agora são emergidos.
Os créditos do tempo acabam sem aviso, como o último pedacinho do tubo de fio dental, que, de repente, a gente puxa o fio, e acaba.
O idoso fica “mais inteligente” - seleciona o que lhe convém.
É preciso ter vivido muito para perceber como a vida é curta; e, quanto mais velhos se fica, tanto menores e insignificantes nos parecem os problemas.
Costuma-se dizer que a mocidade é o tempo feliz da vida e que a velhice é o tempo da tristeza. Estaria certo esse preceito se a beleza e a juventude e as paixões trouxessem felicidade.
De certa forma, a mocidade é o tempo maravilhoso da vida, e também da inquietação, porque há muito para ser visto, sentido e conquistado, enquanto a velhice é o tempo da placidez.
As experiências fazem o homem mais velho considerar que muitos sonhos da juventude foram vaidades de fúteis conquistas, mas necessários ao desenvolvimento do corpo e da mente.
O traço característico da idade avançada é mesmo o desencanto com as fontes efêmeras da felicidade, e que o tédio só acompanha o homem que não conheceu prazeres que não os dos sentidos, deixando órfão o cérebro dos prazeres da espiritualidade.

terça-feira, 8 de março de 2011

MULHER

Ludovico da Silva

Alguém já deve ter visto uma caricatura em que uma mulher é arrastada pelos cabelos por um brutamontes, em direção a uma caverna.
Era assim que a mulher era tratada. Como uma verdadeira escrava.
O homem era o seu dono e podia dispor dela como que quisesse e bem entendesse.
Esse tempo já passou.
Hoje, a mulher se situa, merecidamente, em igualdade de condições com o homem.
Essa posição não foi alcançada ao sabor da luz do sol ou da mudança da lua.
É preciso um recuo até a década de 50 do século XIX, quando mais de uma centena de mulheres de uma indústria têxtil, da cidade norte-americana de Nova Iorque, entrou em greve, por melhores condições de vida. Pagaram com suas próprias vidas, mas seus gritos ecoaram pelos anos futuros e pelo mundo afora.
Essas mulheres fizeram história e hoje merecem ser reverenciadas pelo que conquistaram.
Aos poucos, foram alcançando vitórias, quebraram tabus, garantiram direitos e continuam desafiando e reivindicando sempre posições legítimas, na sociedade como um todo.
E tem mais. Tudo isso, sem se afastar da sagrada missão materna.

segunda-feira, 7 de março de 2011

MULHER

Cassio Camilo Almeida de Negri

Fora do nosso sistema solar, na longínqua estrela Orion, existia um planeta chamado Beta-C.
Tal planeta era habitado por seres unicelulares gigantes, muito evoluídos cientificamente, seres praticamente imortais, que conseguiram a proeza de viajar pelo espaço a velocidades próximas da luz.
Desde que haviam surgido, há 2 bilhões de anos, mantinham a mesma forma de reprodução. Na época da maturidade, simplesmente faziam uma cópia de seus genes e dividiam-se em duas células filhas, após duplicação de seus DNAs.
Assim, nunca morriam, apenas se transformavam em suas filhas, netas, bisnetas, num eterno vir a ser, sempre igual.
Do um vinha o dois, e cada novo um, gerava outro dois, jamais aparecendo o três. Lá não existia trindade, era um mundo de tristes iguais eternos.
Um dia, no entanto, um evento causador de tristeza grassou inexorável aqueles seres geneticamente iguais aos ascendentes e devido a essa semelhança genética, rapidamente começou a se extinguir aquele espécie.
Foi quando, focando o aparelho de tele-transporte num minúsculo astro, o terceiro girante ao redor da estrela sol, descobriram esse planeta singelo, cheio de tristezas, mas também de alegrias; cheio de guerras, mas também de paz., e nesse planeta existia um ser, que dentro de si possuía um vazio, envolto por um músculo chamado útero, e realizava uma alquimia dentro desse oco, gerando do dois, o três e completando a trindade, o filho.

