Buganvílias
As bênçãos de Deus caem sobre nós como buganvílias roxas. Buganvílias são as populares “primaveras”. Mas não custa nada dar a elas o ar culto da erudição, encontrado nos dicionários da vida. Melhor ainda quando se tem o ‘Aurélio” instalado no computador. As definições surgem como avezinhas livres e rápidas. Aí a coisa vai de vento em popa. E é justamente o vento que faz as buganvílias se depenarem no tempo.
Buganvílias são conhecidas também como “trepadeira lenhosa, da família das nictagináceas”. A Bougainvillea spectabilis apresenta “flores insignificantes, mas incluídas em magnas brácteas membranáceas, inseridas três a três, e de cores fortes: alvas, róseas, vermelhas ou roxas. Não produz fruto.” São sinônimos: buganvília, cansarina, primavera três-marias e, no plural, sempre-lustrosas.
Pronto. Eis a bela função de um dicionário instalado no computador. Qualquer um vira inteligente com uma informação deste naipe; qualquer fugido da escola consegue imprimir ao texto um verniz de sabedoria e cultura, se pode contar com a ajuda daquele que já foi chamado de “pai dos burros”. Eu sempre refutei esta versão vergonhosa para “pai dos interessados”. Dos interessados em aprender e ampliar seu vocabulário.
Como será o vocabulário das buganvílias? Sobretudo das que tingem os nossos olhos? Já viram aquelas roxas, misturadas às rosas e brancas, que escorrem dos muros das casinhas graciosas e aparentemente solitárias, ou que espetam aos ares os seus galhos floridos, sussurrando versos pelos alpendres e varandas?
E quando às buganvílias se juntam as flores tímidas da folhagem conhecida como “lágrimas-de-Cristo”, tudo se explica na perfeição de quem as plantou juntas, para crescerem irmãs. Se uma tira a força da outra, pode não ser verdade, pois ambas florescem bonitas e viçosas e dão flores a não mais poder. Cachos carregados das “lágrimas” me fazem ver o Senhor carregando a cruz e derramando pingos de sangue pela via-sacra de pedregulhos.
Estas trepadeiras lenhosas tem o hábito de soltar flores e folhas e nos obrigam a varrer o chão. Mas embelezam, como certas coisas que existem apenas para embelezar o mundo e pelas quais deveríamos ser gratos. Algumas pessoas são assim. Vivem para tornar tudo mais belo, gracioso e gentil a sua volta. São delicadas, usam perfume, sabem dizer “obrigado”, “com licença” e “por favor”. Vestem-se com discrição e simplicidade. Elas próprias são a jóia da vestimenta, a alma da elegância e do comedimento. Parecem ter saído de um livro de Gloria Kalil. E por isso não vão a um velório de vermelho?
As buganvílias possuem a humildade de serem “flores insignificantes” na interpretação do filólogo, do dicionarista que talvez nunca tenha visto uma só florinha das cansarinas, das primaveras roxas. Nenhuma flor é insignificante, meu Deus! Eu sou insignificante, mas uma flor não é. Flores são gentilezas de Deus para encantar nosso, às vezes, árido caminho de lutas e dores. A insignificância está mais para a aridez do mundo do que para petalazinhas frágeis e desprotegidas.
Era uma vez um menino que brincava de guerra. E do seu tanque disparou uma flor. Nada de tiros. Somente flores. Ainda que insignificantes, as buganvílias são torpedos explosivos, coloridos, que se desfazem ao sabor do vento e enfeitam calçadas soluçantes. Quem for capaz de ouvir o gemido de uma calçada que soluça, toda vez que recebe a flor “insignificante” em seu colo, compreendeu o sentido da vida.
Marisa Bueloni
As bênçãos de Deus caem sobre nós como buganvílias roxas. Buganvílias são as populares “primaveras”. Mas não custa nada dar a elas o ar culto da erudição, encontrado nos dicionários da vida. Melhor ainda quando se tem o ‘Aurélio” instalado no computador. As definições surgem como avezinhas livres e rápidas. Aí a coisa vai de vento em popa. E é justamente o vento que faz as buganvílias se depenarem no tempo.
Buganvílias são conhecidas também como “trepadeira lenhosa, da família das nictagináceas”. A Bougainvillea spectabilis apresenta “flores insignificantes, mas incluídas em magnas brácteas membranáceas, inseridas três a três, e de cores fortes: alvas, róseas, vermelhas ou roxas. Não produz fruto.” São sinônimos: buganvília, cansarina, primavera três-marias e, no plural, sempre-lustrosas.
Pronto. Eis a bela função de um dicionário instalado no computador. Qualquer um vira inteligente com uma informação deste naipe; qualquer fugido da escola consegue imprimir ao texto um verniz de sabedoria e cultura, se pode contar com a ajuda daquele que já foi chamado de “pai dos burros”. Eu sempre refutei esta versão vergonhosa para “pai dos interessados”. Dos interessados em aprender e ampliar seu vocabulário.
Como será o vocabulário das buganvílias? Sobretudo das que tingem os nossos olhos? Já viram aquelas roxas, misturadas às rosas e brancas, que escorrem dos muros das casinhas graciosas e aparentemente solitárias, ou que espetam aos ares os seus galhos floridos, sussurrando versos pelos alpendres e varandas?
E quando às buganvílias se juntam as flores tímidas da folhagem conhecida como “lágrimas-de-Cristo”, tudo se explica na perfeição de quem as plantou juntas, para crescerem irmãs. Se uma tira a força da outra, pode não ser verdade, pois ambas florescem bonitas e viçosas e dão flores a não mais poder. Cachos carregados das “lágrimas” me fazem ver o Senhor carregando a cruz e derramando pingos de sangue pela via-sacra de pedregulhos.
Estas trepadeiras lenhosas tem o hábito de soltar flores e folhas e nos obrigam a varrer o chão. Mas embelezam, como certas coisas que existem apenas para embelezar o mundo e pelas quais deveríamos ser gratos. Algumas pessoas são assim. Vivem para tornar tudo mais belo, gracioso e gentil a sua volta. São delicadas, usam perfume, sabem dizer “obrigado”, “com licença” e “por favor”. Vestem-se com discrição e simplicidade. Elas próprias são a jóia da vestimenta, a alma da elegância e do comedimento. Parecem ter saído de um livro de Gloria Kalil. E por isso não vão a um velório de vermelho?
As buganvílias possuem a humildade de serem “flores insignificantes” na interpretação do filólogo, do dicionarista que talvez nunca tenha visto uma só florinha das cansarinas, das primaveras roxas. Nenhuma flor é insignificante, meu Deus! Eu sou insignificante, mas uma flor não é. Flores são gentilezas de Deus para encantar nosso, às vezes, árido caminho de lutas e dores. A insignificância está mais para a aridez do mundo do que para petalazinhas frágeis e desprotegidas.
Era uma vez um menino que brincava de guerra. E do seu tanque disparou uma flor. Nada de tiros. Somente flores. Ainda que insignificantes, as buganvílias são torpedos explosivos, coloridos, que se desfazem ao sabor do vento e enfeitam calçadas soluçantes. Quem for capaz de ouvir o gemido de uma calçada que soluça, toda vez que recebe a flor “insignificante” em seu colo, compreendeu o sentido da vida.
Impressionante a emoção dos seus textos, Marisa!
ResponderExcluirAs vezes me levam às lágrimas!
O mundo seria tão melhor se as pessoas reparassem mais nas lindas flores que Deus nos presenteou na Natureza...
Abs