Maria Cecilia Graner Fessel
Da janela de meu pequeno apartamento tenho uma
vista que me alegra todas as manhãs, pois é um bairro com muitas árvores e
assim também com muitos passarinhos. Até os barulhentos bandos de maritacas vem
fazer suas revoadas por aqui! E quarteirão acima, do outro lado da rua, há uma
antiga entidade beneficente que recebe crianças em tempo integral ou não,
enquanto suas mães trabalham, creio que isso
faz já mais de 40 anos.
É uma pequena chácara cercada por muros e
rodeada por novos conjuntos habitacionais mas que não se deixou sufocar pela
expansão imobiliária. Há um prédio antigo, um grande sobrado com muitas
janelas, talvez antigamente um orfanato, mas que nos dias de hoje deve englobar
salas de aula, salas de recreação, biblioteca, brinquedotecas, administração
e outros departamentos necessários a quem
acolhe dezenas de pequenos diariamente. Certamente terá refeitórios e salões
para os dias de chuva.
Logo cedo vê-se lá um grande movimento de
pessoas chegando, trazendo suas crianças ou entrando com seus carros para lá
cuidar delas. Há então um período de calmaria,
talvez com um café matinal ou atividades
internas e então vem a explosão de vida nos gramados que circundam o
educandário!
De repente, os grupos de crianças, meninos e
meninas vestidos em cores alegres, invadem as áreas verdes da antiga chácara,
com seus gritos, sua pressa infantil de desfrutar os momentos de liberdade, de
chegar primeiro aos balanços, gira-giras e escorregas da área de lazer, que a
calmaria vai se esconder por trás das cortinas nas janelas vazias. Então ouço à
distância o ranger das correntes num
nhécnhéc contínuo enquanto
cabecinhas de todas as cores surgem e desaparecem por entre os galhos das
árvores baixas, ou giram velozmente
enquanto a roda vai virando. Também há crianças
exploradoras, que ficam procurando galhos secos para brincar, ou chamam uns aos
outros para ver algum novo ninho de pássaro nas grandes árvores mais antigas -
parecem jabuticabeiras- ou simplesmente brincar de pega - pega pelo gramado.
Então volto a me ver em minha velha casa, com
sua grande goiabeira perto do muro,
suas jabuticabas gigantes e lustrosas grudadas
nos ramos, o pequeno gramado de minha mãe,
suas roseiras e lírios enfileirados, a parreira
toda verdinha com seus cachos roxos amadurecendo, as cheirosas limas da
pérsia de meu pai , o grande gato rajado
dormitando nas sombras e o tempo...ah, a lerdeza com que o tempo passava
naquela época!
Depois um sinal chama as crianças, os balanços
vazios inda ficam a balançar alguns segundos, o gramado suspira aliviado quando
se vão os pezinhos que o pisavam, as árvores colhem o silêncio e as janelas
agora emolduram atentos rostinhos afogueados...
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