domingo, 6 de março de 2011

Libertando-se e encantando

*Douglas S. Nogueira

Há tempos atrás, guerreiras mulheres em busca da liberdade de expressão com o mesmo grau de importância dos homens, como muitos conhecem o relato, acabaram sendo exoneradas em uma triste tragédia.
Mas será que as mulheres realmente conquistaram por completo, a liberdade de expressão?
Hoje elas estão aí, na política, como nossa presidenta Dilma Rousseff, no futebol, como nossa craque Marta, idolatrada em todo o planeta e em muitas outras atividades que em épocas passadas somente os homens dominavam, entretanto é de se ressaltar que ainda existe certa resistência e preconceito em relação à capacidade feminina, como por exemplo, em serviços braçais ou aqueles que exigem técnicas afinadas como é o caso de motoristas de ônibus e caminhões.
O mundo visivelmente está a cada dia sendo dominado pelas mulheres. O número de bebês meninas que nascem é incrivelmente maior do que meninos. Seria então a projeção de um mundo totalmente terno e cor-de-rosa?
Não há como negar, sem elas tudo perde o brilho e sentido e nós homens ficamos na ausência delas, muitas vezes, sem direção e analisando tal fato entendemos a razão pela qual a vida as escolheu para darem à luz.
Segundo estudos, as mulheres são consideradas sexo frágil. Estranhamente e contrariando tal estudo, não é o que se vê, já que a garra, perseverança, determinação e principalmente coragem fazem parte da vida dessas pérolas que foram criadas para moldar o mundo e suprirem todos os encantos masculinos.

* 1° Secretário da ACÍBEL (Associação do Círculo Barbarense de Escritores e Leitores)

quinta-feira, 3 de março de 2011

Castelos da Escócia

Ivana Maria França de Negri

Viajar a bordo de um trem, da Inglaterra até a Escócia, é uma experiência única e fascinante.
Nos vales pastam fofos carneiros, que no inverno, confundem-se com a pastagem esbranquiçada pela geada, entre rios e lagos congelados. As paisagens são de tirar o fôlego.
Edimburgo, a capital, é de uma beleza indescritível, cercada por castelos medievais, construídos sobre as montanhas, por isso a denominação Highlander, terras altas. Caminhar por suas ruas de pedra, é como se estivéssemos gravando cenas do filme “Coração Valente”, rodado naquelas charmosas paragens. Reportamo-nos à época das cruzadas e dos cavaleiros. Por mais que se tente, é impossível não entrar no clima de magia e mistério. Quem não acredita em contos de fadas, visitando Edimburgo e seus inúmeros castelos no alto das colinas, certamente vai começar a crer.
Nos museus, fragmentos de histórias de reis, rainhas, condes, lordes, que viveram suas sagas naqueles pomposos solares e castelos. Tantos dramas, romances, traições, batalhas campais e festas, e aquelas paredes cobertas de musgos, são testemunhas mudas desses acontecimentos. Turistas são praticamente arrebatados para eras remotas.
Em cada esquina, um escocês vestindo a tradicional saia kilt, extrai sons melodiosos e suaves de uma gaita de fole.
O chão rústico é formado de pedras arredondadas e lisas, polidas pelo caminhar ininterrupto dos habitantes em centenas de anos.
Castelos rodeados de canhões e ruínas atestam a veracidade de muitas batalhas. Casas, tavernas, mausoléus, abadias, imagina-se que a qualquer momento personagens de contos de fadas irão surgir dos escuros e estreitos becos. Não é à toa que a escritora J.K. Rowling, autora da famosa série Harry Poter, teve tantas inspirações, morando na Escócia.
Um vento frio e cortante faz a temperatura parecer mais baixa ainda. Às três da tarde já começa a escurecer e às 4 horas já é noite fechada. O alvorecer também demora. O sol é bem preguiçoso no inverno escocês. Quase nunca dá as caras e as tardes são cinzentas e frias. Acostumados que estamos com nosso verão escaldante e colorido, a mudança de clima, para quem viaja no final do ano, é radical.
A arquitetura é harmônica e não existe trânsito caótico como aqui.
Muralhas, monumentos preservados, igrejas, como a catedral de St. Gilles, ruas limpas, canteiros bem cuidados, a parte nova e a antiga convivem em perfeita harmonia.
Histórias não faltam para povoar o imaginário dos visitantes. Reza a lenda que no lago Ness existe um ser remanescente da pré-história, o Monstro de Loch Ness, mistura de tartaruga e serpente com pescoço alongado. Muita gente jura que viu...
Constam das lendas que doze castelos escoceses são mal assombrados. Reis assassinados, rainhas decapitadas, generais montados em seus cavalos, praticantes de magia negra, mulheres rejeitadas, gaiteiros de fole, crianças perdidas, conspiradores, executores, todos se transformaram em fantasmas que vira e mexe vêm assombrar os corredores dos castelos procurando reaver suas vidas.
Lendas à parte, vale a pena conhecer esse lugar cheio de encanto e magia.