Dirce Ramos de Lima
As crianças que conheço (neta e sobrinhos menores de três anos) continuam preferindo brincadeiras que imitam a vida real, no eterno e reciclado “faz de conta”.
Pré-fabricados mesmo, ainda predominam apenas as bolas e bonecas.
As meninas querem limpar a casa, fazer comidinha, lavar e passar roupas, dar banho, trocar, alimentar e colocar bebês pra dormir. Também gostam de chutar bolas, fazer gols, comemorar, festejar e gritar!
Embalados pela babá-TV, elas cantam, dançam, marcham, fazem gestos, rodam, riem e caem. Levantam-se, seguram as mãos e continuam.
Onde há criança, não falta alegria. Nossa vida começa com magia, fantasia, descobrimento, inocência, afeto, cumplicidade, carinho.
Alguns adultos, mal preparados para a responsabilidade de cuidadores de crianças, chegam a encarar essa ingenuidade como imbecilidade nata e riem dos erros dos pequenos como se fossem piadas de gosto duvidoso. Alguns até confun¬dem o “não sei o que faço” e castigam como se fosse o “faço por maldade”...
Desviei-me do assunto! Quero lembrar apenas coisas boas que acontecem nesse mundo especial de início de aprendizado.
Minha neta adora brincar de fazer compras.
Às vezes, logo de manhã,quando ainda mal me recupero da noite mal dormida (assisto TV até tarde), ela adentra meu quarto com uma sacola plástica, uma caixa de bugigangas, um velho teclado de computador e pergunta:
– Vovó, vamos brincar de compras?
Claro que aceito! Ela é meu anjo, minha luz, minha fonte de felicidade!
Bem, a brincadeira consiste em espalhar tudo sobre a cama. Numa mesinha de refeições, ao lado, fica o teclado que será o computador do caixa. Então, seguro a sacola e vou pegando os trecos (carrinhos, caixinhas, panelinhas, peças soltas de quebra- cabeças, embalagens vazias, etc.).
Pego, um por um, e pergunto: Quanto é?
Com uma vozinha encantadora e um brilho especial nos olhos ela vai dizendo aleatoriamente: um real, três reais , cinco reais, vinte , cinquenta, enquanto finge digitar no seu caixa.
Vou dizendo: Nossa, como está caro? Ou, este está barato, e assim, vou comprando arroz, feijão, sal, batata, leite, bolacha, tudo que existe numa casa e usamos todos os dias.
Quando a sacola está cheia, a cama vazia e as compras terminam, ela pergunta: Vai pagar com dinheiro ou cartão?
Como pode uma criaturinha tão pequena lembrar-se de tudo com tantos detalhes?
Daí, ela muda de personagem , passa a ser minha companheira e diz: – Vovó, vamos embora de ônibus ou de táxi?
Ela sempre prefere voltar de táxi (as compras são pesadas, papai e mamãe esperam ansiosos em casa, etc.) e fazemos, andando pela casa, todo o trajeto de volta.
Chegando em casa, guardamos tudo cuidadosamente (entre os velhos brinquedos).
Até que, com imensa alegria, ela pede;
– Vovó, vamos de novo?
Repetimos nossas cenas várias vezes. Comprando, pa¬gando, enchendo e esvaziando a bendita sacola... Mudam os supermercados, os preços, os gêneros, o trajeto de volta, e até o clima (chove, faz muito calor, está escurecendo; o ônibus demora, o táxi não para) e vamos revezando, entre comédias e tragédias, nossas compras cotidianas... O tempo passa, a gente brinca!
Fico imaginado o dinheiro gasto naquelas bugigangas ele¬trônicas e caras, abandonadas pela casa ou esquecidas no cantinho de brinquedos!
Um velho e pequeno radinho de pilha é uma câmera digital.
–Vovó, dá um sorriso que vou tirar sua foto. Fica quietinha! Olha pra mim! Assim, vovó. Você está linda! Clique! Quer ver?
Ah! Como é bom estar nesse mundo maravilhoso de companheirismo e amor: ela e eu, eu e ela, sonhando, brincando e andando pela casa : marcha soldado, cabeça de papel...
Somos todos filhos de Deus e netos de Papai Noel!
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