Pedro Israel Novaes de Almeida
É estranho o contexto político
brasileiro.
A população, pela esmagadora
maioria, amaldiçoa a classe política, apontando-lhe as seculares práticas de
corrupção, desvios, compadrios e a quase uniforme falta de ética. Contudo,
abertas as urnas, de novo ressurgem os blasfemados, para nova gestão, e nova
desaprovação verbal popular.
O diagnóstico de que a premiação
eleitoral de maus políticos decorre de nossos baixos índices de escolaridade e
cultura tropeça na realidade de grupos intelectualizados, que também estrumam
nas urnas e apoiam figuras sabidamente incapazes de zelar pelo bom andamento
das ações oficiais.
Enquanto o vozerio lamenta a eleição
das presidências do Senado e Câmara Federal, poucos percebem a realidade das
câmaras municipais, onde vizinhos de quarteirão não desempenham mandatos
éticos. Em verdade, julgamos absurda a desvalia de legisladores estaduais e
federais, e normal a desvalia dos legisladores próximos.
Existem interesses, poderes e meios,
tão gigantescos quanto nebulosos, em constante e pouco percebida indução da opinião
e vontade populares, manejando-nos pela ação das mídias, verbas, nomeações,
favores, taxações e renúncias de receitas. É como se um monstro invisível
estivesse definitivamente instalado nos ambientes de poder, a orientar-nos o
voto e, principalmente, domesticar eleitos.
Apesar das tramas e tramóias dos
poderosos, os políticos nascem em nosso meio, brincam nas mesmas calçadas, padecem
das mesmas diarréias, cursam as mesmas escolas, namoram nos mesmos portões e
iniciam carreiras profissionais como todos os brasileiros. Eleitos, acabam, a
maioria, desfigurados, como se adentrassem um antro castrador de virtudes.
Acontece com os políticos e com a maioria
de nós, déspotas e desrespeitadores ao primeiro cargo de chefia ou realce
social. Não é nada bonito, mas a maioria dos brasileiros malversa a autoridade
que lhe é delegada.
A educação que falta transcende os
bancos escolares, e a maioria de nossos princípios e valores vale mais no
domicílio que no ambiente externo. Orgulhamo-nos, ainda, o jeitinho, o
quebra-galho e a cotidiana exceção.
Esperteza é a desonestidade do amigo, e
criminosa a esperteza do desafeto. Nossa indignação é cada vez menor e passageira,
a ponto de expressivos contingentes já julgarem injustas e radicais as medidas
oficiais de compulsória regularização de casas noturnas, após o trágico
incêndio em Santa Maria (RS).
Ladrões
de carteirinha e currículo, personagens comuns em manchetes escandalosas,
reunem multidões de adeptos, estudados e cultos, ou iletrados de toda ordem, alguns
pessoalmente honestos.
Sofrem,
e muito, os que percebem o fosso ético em que estamos metidos, e tentam remar
contra a corrente. São revolucionários, muitas vezes mal vistos e
discriminados, mas verdadeiros heróis, que discutem, portam cartazes e cerram
fileiras de insatisfeitos. Destoam da normal subserviência e escancaram acordos
de bastidor.
Resta-nos
o apoio e incentivo e, principalmente, a retomada de alguns valores e
princípios que, por desuso, andam esquecidos.
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