Ivana
Maria França de Negri
Eram apenas porcos indo para o
matadouro. Cena que acontece todos os dias, centenas de caminhões madrugada
adentro levando os pequenos cristos para serem imolados em frigoríficos para
que sua carne vá ainda fresca e gotejando sangue para os açougues.
Ninguém nunca quis saber de sua
vida, de seu sofrimento, de sua angústia, afinal, humanos são consumidores de
bacon, linguiça, salame, salsicha e outros produtos oriundos desses pobres
infelizes. No imaginário popular porcos são animais sujos, grotescos, uma
simples carga num caminhão.
Nesta
semana, aconteceu algo inusitado, que surpreendeu a todos. Num acidente no
rodoanel de Barueri, um caminhão tombou lotado de porcos. Tentaram desvirar a
carreta com os animais dentro e o resultado foi terrível, muitos se machucaram
gravemente e morreram, e outros sobreviveram feridos, repletos de fraturas.
Ativistas
da causa animal se uniram pelas redes sociais e logo um mutirão estava lá,
oferecendo água para eles e tentando resgatá-los. O frigorífico já tinha remanejado
cerca de vinte e dois animais, mas os
protetores não queriam que fossem para o matadouro depois de tanto sofrimento.
Foram horas e horas de agonia. Conseguiram consentimento para levar os que restaram
vivos e feridos para um santuário onde animais de todo porte, resgatados de
casos de maus tratos, tem guarida, comida e carinho.
Foi
uma conquista, um marco para os protetores de animais. Todos sabemos que outros
milhares irão em outros caminhões rumo ao cruel destino. Mas a grande vitória
foi conseguir abertura para um assunto considerado tabu, fazer com que as
atenções se voltassem para os animais criados para consumo humano. Não é de
interesse da indústria, dos frigoríficos e revendedores, mostrar o holocausto
que os animais vivem. O marketing mostra uma imagem completamente diferente, de
animais felizes e soltos.
Animais
vistos meramente como comida, tiveram seu sofrimento mostrado nas redes sociais
e nos noticiários televisivos. Geralmente esse tipo de notícia tem como
protagonistas cães, gatos ou cavalos que tenham sofrido maus tratos ou vivido
dramas diversos. Nunca um animal criado para consumo teve sua vida de tortura
mostrada abertamente na mídia. E os
porcos foram vistos, talvez pela primeira vez, como animais que merecem compaixão
e respeito. Havia fêmeas prenhas, umas com mastite, outras com mamas inchadas o
que demonstrava que estavam amamentando, todas obesas, estressadas, com sede, e
muito medo, como acontece todos os dias e ninguém vê.
A
ciência afirma que porcos tem inteligência superior à dos cães. A criação deles
é uma das mais cruéis. As matrizes são contidas em baias minúsculas e não podem
mover-se para engorda rápida. Quanto mais rápido engordam, mais cedo vão para o
abate. São obrigadas a parir a vida toda e amamentam seus filhotes através das
grades. Muitos dos filhotes, ainda bebês, vão para o matadouro. É uma indústria
insana, em ritmo frenético, pois é preciso abastecer esse comércio que aumenta cada
vez mais.
Muitos
jornalistas televisivos fizeram comentários de muito mau gosto como o Bóris
Casoy (aquele que zombou dos garis sem saber que estava no ar) que encerrou a
matéria com esta pérola: “que desperdício de feijoada”. Esse infeliz perdeu
mais uma oportunidade de ficar calado.
Que este acontecimento
trágico sirva para reflexão, que pensemos quanto sofrimento causamos aos
animais, criaturas inocentes e vítimas da voracidade humana.
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