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sábado, 7 de setembro de 2013

O CONFINAMENTO


Henrique Borlina de Oliveira

Bastou o pombo pousar no duto do ar condicionado para me descobrir um homem confinado.
Há muito programas de televisão mostram a vida de pessoas confinadas, sejam em ônibus, casas, apartamentos, fazendas ou prisões propriamente ditos.
Os programas pontuam extraordinária audiência injustificada pelo conteúdo apresentado. Justificada, entretanto, pela simbiose inerente a casa pessoa; sem desmerecer a curiosidade sobre a vida alheia, mas por se encontrar como igual confinado.
Sem participar de um reality show, estamos todos confinados. Confinados entre quatro paredes no décimo terceiro andar de um edifício, onde trabalhamos. Estamos confinados diante da tela do computador, sem ouvir a chuva ou sentir o vento escorrer pelo rosto. Somos confinados pela preocupação do dia a dia. Pela moeda instável, pela inflação dando o ar da graça, pela violência no lado de fora. Quando não, somos confinados dentro de nossos carros em meio à balbúrdia de um trânsito caótico.
Estamos presos, isolados pelo conhecimento de massa, enlatado, que a cada segundo nos é empurrado goela abaixo, sem tempo para digeri-lo ou degustá-lo. Não temos tempo de formar opinião própria e somos atropelados por outra informação que sobrepõe àquela; que por sua vez será contestada por outra em seguida.
Não concorremos a qualquer prêmio milionário. Nem temos nossa figura exposta em tudo quanto é meio de comunicação. Nem chamamos atenção em nosso humilde confinamento.

O pombo arrulhou atrás do ar condicionado. De repente lembrei-me da vida lá fora. Não contive o desejo de descer os treze andares que me afastavam do chão. Passei pela portaria às pressas. Ganhei a rua. Vi os pássaros brincando solitários nos bancos vazios de um jardim próximo ao prédio. O vento forte despenteou-me. Senti intensa felicidade ao ver as flores do ipê despregando de seus galhos. Uma chuva de flores na tarde abandonada. O sol reanimou minha pele fúnebre de escritório. 

Um comentário:

  1. Henrique: para mim esse 'fenômeno' se dá com bem-te-vis que instalaram ninho no vão do ar condicionado do meu escritório. Já falei sobre isso. Nesta semana levei fotográfica na tentativa de um cara a cara com o (s) pássaro (s), porque o vidro é espelhado mas ainda não consegui. Eles me "encaram" desconfiados e, na dúvida, voam. Sim, há um forte princípio de liberdade nisso. Mas, quanto a mim, do alto dos meus ...anos de idade, o escritório, pela manhã, principalmente, no silêncio que em vários momentos usufruo, com o trinar dos bem-te-vis bem aqui pertinho, me dá um sentido solene de individualidade. Quando obtiver fotos significativas dos meus "inquilinos" do ar condicionado, contarei.

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