SINFONIA DE PARDAIS
Ludovico da Silva
Algumas décadas passadas eram comuns na cidade revoadas de andorinhas nos entardeceres, essas pequenas e frágeis aves que pousavam nas árvores dos jardins, principalmente na área central. Um gorjear até meio desafinado, mas era o canto que elas sabiam embelezar suas presenças e manifestar seus encantos para quem se dispusesse ouvi-las todas as tardes, antes de recolherem-se para o descanso da noite. Ainda em tempos não muito distantes, apareciam durante determinada estação do ano, em períodos que migravam para outros centros, onde encontravam ambiente propício para a procriação. Passavam pela cidade com milhares delas formando uma nuvem escura em revoada.
As andorinhas servem, segundo voz corrente, como indicadoras do tempo, isto é, voando baixo haverá alteração no clima, sobretudo, com o cair de chuvas.
Para tristeza dos piracicabanos as andorinhas foram desaparecendo e hoje restam poucas que lutam por pequenos espaços que ainda lhes sobram, pois os pardais acabaram tomando seus lugares.
Afirma-se que os pardais são originários da Europa e se alimentam de insetos e restos de comida que acham com fartura pelos quintais e ruas da cidade e proliferam de maneira acentuada. Infiltram-se pelos desvãos dos telhados, através dos beirais, e ficam bem acomodados em seus ninhos, seguros de que não serão perseguidos pelos predadores. Interessante é que são ariscos quando buscam seus lares, pois à entrada ficam a manter dobrada atenção ao redor, para, ao que tudo indica, estar certos de que ninguém está a observá-los. Livres da presença de intrusos ou qualquer outro perigo entram tranquilos para sua morada.
Não me parece que os pardais sejam passarinhos bem vistos. É fácil observar em jardins da cidade a sujeira que fazem durante o repouso noturno empoleirados nas árvores. Emporcalham tudo, tanto nas passagens dos pedestres como nos bancos onde as pessoas procuram descansar enquanto fazem hora com prosa junto a amigos. Antes de se recolherem emitem um canto estridente, sem nenhuma sonorização, a não ser o barulho, que possa despertar a atenção do belo. Claro que eles ignoram a lei do silêncio, aliás, como o fazem automóveis, motocicletas e outros meios dados à propaganda desenfreada de decibeis além do permitido, pelos quatro cantos da cidade, que azucrinam os ouvidos das pessoas.
Confesso que não tenho a sensibilidade de poeta para enaltecer a desafinada cantoria dos pardais, como bem o fez o respeitável e saudoso letrista e musicista Herivelto Martins, na consagrada Ave Maria no Morro. Primeiro, interpretada por Ângela Maria, depois cantada no mundo inteiro e gravada mesmo pelos tenores Luciano Pavarotti e Andréa Botticelli, quando em dois versos ressalta “Sinfonia dos pardais, anunciando o anoitecer”. O poeta encontrou a beleza e a afinidade do canto dos pardais na composição de uma de suas maiores criações musicais. O cantar dos pardais de Piracicaba passa longe de ser uma sinfonia ou mesmo de uma seresta e nem os ensaios diários farão melhorar a melodia que têm a oferecer. Afinal, não compõem nenhuma orquestra afinada. Apreciar ou se vale a pena ouvi-los ou não vai do gosto de cada um.
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