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Reunião na Biblioteca

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Inferno das Queimadas

Inferno das queimadas
Marisa Bueloni

Campestre, domingo, dia 4 de julho, 8 horas da noite. Ouço o crepitar da queimada de cana. Saio lá fora e vejo ao longe o clarão do fogo. Pela direção do vento, imagino "de que lado" a fuligem iria cair. Eram 11 da noite, quando saí na varanda, nas áreas externas da chácara, com esguicho na mão, para tentar limpar parte daquela imundície negra que caiu sobre tudo. Era algo inacreditável. Um carvão grosso, de pedaços grossos de queimada e restos de palha, caiu como praga do Egito sobre nós.
É um contrasenso dos piores. Pede-se que economizemos água. Não, senhores das trevas, tocadores de fogo nos canaviais de Piracicaba: não há como economizar este bem precioso. Infelizmente. Nós o usamos com dor na consciência, para limpar a fuligem desgraçada que cai sobre a cidade. E este produto da natureza poderá faltar um dia para os senhores, queimadores da palha da cana. Um dia, os senhores irão implorar por um copo de água - esta água cuja nascente pode ser morta pela prática criminosa da queimada de cana. Vós, senhores do fogo, ireis chorar por um copo de água. Essa água que somos obrigados a desperdiçar, durante mais de 6 meses ao longo do ano, para limpar a desgraça negra que desce dos céus.
Com a sanha da vossa fogueira, matais a própria nutrição da terra para o cultivo da cana e de outras espécies vegetais. Tirais dela os nutrientes necessários, empobrecendo a qualidade do produto, a colheita. Não temos nada contra a cana, senhores incendiários. Nossa luta é contra esse ato criminoso que praticais durante os meses de queimada. Há uma poesia intrínseca na vocação da cana, sobretudo quando a plantação tomba ao vento das tardes campesinas. Eu mesma já celebrei em versos a beleza do verde canavial!
Contudo, no combate à fuligem, são horas a fio gastando a preciosa e finita água, senhores das trevas e do fogo. São centenas de litros de água gastos na limpeza da varanda, das áreas externas, do piso de pedra na entrada da casa, na calçada lá fora. Sim, são horas com o esguicho na mão, usando o jato como vassoura - exatamente como nos é indicado para não fazer. NÃO USE O ESGUICHO COMO VASSOURA. Pois é assim que todos agem. É assim que vejo as donas de casa ou as funcionárias domésticas lavando as calçadas. Usamos o jato do esguicho para "varrer" essa porcaria imunda que assola nossas casas, nossa roupa no varal, nossos pulmões, nossos amores, nosso ar, nossa vida. Para limpar este inferno do qual não conseguimos nos livrar.
São milhares de litros de água gastos na limpeza da fuligem quase todos os dias da semana. Eu vejo pela minha chácara e multiplico isso pelo número de chácaras do meu condomínio. Multiplico depois pelo número de ... Pelo amor de Deus! E isso numa região onde os rios estão à míngua, num grau criminoso de veneno e poluição. Nossas bacias hidrográficas estão entre as mais degradadas do Estado, necessitando de investimentos vultosos em programas de despoluição dos rios e obras para tratamento de esgoto e saneamento básico. A água é um bem finito, ela está se tornando escassa em muitas regiões da Terra e pode acabar.
Portanto, continuem tocando fogo no canavial, senhores das trevas. Queimem à vontade, sujem o meio ambiente, o ar, os nossos pulmões, deixem-nos doentes. Afinal, estamos mesmo num país de Terceiro Mundo. Nem a lei - já regulamentada - da distância de 1 km da última casa, para executar a queimada, tem sido respeitada. Ou seja, não se poderia mais queimar cana aqui no Campestre. A lei já não foi regulamentada?
Queimadas de cana. Por que temos de suportá-las? Com que direito isso é praticado contra uma cidade inteira? Onde estão os homens de visão desta terra? Onde estão os homens de espírito intrépido? As nossas autoridades, para defender a qualidade de vida e a saúde da população? Nós queremos votar em vós!
Queimadas de cana. Algo desta natureza e desta indigência é bem típica de um país como o nosso, onde as autoridades fecham os olhos para os crimes ambientais, para a prática contra o meio ambiente que mata a fauna e a flora e afeta a saúde da população. Dane-se o povo. Que morra envenenado na poeira tóxica do lucro e da ganância. Da falta de sensibilidade e do desrespeito às leis. Da falta de amor à vida.

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