Luzia Stocco
-Ô maninha! Quantas vezes você já tomou banho de detergente? –Júlia pergunta à Lidia, que chegara da faculdade com o velho caderno, um livro de Hobsbawm, um de Morin, de Thoreau e “Os excluídos da história: mulheres, operários e prisioneiros”, de Michelle Perrot.
-Ué! Por quê? Não me diga que acabou o sabonete?!! Meu dinheiro tá curto e eu só recebo na 2ª feira...- colocou os materiais escolares no sofá da sala e foi se dirigindo ao seu quarto, onde a filha já dormia.
-Não é isso!- Atalhou sorrindo, Júlia. - Acontece que a sua filha, a minha sobrinha querida, precisou de um trato diferente hoje. Você acredita que enquanto eu dormia ela subiu na mesa e se lambuzou todinha com a margarina?
-Ô louco! Como foi acontecer isso? Coitada, Ju! Abriu a porta, abaixou-se à cama e beijou a face morena da menina, acarinhando com a mão direita seus cabelos escuros encaracolados, umedecidos pelo suor do verão. Ela adorava os cachos da filha e vivia fazendo permanente nos seus. Com a esquerda enxugava o suor que descia pelo pescocinho macio. Sustinha uma respiração leve e harmoniosa. Sentiu-se enormemente feliz em ver a sua garotinha segura e em paz.
-Eu não tive culpa! -Defendeu-se Júlia.
-Fale baixo!! Vai acordar a menina!!- Encostou a porta do quarto e foi para a cozinha jantar, como era de costume, às 23h30. –Se bem que eu gostaria de vê-la acordada!
– Ela acordou bem cedo, antes de mim, e foi fazer arte. -Júlia seguia Lídia e acomodou-se na cadeira da cozinha. -Se você visse a cara e o cabelo dela, é até engraçado. Tinha gordura nos braços, na roupa e até nos pezinhos.- ria com naturalidade.
-Ai meu Deus...! Não brinque!! –Disse Lídia.
-Aí eu a coloquei sob o chuveiro e o sabonete não dava conta de eliminar aquele ranço. Apelei para o detergente. Não sabia o que seria pior: ele ou sabão em pó. Mas deu certo e ela ficou limpinha, limpinha.
-Brilhando, você quer dizer! Ainda bem que não passou esponja de aço na menina. – Brincou Lídia. E ela não chorou?
-Que nada. Só ficou um pouco assustada com o meu susto, mas manteve-se quietinha enquanto tomava banho e até deu umas risadas.
-Chorou para sair, já sei. Quer comer feijão com farinha e ovo mexido? –Luzia ofereceu o prato à irmã. - É o que tem e eu gosto disso.
-Eu também, mas já comi, obrigada; olha, tem tomate na geladeira. -Enfatizou Júlia: - nem me fale!! Toda vez que tenho que tirá-la da banheira ou do chuveiro, ela chora. Resmunga para entrar e depois não quer sair. -Júlia foi se levantando para guardar os objetos da mesa.
-É assim mesmo. Já conversei com ela sobre isso, parece que entendeu. – disse enquanto mastigava vagarosamente o alimento.
-Mas não cumpre, Lidia! Apesar de que, eu não posso reclamar, até que ela se comporta bem, é um anjinho. Mas eu não dou moleza .
-Obrigada, Júlia! – Mas sabe que eu sonho ter um abajur para a cama dela!- Suspira Lidia. Ouviram um barulhinho. Olharam para trás e, na porta da cozinha a pequena Polyana coçava os olhinhos inchados de dormir, com as costas das mãos, carinha de sono, alguns cachos de cabelo despenteados. Foi até a mãe. Esta a abraçou colocando-a em seu colo. Despertou. Começou a contar como foi o dia na escolinha. Vixi!! acabou o sono!
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