As reuniões do Grupo Oficina Literária de Piracicaba são realizadas sempre na primeira quarta-feira do mês, na Biblioteca Municipal das 19h30 às 21h30

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Com o escritor Ignacio Loyola Brandão

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Reunião na Biblioteca

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Até onde seremos culpados?


Elda Nympha Cobra Silveira

As nuvens esparsas foram se agregando e formando figuras grotescas, ao sabor do vento que soprava, obedecendo às ordens climáticas. Quando todas se agruparam, desanuviaram por inteiro, dardejavam raios e trovejavam e mandavam para a Terra chuvas torrenciais, que intimidavam a todos.
Nesse momento, o gado amedrontado corria pelo pasto em galope desabalado, à procura de abrigo. Mas ai deles! Se buscassem as árvores, seriam alcançados pelos raios e morreriam carbonizados. Mesmo assim, ali se abrigaram...
As águas caiam dos céus como castigo, levando pontes, inundando casas e matando quem encontrassem pela frente. Era mesmo uma calamidade! Depois da tormenta uma chuvinha miúda, fininha e mansa era despejada pelas nuvens e tudo se acalmou e ficou cheirando à terra molhada.
Antes, os homens haviam pedido aos céus que mandassem chuva, batendo latas e tambores, fazendo muito barulho para despertar os deuses da natureza. Foram atendidos e receberam a chuva. Agora suplicavam para que a ira dos deuses fosse aplacada e não mandassem mais chuva. Eles foram piedosos e não choveu mais.
A Terra foi ficando calcinada e gretando rapidamente, a ponto de nada mais crescer entre as rugas daquele solo ressequido. Assim, um céu limpo e sem nuvens foi tornando a terra inóspita. Sedentos, os animais morriam aos milhares, deixando as carcaças à mostra na terra árida. Jamais tinha acontecido um período de seca parecido. Sem água, sem árvores nem a caatinga resistiu. O mar transformou em deserto, os rios pareciam estradas ladeadas de gargantas e grotões, tudo que havia neles desaparecera. Sem animais, sem plantas nem esperança, os homens não conseguiam entender porque aconteciam aquelas alterações que rapidamente iam transformando tudo num deserto.
Muitas hipóteses foram levantadas e algumas chegaram a concluir que tudo ocorrera, porque chegou um tempo em que nada satisfazia o ser humano, porque ele tinha pensamentos imediatistas, não tinha amor à sua terra e só queria usufruir dela, derrubando as árvores por causa da madeira, sem esperar que dessem frutos. Essa maneira de agir abalou todo o ecossistema terrestre, pois ninguém se lembrou daqueles que viriam depois. Comeram tudo e se entupiram sem deixar sobras para ninguém, nem para seus filhos.
Assim, os homens migravam de um lado para outro, sem saberem para onde ir, e somente encontrando uma forma cada vez mais profunda de um caos absoluto. Muitos sobreviventes, sentindo-se solitários, num lugar ermo, abandonados ao deus dará e sem esperança, buscavam a morte. Milhares de outros, movidos ainda por uma longínqua esperança, se reuniam, para orar. Dobravam os joelhos pedindo aos céus que mandassem novamente as chuvas, mas as nuvens estavam tão longe dali que não podiam ouvir aqueles lamentos, e o vento soprava levando-as para mais longe de onde ainda existisse água para que os seus vapores não as transformassem em nuvens de chuva. Vagarosamente, com o passar do tempo, as orações foram sendo substituídas pela competição, pela lei do mais forte, e os homens perceberam que sem brutalidade não conseguiriam sobreviver.
Todo potencial ao qual a humanidade tivera acesso e do qual sabia fazer uso, era obsoleto. Não havia mais água encanada, nem modernidades. Luz, só a do sol causticante, porque não existia mais eletricidade. Como poderiam se comunicar, na busca de outros sobreviventes se não dispunham de televisão, computador, carro, gasolina. Tudo o que tinham usufruído um dia, no momento, era virtual e sem a base cientifica que possibilitaria fazer uso dessas facilidades. Era complicado fazer contas sem uma calculadora, saber as horas sem relógio. Enquanto os sobreviventes perdiam a noção do tempo, contavam os momentos da vida pela passagem dos dias e das noites.
Estavam a zero e teriam de começar um mundo novo, muito diferente, sem a infra-estrutura que conheceram advinda do progresso, do desenvolvimento e da tecnologia. Sentiam-se como astronautas abandonados num mundo ermo sem esperança de socorro ou de resgate. Era como se tivessem retornado à Idade da Pedra.
Se aparecesse um animal teriam que se defender dele da mesma maneira que seus ancestrais, da mesma forma fariam se precisassem caçá-lo para se alimentar.

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Então ele percebeu que nada havia aprendido para essa nova realidade... Nesse novo mundo seria um inútil. Não teria competência nem para sobreviver! Nisso ele ouviu o som de um avião a jato que passava deixando seu rastro e num pulo saiu da sua cama coberta por um edredom e, aliviado, foi beber um grande copo de água gelada.